JUACY DA SILVA*
Antes de entrar diretamente neste importante e controvertido assunto para o combate à corrupção e o aperfeiçoamento de nosso regime semidemocrático, gostaria de chamar a atenção dos leitores, eleitores, contribuintes, cidadãos e cidadãs em geral para três estorinhas já bem conhecidas da opinião pública.
A primeira estória é a do lobo e o cordeiro, quando o lobo ao “dialogar” com o cordeiro, querendo devorá-lo, não sem antes demonstrar que o mesmo era o culpado por sujar sua água, apesar de o cordeiro estar a jusante, ou seja, rio abaixo, sendo impossível sujar á agua do lobo este invocou a vida passada do cordeiro e disse que se ele não estava sujando a água, seus pais ou antepassados haviam poluído a água do Rio. Resumindo, independente da racionalidade ou da situação o lobo sempre encontra uma justificativa para comer o cordeiro.
A segunda estorinha é a da raposa e das galinhas. Ao se verem devoradas pelas raposas que agiam impunemente as galinhas se reuniram em assembleia geral e decidiram reforçar a segurança do galinheiro e aí apareceu uma raposa bem esperta e se prontificou a tomar conta do galinheiro para que outras raposas não viessem ameaçar a vida das galinhas. Resultado, as galinhas elegeram tal raposa boazinha e no dia seguinte não havia nenhuma galinha e todas haviam sido comidas pela raposa guardiã e outras que com ela haviam participado da trama.
A outra estorinha é a do vampiro e do banco de sangue. Segue a mesma lógica, como o estoque de sangue estava acabando, os gestores do banco de sangue resolveram escolher um vampiro mor, que era o melhor conhecedor da área, ou seja, de sangue, para modernizar o banco de sangue e assim garantir sangue para quem dele precisasse. Resultado, rapidinho os estoques de sangue acabaram e ,advinha quem bebeu todo o sangue que ainda havia no banco, com certeza o morcegão.
Assim também acontece nas sociedades que são constituídas por classes, castas, estamentos, categorias e grupos de interesse. Geralmente pensamos que em uma democracia e em uma república, o povo, ou seja, os eleitores são a verdadeira fonte do poder e que, principalmente os “nossos” representantes eleitos para os poderes executivo e legislativo, ao pedirem os votos de milhares ou milhões de eleitores ao serem eleitos irão defender os interesses, as aspirações e as necessidades do povo, principalmente das camadas excluídas ou do andar de baixo.
Mesmo que sejam eleitos com o voto do povão e da classe média, ao serem financiados, legal ou ilicitamente com dinheiro oriundo de grupos econômicos, nossos legisladores e governantes costumam abrir as portas de seus gabinetes para representantes desses grupos de interesse e acabam patrocinando e apresentando projetos de leis, que se transformam em leis; medidas provisórias propostas pelo poder executivo e que acabam sendo aprovadas docilmente pelo legislativo, onde estão parlamentares que foram eleitos graças ao “apoio” financeiro desses mesmos grupos de interesse.
Basta ver quem são os verdadeiros donos dos partidos políticos tanto a nível nacional quanto estaduais e municipais e a qual classe, estamento, categoria ou grupo econômico pertencem. Por exemplo no Congresso nacional existem as tais bancadas, a da bala que defende os interesses dos fabricantes e comerciantes, legais ou ilegais, de armas; a ruralista que representa os interesses dos latifundiários e do agronegócio; a dos donos de escolas particulares, as de donos de hospitais particulares e de planos de saúde; a dos donos de ônibus e outros meios de transporte de massa, a dos banqueiros, que representa os interesses do Sistema financeiro privado e que agem como verdadeiros agiotas, a dos empresários que defendem as medidas de interesse do referido setor, tem ainda a bancada da bíblia, mescla de evangélicos e outros grupos conservadores.
A atuação dessas bancadas mais se parece com verdadeiros despachantes de luxo, abrindo as portas do poder executivo e as vezes tentando até interferir nas decisões do poder judiciário e de vez em quando propondo medidas ou votando algumas matérias que são verdadeiras migalhas em relação ao que é destinado ao povão. Por exemplo, a bolsa empresário, via juros subsidiados, renúncia fiscal e vistas grossas ou conivência com grandes sonegadores, é dezenas de vezes o total dos recursos destinados ao bolsa família ou outras políticas assistencialistas ou compensatórias.
Este é o contexto em que surgiu e ainda se mantem esta excrecência jurídica, política e institucional tanto no Brasil quanto em alguns países que teimam em ignorar os interesses da sociedade e as bases da cidadania. Em um próximo artigo analisarei alguns aspectos desta matéria que há décadas está na “ordem do dia” ou na agenda política nacional e continua como um manto protetor para corruptos de alta envergadura e quão difícil tem sido para o Congresso Nacional acabar com esta vergonha que é o foro por prerrogativa de função, a verdadeira base para que a impunidade dos crimes de colarinho branco continue em nosso país.
*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista, colaborador de jornais, sites, blogs e outros veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy