Quinta, 22 Outubro 2015 08:33

MANIFESTO À SOCIEDADE MATO-GROSSENSE

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139 DIAS DE GREVE NA UFMT: QUEM É O RESPONSÁVEL?

         A educação é, certamente, uma das políticas sociais mais desrespeitadas no Brasil, embora seja promessa de campanha de todos os políticos, presença certa em todos os debates sobre desenvolvimento nacional, demanda de todas as propostas de garantia cidadã, referência inevitável contra todos os desmandos e descalabros.

Após 139 dias de greve, as aulas serão retomadas em nível nacional. Neste longo período, o descaso com a educação pública e o compromisso do governo e seus parceiros com os interesses do capital foram amplamente denunciados. Durante mais de quatro meses de greve dos trabalhadores das universidades federais, o governo revelou a verdadeira face da “pátria educadora” que defende: o aprofundamento da mercantilização da educação e a destruição das universidades públicas federais; e, junto com elas, a qualidade que lhes caracteriza. O corte de quase R$ 12 bilhões no orçamento da educação pública ao mesmo tempo em que garantiu R$ 17 bilhões para as instituições privadas, via FIES, é a comprovação desta opção política.

            Para isso, o governo e seus parceiros políticos (espalhados em várias siglas partidárias, inclusive aquelas que se apresentam como de “oposição”) atuaram ativamente no Planalto e no Parlamento. Juntos, Executivo e a maioria esmagadora do Legislativo garantiram não apenas um discurso unificado (com o devido auxílio engajado da grande mídia!) para convencer a todos sobre a inevitabilidade do “ajuste fiscal”, mas, principalmente, sobre quem deveria pagar a conta: o conjunto dos trabalhadores.

Sobre a responsabilidade do grande capital, silêncio! Sobre mais de 47% do orçamento ser consumido para pagar juros e amortizações da dívida, silêncio! Sobre uma política tributária regressiva que penaliza brutalmente aqueles que ganham menos e beneficia aqueles que ganham mais, silêncio! Sobre uma previdência social superavitária, que é apresentada como deficitária para convencer a todos de que são necessários mais e mais cortes nos direitos da aposentadoria, silêncio! Sobre renúncia fiscal e financiamentos subsidiados ao grande capital, silêncio! Sobre o verdadeiro sentido das várias propostas que tramitam[1] no Congresso, como PL 4.330/04, MPs 664, 665 e 676, PEC 395/14, PLC 77/15, obrigatoriedade de adesão ao FUNPRESP, Programa de Proteção ao Emprego, “Agenda Brasil” e tantos outros, silêncio! Sobre a declaração do STF quanto à constitucionalidade de Organizações Sociais nas instituições públicas, nos moldes da trágica experiência da EBSERH, silêncio! Afinal, é sobre este “silêncio” que governo e seus pares (estejam - ou não - nas estruturas do Estado) garantem a realização dos seus compromissos com os interesses do grande capital, fazendo de conta que defendem os interesses dos trabalhadores e da classe média!

Frente a isso - e dentro do possível -, a greve dos trabalhadores das universidades públicas (assim como de outros servidores públicos federais) denunciou e expos os verdadeiros compromissos do governo e seus parceiros.

            Articulada ao discurso massivo da crise e da “inevitabilidade” do ajuste, assim como o recurso a outros instrumentos de ataque aos grevistas do setor público (como reuniões sem qualquer negociação efetiva, corte de salários, judicialização e intensa repressão policial), a força do “silêncio” demonstrou o verdadeiro compromisso de classe do governo. Mais: permitiu revelar àqueles que ainda insistiam em ver no Partido dos Trabalhadores algum resquício do partido que foi um dia, a completa adesão – e dedicação – do PT ao Projeto Neoliberal, que preconiza não apenas privatizações, sacralização do mercado, transformação de direitos em serviços, ataques ao funcionalismo público e “quebra da espinha dorsal” das organizações coletivas dos trabalhadores... mas, inclusive, a violenta repressão policial como recurso derradeiro. Assim, tal qual o PSDB agiu contra professores e estudantes no Paraná, o PT agiu em Brasília. Oponentes políticos?

Em cumprimento ao ideário e à agenda neoliberal que os une, o governo não somente desconheceu o direito constitucional à recomposição salarial e colocou nas costas dos trabalhadores todo o peso dos “ajustes”, mas desconsiderou, inclusive, as negociações em processo de acordo com outras categorias de servidores públicos. Na calada da noite de 14/09/2015, o pacotaço jogou de janeiro para agosto/16 o pífio reajuste proposto, esmerou-se em atacar o conjunto do serviço público, cortando o abono permanência e suspendendo concursos públicos, e retomou a malfadada CPMF, que mantém a mesma lógica regressiva da política tributária. Alguma penalização ao capital?

            Contudo, apesar da unidade dos servidores públicos federais, da disposição de luta de professores de 50 instituições federais, de caravanas a Brasília, das contrapropostas apresentadas, de Atos Públicos e de ocupações de Ministérios, esta greve de resistência ao desmonte da Educação Pública nas universidades federais conseguiu apenas flexibilizar a intransigência do governo: que de “reajuste” zero antes do início do Movimento, passou pela proposta de reajuste de 21,3% parcelado em quatro anos, para 10,8%, em dois anos.

A indecência da proposta, portanto, não reside apenas no fato do governo desconsiderar as perdas acumuladas pela inflação passada e congelar salários arrochados por dois anos (diante de uma perspectiva inflacionária crescente), mas, principalmente, por sequer negociar, efetivamente, qualquer um dos pontos da Pauta de Reivindicações, protocolada em março/2015: a) defesa do caráter público da educação; b) melhoria das condições de trabalho; c) garantia de autonomia universitária; d) reestruturação da carreira e, e) valorização salarial de ativos e aposentados. Por tudo isso, os professores decidiram, em assembleias nas suas respectivas bases, que o ANDES/SN não deve assinar esta proposta, pois em nada nos contempla.

            Desta forma, após mais de quatro meses de greve, os professores retornam às atividades acadêmicas sem avanços materiais efetivos, mas, com três certezas inabaláveis: 1) o único responsável pela maior greve do setor é o governo, que sem qualquer compromisso sério com a educação, apostou no desgaste e na destruição do Movimento, cumprindo a lógica do projeto neoliberal que defende e implementa; 2) os professores lutaram enquanto foi possível, pois sua força depende da unidade da categoria em nível nacional e, portanto, da disposição do conjunto dos docentes; e, 3) o término da greve não representa o fim da luta por uma educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada; mas, somente, uma suspensão no uso deste principal instrumento de luta.

                                               ASSEMBLEIA GERAL DA ADUFMAT, 14/10/2015


[1] = O PL 4.330/04 implica a precarização generalizada dos contratos formais de trabalho através da terceirização. As Medidas Provisórias 664 e 665 retiram direitos trabalhistas e previdenciários, além de impor perdas a setores vulneráveis como desempregados e pescadores. A MP 676 altera o Fator Previdenciário, estabelecendo mudanças prejudiciais no cálculo idade/tempo de serviço. Além disso, impõe a adesão compulsória dos novos servidores ao Fundo Privado de Previdência Social (FUNPRESP). A PEC 395/2014 ataca o princípio da gratuidade da educação pública estatal. O PLC 77/2015 amplia a consolidação das parcerias público-privadas na área da ciência e tecnologia, não apenas abrindo mercado e recursos para a iniciativa privada, mas inviabilizando a autonomia das linhas de pesquisa acadêmica. O Programa de Proteção ao Emprego garante não apenas a redução da jornada de trabalho, mas, principalmente, de salários dos trabalhadores, sem qualquer garantia de estabilidade. A chamada Agenda Brasil, proposta pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), representa tanto uma nova contrarreforma previdenciária, quanto a ampliação das terceirizações, o fim da gratuidade do SUS e, como arremate, a revisão das terras de proteção ambiental e demarcação das terras indígenas.

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