Sexta, 24 Março 2017 17:17

 

            Em 1944, o livro “O caminho da Servidão”, de Friedrich von Hayek, não obteve a ressonância social desejada por aquele considerado o pai do novo liberalismo. Com a crise do início da década de 1970 e a ascensão de governos conservadores nos países capitalistas centrais (como Thatcher e Reagan, em 1979 e 1981, respectivamente), o Neoliberalismo deixou os livros para assumir forma real, transformando-se em projeto societário hegemônico mundo a fora.

            Na essencialidade do projeto neoliberal, as crises do capital são de responsabilidade das organizações coletivas dos trabalhadores, especialmente dos sindicatos. Afinal, como dizem os neoliberais, quando os sindicatos, através da organização e mobilização dos trabalhadores, avançam na conquista de direitos (como por exemplo, piso salarial por categoria profissional), eles retiram do âmbito das relações de mercado (a chamada “lei da oferta e da procura”), a exclusividade pela remuneração da força de trabalho (salário). Para o Neoliberalismo, portanto, é o “excesso” de demandas da sociedade civil e, particularmente, dos trabalhadores, que torna o Estado hipertrofiado e deficitário.

Além do “gigantismo” do Estado, afirmam os novos liberais que a ação dos sindicatos e outras organizações dos trabalhadores desestimulam os empresários a investir produtivamente, na medida em que lhes é mais lucrativo investir em especulação financeira. Não por acaso, junto à criminalização das lutas coletivas, há a recorrente “denúncia” quanto aos “excessos” e/ou impropriedade da legislação trabalhista.

 Consequentemente, para o projeto societário Neoliberal, há um conjunto de medidas imprescindíveis e inadiáveis que precisa ser efetivado: 1)Quebrar a espinha dorsal” dos sindicatos e demais organizações coletivas dos trabalhadores, de maneira a quebrar qualquer instrumento coletivo de resistência e luta; 2) Privatizar de forma generalizada para “reduzir” o tamanho do Estado, caracterizado como “ineficiente, incompetente e corrupto”; 3) Atacar, ininterruptamente, o funcionalismo público, associado ao privilégio, à burocracia e à ineficiência; 4) Mercantilizar todas as relações societárias, a partir das quais a “mão invisível” do mercado atua para equilibrar as disputas entre indivíduos e grupos; 5) Reformar o Estado, inclusive com a transformação de direitos constitucionais em “serviços”, cujo acesso depende das possibilidades de pagamento dos cidadãos (vide o desmanche da Saúde e da Educação Pública e da Previdência Social); 6) Substituir políticas sociais universalistas pela instituição de políticas focalizadas e exclusivas aos segmentos sociais em situação de vulnerabilidade (dentre as quais, no Brasil, o Bolsa Família é o Programa mais conhecido); 7) Mudar a legislação, de maneira a assegurar as reformas necessárias à liberalização irrestrita das relações societárias, especialmente no que concerne à retirada de garantias constitucionais socialmente protetivas; 8) Qualificar como “privilégio” direitos sociais e trabalhistas arduamente conquistados; 9) Criminalizar movimentos sociais e lutas coletivas; e, por fim, como coroamento de todas essas iniciativas, 10) Apelar, incansavelmente, pelo Ajuste Fiscal, pela Responsabilidade Fiscal  e pelo combate ao Déficit Público.

Na implementação desse Projeto, a crítica ao chamado “caminho da servidão” transformou a “servidão como caminho” de via exclusiva para os trabalhadores. Afinal, na concepção, análise e proposituras do Neoliberalismo não há espaço para a crítica às organizações de classe do capital. Coerentes com esses interesses, os novos liberais nada dizem quanto à renúncia fiscal que privatiza dinheiro público, aos juros subsidiados para o capital e à sonegação de grandes empresas; silenciam quanto à dívida pública e à política tributária progressiva.

Esse é, em síntese, o ideário que norteia a entrevista de um jovem advogado e professor, responsável pela promoção de um Instituto Liberal em Mato Grosso, que recentemente concedeu entrevista ao MídiaNews. De acordo com ele, o funcionalismo público é uma “casta abençoada e privilegiada” e os sindicatos não passam de espaços formados por sindicalistas que invejam o capitalista, “porque vive[m] de quem produz”. Sentencia que se os sindicatos quisessem lutar por direitos, iriam reivindicar “eficiência [...] diminuição da carga tributária [...] diminuição do Estado”. Ele, porém, não define qual tipo de eficiência está prescrevendo, nem tampouco para quem o Estado deve ser reduzido ou qual política tributária defende.

Como se conhece qual a lógica e os interesses que movem os novos liberais, não é preciso muito esforço para entender que o que o entrevistado promove é a eficiência associada à iniciativa privada em contraposição à proclamada ineficiência estatal; a redução de carga tributária para o capital, cujo eixo está, justamente, na redução de “encargos trabalhistas” e pagamento de impostos (isto é, manutenção e aprofundamento da lógica tributária regressiva: quem tem mais paga menos; quem tem menos, paga mais).

Consequentemente, a diminuição do Estado não é para o capital - que dele se serve desavergonhadamente, embora se autoproclame liberal -, mas para as políticas públicas sociais. Por isso tanto empenho em satanizar o Estado, atacar as organizações coletivas dos trabalhadores, reclamar do “excesso” de democracia e do “poder” dos sindicatos. Afinal, como exortou o advogado quando questionado sobre o RGA, o governo Taques “não deveria ter concedido nada”, pois apesar de reconhecer que é uma garantia legal, “também está na lei que não se pode descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal”. Portanto, segundo ele, “faltou tenacidade ao Governo.”

De forma coerente com seu universo ideológico e seu compromisso de classe, entre uma lei que define limites para os gastos públicos (sem considerar, por exemplo, os impactos da Lei Kandir nas receitas do Estado) e a lei que obriga o pagamento de direitos aos trabalhadores, aquela deve se sobrepor a essa. Simples assim. Afinal, para quem declara que o servidor deveria ingressar no Serviço Público por “vocação”, seria conveniente que os servidores simplesmente avalizassem a política de preservação dos interesses do capital, sem reclamar. Não é coincidência, portanto, que Margareth Thatcher seja reverenciada porque “peitou as greves”. Trata-se de uma maneira interessante de explicar a história e, principalmente, ignorar os retrocessos sociais, caracterizados por alguns estudiosos como “austericídio”. Registre-se que para o entrevistado, a “sensibilidade” social do pensamento liberal conservador está demonstrada pela posição contrária ao aborto.

A observância da Lei, nesses termos, não é principalista, mas seletiva. Entre os direitos fundamentais que devem ser assegurados a todos (nos quais se incluem liberdade, trabalho, dignidade e outros) e os interesses do capital, há que submeter aqueles a esses. Entre os direitos coletivos e os ganhos do capital, há que garantir a prevalência desses, mesmo que ao custo social daqueles. Como decreta o entrevistado: “É preciso cortar todos os benefícios”, inclusive reajustes salariais de servidores.

Não por acaso, o jovem professor advoga contra o “câncer que se espalha” e que tem “empestado” as universidades (inclusive a UFMT) com “um pensamento totalitário, arbitrário, autocrata e alheio à realidade”. Vivendo em um “mundo paralelo”, as universidades, segundo ele, “estão tolhendo o livre pensamento, a liberdade de ideias, a liberdade das pessoas”. Qual o responsável por esse câncer que está “empesteando” as universidades? O marxismo. Qual a solução para extirpar o câncer, segundo o professor? A Escola Sem Partido. Isto é: façamos das escolas e universidades o espaço das mordaças, onde o conhecimento e a crítica são criminalizados em nome de uma falsa neutralidade!

Afinal, como revela o clássico “O nome da Rosa”, conhecimento é poder. Socializá-lo é um atentado àqueles que detêm o poder e, em seu interesse, atuam e amordaçam. Mas, é óbvio, tudo em nome da “liberdade”... De alguns.

Ante o reconhecimento das dificuldades para convencer jovens a aderir ao pensamento liberal conservador, o professor atribui à imaturidade, à inexperiência e à falta de leitura dos jovens as condições que permitem “à esquerda” vender ilusões e oferecer “um paraíso terreno”.  Para resolver isso recupera Nelson Rodrigues, e dá um conselho: “Jovens, envelheçam”.

Ao final, só resta um questionamento incômodo: O que será que quis dizer o jovem advogado e professor, quando declarou: “Basta ver porque as boas cabeças preferem ir para o funcionalismo público ao invés da iniciativa privada”?

 

Grupos de Trabalho de Política de Formação Sindical (GTPFS) e Diretoria da Adufmat-Ssind

 

Cuiabá, 23 de março de 2017. 

Quinta, 23 Março 2017 17:24

 

 

JUACY DA  SILVA*
 

Em um país em que ex-ministros, ex-parlamentares municipais, estaduais e federais, ex-governadores, grandes empresários, até mesmo alguns integrantes do poder judiciário e inúmeros gestores públicos, inclusive da maior estatal brasileira foram acusados de corrupção, investigados com ordem da Justiça, presos e condenados, por terem roubado bilhões dos cofres públicos, a prisão de alguns fiscais sanitários do MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento não deveria causar tanto espanto e nem mobilizar tantas energias, tempo e explicações por parte das mais altas autoridades da República.


Quando estouraram as denúncias do então deputado federal Roberto Jefferson, durante as investigações da corrupção e roubalheira nos Correios e vieram as denúncias de que havia um grande esquema de corrupção, cujo chefe seria  o  então homem forte do Governo Lula, o então  ministro chefe da casa civil José Dirceu, que tinha gabinete no Palácio do Planalto, o  presidente Lula  dizia que nada de errado estava acontecendo e que tudo não passava de uma  grande trama da oposição, alimentada por uma “imprensa golpista”.


Os  resultados vieram a público e a  população passou a ter conhecimento de que nosso país poderia estar sendo governado por criminosos de colarinho branco. As penas aos condenados no Mensalão foram extremamente brandas e a maioria desses criminosos enquistados no poder acabaram recebendo indulto  por parte da presidente Dilma. Entre as denúncias iniciais  e o indulto foram  mais de uma década e as penas quase nunca passaram de dois anos.


Muita  gente ainda teima em dizer que toda a corrupção nos e dos governos  Lula e Dilma eram exclusivamente do PT, esquecendo-se de que o partido de Lula para se manter no poder por longos 13 anos teve que aliar-se  ao PMDB, PDT, PTB, PR, PP, PCdoB e outros mais, com os quais dividia cargos importantes tanto no poder legislativo quanto no poder executivo, neste ultimo  caso na Administração Federal, cuja estrutura de poder continua sendo negociada e barganhada em um verdadeiro balcão de negócios, no que se costuma dizer “toma lá , dá cá” ou no dizer de alguns políticos importantes, parafraseando, de uma forma malévola, o pensamento de São Francisco de Assis de que “é dando que se recebe”. Todas essas negociatas que acabam em corrupção e muita roubalheira aos cofres públicos são feitas em nome da “governabilidade”, um novo nome para o que poderia ser dito como um assalto ao poder!


Nesses três anos de operação LAVA JATO, principalmente as investigações, condenações e prisões conduzidas pela Força Tarefa instalada em Curitiba, sob a batuta do Juiz Sérgio Mouro, que não tem titubeado em mandar para a prisão políticos e altos gestores e grandes empresários, vem demonstrando que a corrupção é muito maior do que podemos imaginar. Pena que o mesmo não aconteça com políticos, gestores e governantes que gozam de foro privilegiado, uma excrecência que precisa acabar para que o Brasil fique livre de ladrões de colarinho branco enquistados em altas posições da política e da administração pública nacional, estaduais e municipais.


Pois bem, este fato de terem sido presos, temporária ou preventivamente alguns fiscais  do MAPA  e alguns Executivos de frigoríficos e de empresas exportadoras de carnes bovina, suína e frangos do Brasil, cujo Mercado foi conquistador ao longo dos últimos dez ou vinte anos e que envolveu uma verdadeira peregrinação de missões comerciais de alto nível, incluindo governadores, ministros e até presidentes da República , não chega a ser novidade e nem surpresa  para a maioria da população que já vem sendo sacudida por sucessivos e inúmeros escândalos de corrupção, por CPIs do Congresso Nacional que tem revelado boa parte deste esquema sórdido envolvendo gente importante da política e da economia de nosso país.


Em um primeiro momento o Governo Temer, que também  possui  alguns ministros e parlamentares dos diversos partidos que o apoiam no Congresso integrando as duas Listas do Janot  e em delações premiadas por parte de executivos da Odebrecht, incluindo a própria Chapa Dilma/Temer que levou o atual presidente ao poder, com o impeachment da ex-presidente petista, tenta por todas as formas desviar a atenção da opinião pública nacional e abrandar as reações da maioria dos países importadores de carnes e derivados do Brasil, que suspenderam as importações da carne brasileira.


Para variar busca-se sempre um culpado, um bode expiatório para jogar a culpa do mal feito em alguns, esquecendo—se de que o Brasil vem sendo envolvido em grandes esquemas de corrupção há mais de três décadas, desde o Governo Sarney, passando pelo impeachment de Collor, de Dilma e nas revelações da Odebrecht. No momento parece que a culpa deste prejuízo bilionário tem sido imputada à Polícia Federal e não à forma como os postos de comando da administração pública são preenchidos, no leilão que os partidos conduzem no balcão de negócios, uma porta aberta ou escancarada para a prática da corrupção.


Os mecanismos de fiscalização e a eficiência do SIPE  Sistema de Inspeção Federal, não resta  a menor  dúvida, são reconhecidamente eficientes, mas   as engrenagens que definem quem e quais partidos vão ocupar os postos de comando dos ministérios continuam sendo fisiológicos, de acordos espúrios entre partidos, enfim, uma porta aberta e um convite para que todos os setores estejam a mercê da corrupção e de políticos corruptos que continuam mandando nos partidos e na política brasileira.


Seria bom o Governo Temer  e seus ministros baixarem  um pouco a bola e aguardarem as investigações da Polícia Federal, cuja eficiência e independência tem sido motivo de apoio por parte da população, principalmente quando se trata dessas operações “caça corruptos”.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista e colaborador de jornais, sites, blogs e outros veículos de comunicação.

E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog  www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy

 

Quarta, 22 Março 2017 13:34

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. Jornalismo/USP; Prof. Literatura/UFMT

 

No último dia 21, comemoramos o Dia Mundial da Poesia. Em 1999, a data foi criada pela 30ª Conferência Geral daOrganização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). O objetivo da criação era incentivar o hábito da leitura, o desenvolvimento e a manifestação das subjetividades, expressas em registros estéticos inovadores; era incentivar o próprio ensino da literatura.

 

Infelizmente, o Brasil caminha na contramão do que sugere a UNESCO. A prova disso está na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), parida a fórceps por meio de uma medida provisória, transformada em lei na surdina. Há pouco, no plano dos bens simbólicos, esse tipo de crime lesa-pátria foi sancionado pelo presidente Michel Temer. Agora, a bem da desconfortável verdade, a concepção e a “sofisticação” maligna dessa mesma “Base” não isentam os governantes anteriores.

 

A BNCC, dentre outras aberrações contra a formação intelectual de nossas novas gerações, dilui o ensino da literatura durante as aulas de língua portuguesa, em geral, já trabalhada de forma precária, sufocando o texto literário. Dificulta a prática de um ensino mais aprofundado do texto poético, minimizando a possibilidade de sua real fruição. Consolida a ideia já antiga de que a literatura faz parte das coisas inúteis da criação humana.

 

A BNCC, ao assim tratar o ensino da literatura, mais do que dizer que pretende preparar os estudantes para o mercado de trabalho, chancela a lógica utilitarista e o culto da posse, que esvaziam o espírito das pessoas. E isso, como aponta o filósofo italiano Nuccio Ordine, em seu belíssimo trabalho “A utilidade do inútil: um manifesto”, põe em perigo não só a cultura, a criatividade e as instituições de ensino, mas valores fundamentais, como a dignidade humana, o amor e a busca pela verdade.

 

Nesse contexto, as crianças e os jovens brasileiros vão sendo condenados a um esvaziamento de repertório cultural tão estarrecedor que poderia até fazer Paulo Freire repensar sobre o muito que escreveu.

 

Mas pior do que constatar isso, que já está escancarado até mesmo nos círculos universitários, é saber que essa barreira vai dificultar o acesso aos poemas, bens imateriais por excelência que poderiam amenizar tantas agruras existenciais. Não tenho dúvidas de que a prática de leitura de bons livros poéticos poderia até contribuir para diminuir tanta depressão em um mundo que busca, na competição infernal do cotidiano, atingir o inatingível, de tão alto que é.

 

Na oposição dessa corrida desenfreada pelas coisas “grandes” da vida, e prestando minha homenagem aos poetas, finalizo com o texto “O apanhador de desperdícios” do poeta cuiabano Manoel de Barros; poema de tirar o fôlego, mas de que quem ainda tem algum para isso:

 

Uso a palavra para compor meus silêncios.// Não gosto das palavras// fatigadas de informar.// Dou mais respeito// às que vivem de barriga no chão// tipo água pedra sapo.// Entendo bem o sotaque das águas// Dou respeito às coisas desimportantes// e aos seres desimportantes.// Prezo insetos mais que aviões.// Prezo a velocidade// das tartarugas mais que a dos mísseis.// Tenho em mim um atraso de nascença.// Eu fui aparelhado// para gostar de passarinhos.// Tenho abundância de ser feliz por isso.// Meu quintal é maior do que o mundo.// Sou um apanhador de desperdícios:// amo os restos como as boas moscas// Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.// Porque eu não sou da informática:// eu sou da invencionática.// Só uso a palavra para compor meus silêncios”.

 

Terça, 21 Março 2017 11:13

 

Colegiado do Departamento de Matemática, reunido no dia 14 de março de 2017, após longa discussão entre seus membros, manifesta seu profundo descontentamento pela forma como a diretoria do ICET encaminhou a última reunião da Congregação, quando foi aprovado, a toque de caixa, as regras para o processo eleitoral para a Diretoria do ICET, quadriênio 2017/2021. A convocatória não chegou a 24 horas de antecedência, inviabilizando qualquer discussão prévia do assunto nas demais instâncias colegiadas do ICET, como se o assunto não merecesse a devida importância. E justamente por falta de debate e discussão prévia houve o direcionamento para uma proposta legalista que desconsidera a história deste Instituto, que foi um dos primeiros a promover eleições para Coordenação quando ainda era CCET. É constrangedor que se defenda ou direcione para uma proposta baseada em lei casuística, criada para servir a interesses de momento e que interfere diretamente na autonomia universitária, consagrada na Carta Magna e na LDB. O direcionamento impositivo para o legalismo não se sustenta, já que a paridade é usada para a consulta na escolha de reitor, sendo preservado o devido processo legal, uma vez que são mantidos os poderes de decisão do Colégio Eleitoral conforme manda a lei. Por tudo o que foi dito acima, o Colegiado do Departamento de Matemática aprovou MOÇÃO DE REPÚDIO à forma como o Prof. Dr. Martinho da Costa Araújo, diretor do ICET, convocou a última reunião da Congregação, bem como o direcionamento dado para a aprovação da proposta que regulamentou o processo eleitoral, impossibilitando o debate democrático que deve imperar no espaço público.

 

Cuiabá (MT), dia 20 de março de 2017.

Quinta, 16 Março 2017 09:31

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. Jornalismo/USP; Prof. Literatura/UFMT

 

No último dia 14, comemoramos o 170º ano de nascimento de Castro Alves. Ainda que sua produção tenha sido generosa com vários temas, incluindo poemas eróticos, foi sua postura de poeta abolicionista que lhe rendera a antonomásia de “O poeta dos escravos”. Como tal, e como nenhum outro, cantou em versos a dolorosa vida de um ser humano escravizado.

 

Mesmo sem nunca ter viajado em um navio que traficasse os mais de 11 milhões de pessoas escravizadas da África para o Brasil, Castro foi capaz de construir verdadeiras pérolas de nossa poesia lírica. Dentre tantas, pela coragem que tem de questionar Deus sobre aquela desumanidade, destaco o prólogo de “Vozes d’África”:

 

Deus! Ó Deus! onde estás que não respondes?// Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes// Embuçado nos céus?// Há dois mil anos te mandei meu grito,// Que embalde desde então corre o infinito...// Onde estás, Senhor Deus?”

 

Mas não é todo dia que a humanidade pari poetas que fazem o queixo cair. E mesmo que parisse, os meandros e “sentimentos do mundo” são tantos que os poetas não dão conta. Nesse sentido, os humanos das últimas décadas já padecem da carência de vozes que emocionam pela arte da palavra.

 

Pior: muitos humanos, já dentro do século XXI, ainda são escravizados. Quando digo isso, não estou pensando apenas em trabalhadores de grandes fazendas espalhadas alhures. Também não estou dirigindo meu foco para coirmãos latino-americanos escravizados em indústrias têxteis de São Paulo ou de outra grande cidade qualquer. Essa inaceitável desumanidade, análoga à escravidão, até a mídia convencional expõe de quando em quando.

 

Meu foco, neste artigo, tenta chegar aonde a mídia não vai. Ele se volta para falar da escravidão de muitos de meus colegas professores. Detalhe: não estou falando dos colegas que atuam nos ensinos básico, fundamental e médio. Nesses estágios de nossa educação formal, a situação degradante dessa profissão em extinção – também de quando em quando – tem sido mostrada e denunciada pela mídia. Logo, estou me referindo a colegas das universidades brasileiras.

 

Como assim? Escravos dentro das universidades?

 

Sim. Um tipo bem peculiar de escravo no séc. XXI.

 

E aqui não falo de analogia. Falo de escravidão mesmo. Muitos por mera opção, outros por vaidade acadêmica, o fato é que um contingente significativo de docentes universitários trabalha bem mais do que para o qual foi contratado: em geral, 40horas semanais em regime de Dedicação Exclusiva.

 

As atividades que excedem a essa carga horária ficam jogadas no nada. Ninguém paga por isso, a não ser o próprio docente que paga com a debilitação gradual de suas saúdes física e emocional. Já temos um grande quadro de colegas que vão se impossibilitando de continuar na atividade docente.

 

Desse quadro, a maior parte atua, além da graduação, em cursos de pós-graduação. Nesses espaços, a escravidão é praticamente completa e asséptica. Pior: poucos docentes param para pensar na dinâmica de suas atividades. Raramente, revoltar-se-ão contra a situação. “Não têm tempo” para isso. Assim, muitos estão ajudando a sustentar um estágio de penúria das universidades. Ao sustentar o que aí está, e como está, contribuem para a permanência da precarização completa de todas atividades.

 

Dessa forma, excetuando ilhas, a qualidade de tudo não tem como ser garantida. Cartorialmente falando, tem até certificados e diplomas para tudo e para todos, mas quase tudo e quase todos já bem esvaziado do lastro chamado conteúdo.

 

Pena que eu não seja um poeta para falar disso.

 

Quarta, 15 Março 2017 10:00

 

 

JUACY DA  SILVA*

Em março de 2015, o Procurador Geral de Justiça enviou um pedido para que o STF  autorizasse a abertura de processo de investigação criminal, tendo como alvo 47 parlamentares, senadores da  República  e Deputados Federais  e outros ex-parlamentares, enfim, a fina flor da chamada classe política, cidadãos  acima de qualquer suspeita.


Em  três dias o então ministro relator da operação lava jato no STF Teori Zavaski  autorizou o início das investigações e determinou a suspensão do sigilo dos processos, afinal transparência  faz bem para a democracia e ajuda a combater a corrupção.


Vale mencionar que é o STF  quem acolhe pedidos para que pessoas ilustres e que gozam do famigerado , uma verdadeira excrecência jurídica que existe em nosso país, o vergonhoso estatuto jurídico do foro especial/privilegiado ou por “prerrogativa de função”.


Até  hoje, passados dois anos, praticamente nada aconteceu, as investigações  a cargo da Procuradoria Geral da República andam a passos de tartaruga  e o mesmo deverá acontecer quando e se forem apresentadas as denúncias, correndo um sério risco de que boa parte desta onda da LAVA JATO, em se tratando de tanta gente importante  acabe em pizza ou seja arquivada por decurso de prazo ou os acusados  deixem de ter a proteção do foro privilegiado. O mensalão, levou oito anos entre o início das investigações e as condenações pelo STF  e mesmo assim, nenhum réu, politico, condenado cumpriu mais de dois anos e meio de cadeia  e diversos acabaram anistiados por indulto assinado pela ex-presidente Dilma.


Agora, para comemorar  esses dois anos de operação  “banho maria”, que na verdade é  um manto protetor a políticos com mandatos e funções ministeriais, o país entre a euforia e o descrédito é sacudido por uma NOVA LISTA DO JANOT,  com pedidos de inquérito para investigação criminal envolvendo 170 políticos  com ou sem mandato.


Esta lista é oriunda das 77  delações  de ex-executivos da ODEBRECHT, homologadas pela  Ministra Carmem Lúcia, Presidente do STF, no vácuo aberto  com a morte repentina do  então Ministro Teoria Zavaski. A  decisão sobre  este pedido para a investigação de altos figurões da política brasileira, na verdade uma vergonha, estará a cargo do Ministro Edison Fachin, que foi escolhido para ser o novo Relator da LAVA JATO no âmbito do STF.


Em sua decisão, que  a opinião pública espera  não demore muito, o ministro Fachim decidirá se autoriza a Procuradoria Geral da República a dar continuidade às  investigações e oferecer  as  denúncias sobre os integrantes desta nova LISTA e se a mesma  deve ter  suspenso o sigilo, possibilitando aos eleitores, cidadãos e contribuintes saberem de fato quem é quem neste mundo nebuloso da política, onde atividades parlamentares se confundem com a criminalidade de colarinho branco.


Desta vez  a NOVA LISTA DO JANOT atinge o coração do governo Temer, incluindo diversos ministros que ocupam gabinetes no palácio do planalto e em outros edifícios de Brasília.  Inclui também senadores e deputados federais, a alta cúpula  do PMDB, partido do Presidente  e também de seu principal partido de sustentação, o PSDB, além dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, diversos líderes partidários,  e também os  ex-presidentes do Senado/Congresso, Lula  e Dilma, além  de alguns de seus ex-ministros.


Para quem imaginava que  com o  impeachment de Dilma e o alijamento do PT e alguns partidos aliados do centro do poder e do palácio do planalto  tudo iria mudar, que o Brasil iria encontrar seu caminho, milhões  de pessoas que durante mais de dois anos  ocuparam ruas, praças e avenidas deste  país, o clima é muito mais de tristeza e de decepção do que de esperança e regozijo.


O povo brasileiro constata que a aliança que levou ao poder a chapa Dilma/Temer, que  também está sendo investigada por corrupção e abuso do poder econômico, tinha outros sócios  e que boa parte dos partidos que estavam com Dilma, pularam de lado e estão com Temer. Enfim, a corrupção  está muito mais entranhada no mundo politico e em Brasília do que se pode imaginar.


O triste é saber que a burocracia do Sistema judiciário brasileiro, com sua lentidão  e diversos mecanismos protelatórios, facilitam que a corrupção e os mal feitos cometidos pelo mais alto escalão da República podem acabar protegidos pelo manto da impunidade do foro privilegiado.


Não é por  acaso que está sendo praticamente impossível  acabar com o famigerado foro privilegiado, seja na Câmara Federal  ou no Senado, onde dormem por mais de uma década diversos projetos de emenda constitucional neste sentido. Seria  como imaginar que a raposa pudesse proteger o galinheiro ou que os vampiros  cuidassem do banco de sangue. Situação lastimável e vergonhosa para nosso país!


Enquanto isso, nossos parlamentares querem anistiar o caixa dois, que na verdade é a legalização da corrupção como forma de financiamento de campanhas políticas e enriquecimento pessoal. 


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT,  mestre  em  sociologia, articulista e colaborador de jornais, sites, blogs e outros veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo." target="_blank">O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy

Segunda, 13 Março 2017 16:59

 

JUACY DA SILVA*
 

Diferente do que o senso comum pode imaginar, o Brasil tem sido considerado um dos países mais violentos do mundo, muito mais violento do que países e regiões  em Guerras, conflitos armados ou da presença  de grupos rebeldes e terroristas.


Os índices de tentativas de assassinatos, de estupros, de agressões físicas e de assassinatos vem aumentando de forma acentuada a cada ano em nosso pais, apesar das manifestações  e discursos de nossas autoridades e governantes.  Os níveis de insegurança e de violência tem  aumentado em todas as regiões e porte das cidades, dela não  escapando qualquer segmento social, pobres, ricos, remediados e classe média tem presenciado ou sofrido com esta onda de violência que não nos dá trégua.


Com a falência do Estado , vale dizer com a falência dos Governos federal, estaduais e municipais, o sucateamento dos serviços públicos é  uma realidade concreta  e a tendência é que esta situação se agrave ainda mais diante das propostas de reajuste orçamentário que vão  congelar gastos e investimentos em todos os setores por décadas. O enxugamento das  estruturas  públicas que já são deficientes  tendem a piorar a olhos vistos.


Falta recursos financeiros, humanos, técnicos e tecnológicos para implementar políticas públicas demonstram que os poderes públicos estão  perdendo o jogo para a violência, para a criminalidade, inclusive a criminalidade de colarinho branco, ou seja, as quadrilhas de corruptos que se instalaram nas estruturas públicas, associadas com setores econômicos que usam suas funções  e suas posições nos poderes públicos para roubarem os já escassos recursos que uma população sofrida vem pagando na forma de uma carga  tributária escorchante.


Na última quarta feira, DIA INTERNACIONAL DA MULHER, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com o Instituto Data Folha divulgaram  os resultados de uma pesquisa abordando a questão  da violência contra a mulher, que não difere muito em termos de índices de violência contra outros segmentos do país como a violência contra idosos, crianças e adolescentes, contra deficientes, contra  negros e negras, contra a comunidade LGTB  e outros segmentos  da sociedade brasileira.


Esta pesquisa abrange uma amostra representativa de todas as regiões, tamanho de cidades, classes sociais, cor da população, níveis de escolaridade e de renda e seus  resultados são alarmantes. Com certeza se incluíssem outras faixas etárias menores de 16  anos os dados seriam piores ainda, pois segundo a ONU nada menos do que 60 milhões  de meninas com menos de 16  anos são violentadas no mundo, muitas inclusive no Brasil, no trajeto entre a casa e a escola e vice verso.


Voltando ao estudo do DataFolha/Fórum Brasileiro de segurança pública, os dados indicam que a cada hora 503 mulheres, com idade acima de 16  anos sofrem algum tipo de agressão física, isto significa 4,4 milhões de vítimas, das quais mais da metade nada fazem, seja porque não  acreditam nos poderes públicos, seja pela falta de uma delegacia especializada  no atendimento `a mulher , seja pelo machismo que domina nossa sociedade. A cultura do estupro, a cultura do machismo e a cultura da discriminação contra a mulher contribuem para a formação da ideia de que a mulher é um ser frágil, que pode ser dominada, não tem Liberdade de decidir sobre seu próprio corpo, seu espaço na sociedade e seu trajeto de vida.


Por incrível que possa parecer, a violência contra a mulher  é preponderante  também  entre as classes mais abastadas e muito presente também  entre  as mulheres negras e pobres. A diferença é que as mulheres com níveis de renda e de instrução  mais elevadas tem vergonha ou medo de denunciarem as agressões.


Outro dado interessante é que 61%  nos casos de violência, os agressores são conhecidos das vítimas e apenas 33%  desses  agressores são desconhecidos.  Causa  espanto saber também que 70% das  mulheres entrevistadas com idade entre 16 e 24 anos afirmaram que já foram assediadas e 45%  já sofreram algum tipo de violência física.


Enfim, são dezenas de milhões de mulheres que estão sofrendo, muitas que continuam caladas e não tem a  coragem ou a quem recorrer para acabar com este suplício diário que é  uma realidade quase invisível para nossos governantes e para a própria sociedade brasileira que parece não desejar abrir seus olhos. É triste viver em um país assim, onde nem a esperança de dias melhores essas vítimas podem cultivar.


Enquanto isso, a lava jato e tantas outras operações  indicam que estamos sendo governados por verdadeiras quadrilhas que pouco diferem do modus operandi do crime organizado que dominam as favelas  e Sistema prisional, onde a violência e a corrupção  continuam dominando.


Corrupção, falência do Estado, sucateamento dos serviços públicos e violência em geral e contra  a mulher em particular andam de mãos dadas em nosso país! Algo precise ser feito com urgência para romper este círculo vicioso, para que o Brasil seja um pais seguro e bom para se viver! Talvez o primeiro passo seja os eleitores darem um cartão  vermelho para políticos e gestores corruptos, incompetentes, insensíveis e demagogos!


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista e colaborador de jornais, sites, blogs e outros veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo." target="_blank">O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog  www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy

Sexta, 10 Março 2017 10:52

 

JUACY DA SILVA*

 

Bom dia a todas as mulheres do mundo. Hoje estamos comemorando mais um  DIA INTERNACIONAL DA MULHER, um dia especial para que possamos, homens e mulheres, refletir sobre a importância desta data.

 

Que a dignidade das mulheres e de todas as pessoas possa ser uma referência em nossas ações no dia-a-dia e também na definição das políticas públicas e nas ações governamentais.

 

Lutar contra a discriminação, contra os vários tipos de preconceitos que ainda existem em nosso meio, tornar pública a violência contra a mulher, denunciar o tráfico humano, a prostituição e exploração sexual, discutir as desigualdades de gênero, raça, classe e de todas as demais formas.

 

Enfim, tem muito a ser feito para que todos os dias do ano seja MAIS UM DIA DA MULHER, e não apenas uma data específica.

 

Ótimo final de semana a todas as mulheres e homens de boa vontade, que Deus esteja com todas as mulheres e homens, hoje e sempre.

 

A luta por um mundo melhor, um país mais justo, mais humano, mais decente é um desafio de todos e não apenas de algumas pessoas. A construção de uma sociedade e um país mais justo passa pela luta pelos direitos da mulher, pela definição  e implementação de políticas de gênero e mais recursos para que seus resultados sejam efetivos e não apenas letra morta ou discursos de ocasião.

 

O Brasil não pode continuar ocupando uma posição vergonhosa como tem acontecido nos últimos anos. Em 2016, conforme o relatório sobre a desigualdade de gênero, do Fórum Econômico, divulgado há poucos meses, durante o último encontro do referido fórum, nosso país estava na 79a posição no ranking mundial da desigualdade de gênero.

 

Quando os indicadores que integram  este índice é desdobrado, podemos perceber  que continuamos ocupando o final da fila em vários aspectos. A participação da mulher na economia estamos na 91a posição; na participação na força de trabalho 87a; desigualdade de salário/renda 129a; no acesso à educação fundamental 77a; no empoderamento político 86a; presença  das mulheres nos parlamentos 120a; participação na força de trabalho e posições que exigem elevados níveis de instrução 80a; mulheres ocupando posições ministeriais 82a; concessão de apoio como auxílio natalidade 120a;

 

Além disso, continuamos presenciando índices alarmantes de violência contra a mulher. A cultura do estupro, do  feminicídio, do machismo e da discriminação continua dominando em nosso país.

 

Oxalá, esta triste realidade possa mudar radicalmente a curto prazo, pois a longo prazo nossa sociedade e nosso país poderão estar caminhando ladeira abaixo nesta e em diversas outras questões  para que o desenvolvimento seja sustentável, justo e humano.

 

Para mudar  esta realidade o DIA INTERNACIONAL DA MULHER  tem que ser um DIA DE LUTA e não apenas de discursos, principalmente discursos demagógicos de nossas autoridades e governantes que teimam em querer tapar o sol com  a peneira!

 

Quarta, 08 Março 2017 10:39

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. Jornalismo/USP; Prof. Literatura/UFMT

 

Estamos envoltos a mais um 08 de março, marco de lutas iniciadas no final do século XIX e começo do XX. Logo, trata-se de uma demanda que não nasceu no séc. XXI. A tarefa deste momento é eliminar toda situação de violência que envolve as mulheres. Não é tolerável, p. ex., que durante o carnaval, só no Rio, a cada quatro minutos, uma mulher sofrera algum tipo de violência.

Por conta de sua vastidão, para pensar sobre esse processo, delimitar o tema é preciso. Pressupondo que muitos falarão da desigualdade que a mulher ainda enfrenta em nossa sociedade, predominantemente machista, bem como dos números alarmantes sobre a violência de que são vítimas, falarei do tema pelo viés da arte. Como isso ainda é vasto, o recorte fica para a música.

Nesse enfoque, longe vai o tempo em que as mulheres eram elegantemente cortejadas. Na língua portuguesa, o comportamento cortês remonta as Cantigas de Amor. Nelas, o eu-lírico masculino, retratando a estrutura feudal da Idade Média, se colocava na condição de vassalo de sua senhora.

No geral, essa elegância artística foi o que predominou por séculos. Deselegâncias publicamente explícitas só passaram a ser mais visíveis já nos marcos da contemporaneidade; e de forma mais acentuada, nas décadas mais recentes, coincidindo, paradoxalmente, com a ascensão da luta dos movimentos feministas.

No Brasil, quando o tema é mulher, elegâncias e deselegâncias em notas musicais sempre coexistiram. Todavia, sobrepondo-se a outros, um tipo de respeito à lá estilo medieval marcou inúmeras das nossas composições. “Rosa” de Pixinguinha é emblemática. Sua singeleza já se coloca no título linguisticamente dúbio: a rosa (flor) também pode ser Rosa (uma mulher). Nesse jogo de palavras, não sem forte presença da religiosidade, apreciamos versos como os que seguem:

Tu és divina e graciosa, estátua majestosa.../ Por Deus esculturada.../ Da alma da mais linda flor.../ Que na vida é preferida pelo beija-flor.../ Tu és de Deus a soberana flor/ Tu és de Deus a criação que em todo coração.../ O riso, a fé, a dor/ Em sândalos olentes/ Cheios de sabor/ Em vozes tão dolentes/ Como um sonho em flor...

Mantido o véu religioso até o epílogo da canção, a sequência gradativa dos elogios à rosa/Rosa atinte o ápice do enorme respeito dispensado ao ser feminino nos versos abaixo:

Perdão! Se ouso confessar-te/ Eu hei de sempre amar-te/ Oh! flor! Meu peito não resiste/ Oh! meu Deus, o quanto é triste/ A incerteza de um amor/ Que mais me faz penar/ Em esperar/ Em conduzir-te/ Um dia ao pé do altar...”.

Infelizmente, toda essa beleza poética aos poucos se esvai num sumidouro. Contudo, algumas composições de compositores, como Chico Buarque, Chico César, Gonzaguinha et alii, insistem em resistir. “Ponto de Interrogação” – de Gonzaguinha – chega a ser inquietante pelas perguntas que faz ao ser masculino.

No lugar da poesia que se esvai, resta um conjunto de violências simbólicas que já atingiu o mais baixo nível da degradação. Nesses tempos de delicadezas perdidas, as mulheres já foram completamente ultrajadas. Em clima de ultraje, não é estranho que em alguma “música” possamos ouvir algo como “Tu é uma cachorra safada, sem-vergonha...”

A sociedade precisa dar um basta nesse tipo explícito de violência simbólica, travestida de música. Ela desencadeia outras violências. A educação formal de qualidade e bens culturais providos de valores precisam se tornar políticas públicas. Enquanto isso não ocorrer, a violência será a rainha triunfante dos lares e bares.

 

Terça, 07 Março 2017 14:22

 

 

O governo anda alardeando as virtudes da reforma educacional que está propondo, como se fosse resolver todos os males existentes, que seriam decorrentes tão somente da lei anterior. Na verdade, o governo não diz por que a lei falhou, se é que foi a lei que falhou, não explica tampouco porque espera que essa nova lei dê resultado, no que é diferente do projeto anterior. Como o processo educacional não foi examinado, estudado, pesquisado, não foi acompanhado de uma avaliação criteriosa (pelo menos, não por parte do governo), corremos o sério risco de apenas repetir os erros passados na proposta atual.

 

No Brasil, processos educacionais são implementados e abandonados sem nenhuma prestação de contas à sociedade. Cada novo governante vem com propostas mirabolantes, ignorando completamente onde a realidade se realiza, nas péssimas escolas públicas que temos. Basta lembrar que a lei que está sendo abandonada permitia às escolas oferecerem formação profissionalizante, o aluno ter opções de escolha de disciplinas, e mesmo aventava com o ensino integral. Por que as escolas não realizaram isso?

 

Em primeiro lugar, as escolas não foram construídas para o ensino integral, o que exige uma escola que não seja tão somente um depósito de estudantes afoitos para irem embora, já que não há espaço nas escolas para atividades que não sejam nas salas de aula. Acrescente-se o fato que as escolas, via de regra, têm ensino fundamental infantil de manhã, ensino médio juvenil à tarde, e ensino adulto à noite, os EJA. Nem é preciso muito para perceber que deveria haver dois tipos de escolas distintas, ou seja, a construção da escola infantil e da escola juvenil, que necessariamente tem solicitações diferenciadas para o aprendizado, já que o material didático dos jovens pode ser extremamente perigoso na mão de crianças. E mais ainda, não deveria haver educação de adultos: todas as crianças e jovens deveriam ter frequentado escolas. Não é o caso do Brasil que continua deixando milhares de crianças e jovens abandonados nas ruas. Enfim, é preciso construir essas escolas para o ensino integral, o que não se diz na propaganda governamental é quem vai construir tais escolas.

 

Em segundo lugar, não há recursos para fazer uma escola profissionalizante, que exige laboratórios caros e sofisticados, grandes espaços, quando as escolas não conseguem nem ao menos manter uma biblioteca, ou mesmo um laboratório de informática, não havendo nem espaço para salas de aulas decentes. Mas, mesmo que se conseguissem recursos para reformar as escolas, comprar os materiais das oficinas, depois não teria recursos para sua manutenção ou para reposição do material de trabalho aonde os alunos vão se profissionalizar. E se conseguisse os recursos para os laboratórios funcionarem razoavelmente, não se conseguiria os profissionais para lecionar, visto que qualquer ofício é mais bem remunerado que professor. Enfim, as escolas não têm recursos para ministrarem ensino profissionalizante, já que não era a lei que impedia que esse ocorresse, mas a falta crônica de verbas que a educação padece nesse país desde sempre.

 

Em terceiro lugar, as escolas oferecem apenas o mínimo exigido por lei, nunca o máximo permitido pela mesma lei. Não porque elas querem, mas por determinação das secretariais de educação. As escolas conseguem manter apenas disciplinas obrigatórias, aquelas mínimas exigidas para a formação, e não tem recursos para ter professores de várias áreas para lecionarem as pluralidades de conhecimentos e ciências, pelo contrário, um professor de uma formação, por exemplo, em história, acaba dando inglês, filosofia, sociologia, até português ou religião. Ocorre exatamente o contrário do que o governo propõe: não há uma escola repleta de profissionais a mostrarem a riqueza e as possibilidades das diversas áreas, o que poderia acarretar na possibilidade de escolhas por parte dos estudantes, mas poucos profissionais especializados, professores improvisados que devem dar contas de disciplinas diversas de sua competência, e por vezes, tem que ser mais psicólogos, assistentes sociais e até policiais do que propriamente professores. Ou seja, não é a lei que impede que os estudantes possam escolher disciplinas para compor seu currículo, mas as escolas não têm profissionais ou mesmo espaço para tanto.

 

A que conclusão se deve chegar? Que a reforma educacional é mais uma jogada política, um factoide social, do que um passo na melhoria efetiva da educação nacional. Ora, não faltam projetos educacionais nesse país, o que falta é recurso para efetivá-los. Antes de mudar a lei o governo deveria nos dizer de onde sairão os recursos para a construção de escolas; como fará para aumentar os salários dos professores de tal modo a atrair profissionais a desejarem ensinar suas profissões; como fará para manter e expandir atividades profissionais, artísticas e desportivas nas escolas, que mal conseguem ter um telhado sem goteira para assistirem suas aulas.

 

Roberto de Barros Freire

Professor do Departamento de Filosofia/UFMT

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