Quarta, 29 Maio 2024 15:07

METODOLOGIA DA IGREJA: VER, JULGAR E AGIR - Juacy da Silva

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Juacy da Silva*
 

A Constituição Federal, de 1988, no artigo 225, estabelece, de forma clara e objetiva que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Ao longo do tempo, principalmente a partir da publicação da Encíclica “Rerum Novarum”, em 15 de Maio de 1891, pelo Papa Leão XIII, até a atualidade com o Papa Francisco, ao publicar a Encíclica Laudato Si, em 24 de Maio de 2015; a Igreja Católica e as Igrejas Evangélicas vem sendo presença ativa no enfrentamento dos problemas e desafios que afetam a humanidade, principalmente as camadas marginalizadas, excluídas vem enfrentando, daí a razão da chamada “opção preferencial pelos pobres”.

Para poder agir de uma forma efetiva e sociotransformadora é necessária uma metodologia que ofereça condições e conhecimento para compreender bem a realidade, permitir que sejam feitas opções e desdobrar as ações no tempo e no espaço, estabelecendo prioridades neste agir.

Neste processo em busca de um conhecimento mais profundo da realidade, que sirva de base para agir na dimensão sociotransformadora, é fundamental que sigamos a máxima de “pensar globalmente e agir localmente”, razões mais do que suficientes para delimitarmos nosso campo de ação tanto em termos de espaço (território) quanto de tempo (estabelecer cronologia e prioridades), tendo em vista a complexidade dos desafios em todas as áreas, inclusive nas questões relativas `a ECOLOGIA INTEGRAL, considerando os diversos aspectos que fazem parte das exortações, observações e sugestões quanto a esta caminhada, apontadas tanto nas Encíclicas Laudato Si e Fratelli Tutti quanto nas Exortações Apostólicas Querida Amazônia e Laudate Deum e outros documentos das Igrejas e também o conhecimento resultante de estudos e pesquisas por cientistas, pesquisadores e instituições universitárias e até mesmo vinculadas a outros setores da sociedade.

A origem desta metodologia já está prestes a completar um século, como podemos ver nesta referência bibliográfica “O método ver-julgar-agir da JOC, assumido pela Ação Católica especializada no mundo inteiro desde a década de 1930, demorou, mas foi assumido pelo magistério pontifício, primeiro por João XXIII, depois pela Gaudium et Spes, por encíclicas sociais e documentos de Dicastérios da Cúria Romana (BRIGHENTI, 2015, p. 612)”


O Curso para a formação de Agentes da Pastoral da Ecologia Integral que estamos realizando na Arquidiocese de Cuiabá, em três módulos de apenas 5 horas cada um, tanto quanto possível estamos seguindo o método da Igreja: VER, JULGAR E AGIR.
Na Bíblia Sagrada existe uma passagem que, direta ou indiretamente, nos remete `a questão da metodologia no agir da Igreja Católica e das Igrejas Evangélicas também, quando no Evangelho de São João 8:32 está escrito “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Ai está na verdade a origem desta metodologia: Conhecimento – Verdade – Libertação.

Assim, buscamos ampliar nosso conhecimento sobre diversos documentos da Igreja e dos vários “ramos”, aspectos das ciências, incluindo um “panorama’ dos principais desafios e problemas socioambientais do Brasil, de Mato Grosso e do território onde está inserida a Arquidiocese de Cuiabá (a chamada Baixada Cuiabana).

Caberá a seguir, aos participantes do Curso, futuros agentes da Pastoral da Ecologia Integral realizarem um exercício, em princípio didático, mas com vistas a ações concretas no futuro, de preferência em um futuro não muito longínquo, nos territórios das várias paróquias representadas no referido curso através dos referidos participantes do curso.

Para tanto devemos seguir alguns passos, que, na verdade são as etapas do Método mencionado e, neste exercício, devemos trabalhar em conjunto, ou seja, propiciar a troca de experiências e a “mirada” que cada pessoa possa ter da realidade e também as sugestões para a ação, sempre enfatizando que somente as ações, de preferência coletivas, em grupo é que tem o poder e a energia para promover ou provocar transformações sociais, econômicas, políticas, culturais ou até mesmo religiosas. 

Aqui cabe uma observação, é importante que saibamos e aprendamos a “trabalhar em conjunto”, em grupo, em equipe, para valorizar esta dinâmica coletiva, sempre respeitando as pessoas, aceitando opiniões diferentes e até divergentes, sempre em através de um diálogo honesto, franco, aberto, reconhecendo nossas diferenças, nossas fragilidades e nossa dignidade como pessoas humanas, todos e todas, filhos e filhas de Deus. Esta é a essência da Amizade social, que sempre nos exorta o Papa Francisco e foi objeto da Campanha da Fraternidade deste ano de 2024.

Para atendermos ao desafio da etapa VER, não precisamos “inventar a roda”, contratar “experts”, consultorias especializadas e geralmente que custam muitos recursos, precisamos buscar e valorizar o conhecimento das pessoas que vivem, convivem, sobrevivem e sofrem com a realidade que as cerca e que, cremos nós, desejam mudanças e transformações que melhorem suas condições de vida.


Para vermos a realidade, além de nossas observações pessoais, podemos solicitar a várias pessoas, em diferentes partes do território, de diferentes estratos/camadas sociais e perguntarmos, por exemplo: Quais são os três, quatro ou cinco principais problemas ou desafios ambientais ou socioambientais que o senhor ou a senhora, ou os/as jovens identificam naquele território?

Com certeza se dialogarmos com diversas pessoas teremos diversas respostas, algumas que devem coincidir e outras diferentes e, assim, poderemos chegar a mais de cinco ou dez problemas/desafios.


A Etapa seguinte do Método, o JULGAR, cabe `a Equipe da Pastoral que será formada pelos participantes do Curso e mais algumas pessoas que sejam convidadas para “engrossar’, fortalecer a Equipe, que darão vida ao que temos denominado de Núcleo Ecológico Paroquial (Local) e que pode ser também no nível das comunidades, de uma escola, de uma empresa. A denominação pouco importa, o mais importante é a constituição das equipes que irão articular, coordenar, despertar a consciência ecológica/ambiental, inclusive fomentando o processo da EDUCAÇÃO ECOLÓGICA LIBERTADORA, para que as ações e as transformações socioambientais possam ocorrer e a realidade seja mudada, transformada.

Nesta fase do JULGAR, caberá então à Equipe local/paroquial analisar os problemas e desafios apresentados pelas pessoas, tendo como parâmetros deste JULGAR o seguinte: a gravidade, a urgência e a complexidade dos problemas e desafios que surgiram deste diálogo coletivo e, estabelecer uma lista de prioridades, tendo em vista também o que é possível realizar a curto, médio e longo prazos.

Finalmente, o AGIR, deve ser realizado, não de uma forma voluntarista e improvisada, mas sim, dentro de uma ótica de racionalidade, para que as ações sejam realmente realizadas e sejam também duradouras e possam provocar mudanças, seja de hábitos, de comportamentos, atitudes e novos estilos de vida, tanto no plano individual, familiar quanto, coletivamente, seja a partir da paróquia, da comunidade, da escola, da empresa ou enfim, qualquer que seja o lugar/território onde as pessoas vivem, convivem e sobrevivem.

Neste AGIR, precisamos também promover nossas ações guiadas por projetos, que tenham “começo, meio e fim”, definindo quem, como, quando, onde e a que custos, ou seja, por que, para que, com quem e para quem vamos realizar nossas ações, incluindo parcerias, custos dos projetos e fontes de financiamento.

Em ocasião oportuna, no futuro, como Pastoral devemos promover também um aprofundamento do nível de conhecimento das Equipes, tanto no que concerne `a elaboração de projetos sociais, identificação de fontes de financiamento públicas e privadas, nacionais e internacionais, bem como um maior nível de conhecimento dos vários setores que fazem parte do que denominamos de Ecologia Integral.

Exemplo, se uma comunidade, paróquia definem que irão trabalhar com reciclagem, é necessário entender melhor sobre esta temática; da mesma forma se o projeto é relacionado com arborização, plantas medicinais, hortas domésticas, escolares ou comunitárias, ou os chamados “quintais ecológicos”, é fundamental que os participantes conheçam bem as referidas áreas e assim por diante.

Se decidirmos, por exemplo, realizar uma Campanha ampla para combater o consumismo, o desperdício, que geram cada vez um maior volume de resíduos sólidos/lixo, combater o uso de plásticos que emitem gases de efeito estufa e provocam o aquecimento global e as temíveis mudanças climáticas etc, etc precisamos ter conhecimento das técnicas de propaganda, marketing e como se formam ou se alteram os hábitos de consumo, atingindo o objetivo e metas de “produção e consumo responsável e sustentável”, como estabelece a ONU no ODS de número 12.

O curso para a Formação de Agentes da Pastoral da Ecologia Integral é apenas um passo inicial de um processo mais longo para que as ações que vierem a ser implementadas, realizadas possam ser duradouras, efetivas e estejam articuladas com as ações das demais pastorais, movimentos e organismos da Igreja e também em parcerias com outras organizações públicas e privadas que atuem nesta área e contribuam para ajudarmos em um MELHOR CUIDADO COM A CASA COMUM, a partir de nossa realidade concreta, local em nossos territórios.

O processo de transformação da realidade, principalmente da realidade em que vivem e sobrevivem os pobres e excluídos é longo, cheio de obstáculos e interesses as vezes ocultos, demanda conhecimento e uma conscientização ecológica, social e política mais profunda por parte dos mesmos, para que as mudanças ocorram e essas mudanças devem ocorrer com a participação dessas camadas que devem ser sujeitas e sujeitos de seus próprios destinos e jamais objeto de manipulação por parte de quem gera e se beneficia de estruturas que representam dominação, manipulação e exclusão.

Não podemos alimentar o assistencialismo, o paternalismo que apenas são formas de manipulação por parte dos poderosos e dos donos do poder, mas sim, ajudarmos a despertar a consciência ecológica, sociotransformadora dessas camadas que sofrem com a degradação ambiental e destruição do planeta, tudo isso no contexto da Doutrina Social da Igreja e dos Direitos Humanos e Constitucionais.



*Juacy da Silva, professor fundador e titular da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy 

 

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