Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. Jornalismo/USP; Prof. Literatura/UFMT
Hoje é 15 de outubro!
É o primeiro 15 de outubro da falsa “Pátria Educadora”. É o primeiro da mais longa greve das universidades federais; greve que tende a terminar sem obter sequer uma audiência com o ministro da Educação. “Nunca antes...”, os professores foram tão maltratados por um governo civil tão desdenhoso quanto autoritário.
Por conta do contexto que envolve esta data, neste ano, eu deveria contribuir, no plano do discurso, para o massacre político a esse governo, que merece toda punição que venha do povo brasileiro; por consequência, eu deveria prestar homenagens a todos os professores, muitas vezes, vistos, equivocadamente, como missionários, e não como profissionais.
Não farei isso. Minhas homenagens serão no varejo. No atacado, elas poderiam abranger gente demais. Honrarias indevidas (des)educam.
E minhas seletivas homenagens surgem por conta das considerações de uma leitora sobre meu último artigo – “Gatos pingados na história” –, no qual ressalto a força de pequenos grupos de sujeitos organizados ao longo de nossa história. Culmino aquelas reflexões falando da greve das federias, conduzida por “meia dúzia de (resistentes) gatos pingados”.
A leitora – entremeando acertos e erros – chamou minha atenção, afirmando que a maioria das universidades federais apoiou o PT nas últimas eleições, e que “grande parte dos professores dessas universidades é esquerdista, assim como o atual governo”.
Começo pedindo licença para trocar o termo “esquerdista”, que é pejorativo, pela expressão “de esquerda”, que é respeitosa aos que verdadeiramente se opõem à lógica do capital.
E assim, afirmo: o governo petista não é de esquerda que, em tese, deveria optar pela classe trabalhadora, de onde veio. O PT no poder – negando suas origens – é tão neoliberal quanto o PSDB e outros. O PT engrossa a ala dos que contemplam os interesses do capital, adversos aos trabalhadores. O pacotaço do “ajuste fiscal” (de 14/09) escancarou, de vez, a triste verdade.
A metamorfose petista atingiu, sim, grande parte de meus colegas das federais, país afora. Muitos, principalmente os gestores, mas não apenas, passaram a seguir cegamente as determinações neoliberais. Isso fê-los defenestrar princípios e práticas. Hoje, até identificá-los como “esquerditas”, que é pejorativo, já seria homenagem indevida.
Esse grupo, que não é pequeno nas federais, de fato, ainda dá apoio político ao governo de coalizão do PT. Na reeleição de Dilma, houve quem posasse para uma foto de propaganda política. À época, condenei a cena no artigo “Seguradores de pirulitos” (02/10/14).
Portanto, pela condenação pública feita àquele apoio político dado pelos reitores das federais à reeleição de Roussef, a leitora com quem ora dialogo precisa reconhecer que nem todos os professores das federais estão no mesmo saco de farinha estragada.
Ainda que sejamos “meia dúzia de gatos pingados”, mantivemos nossos princípios. Por isso, lutamos bravamente para ver as universidades públicas realmente públicas, gratuitas, laicas e socialmente referenciadas. Longe de nos preocuparmos em primeiro lugar com nossos interesses particulares, e mesmo corporativistas, pensamos no futuro de nossas gerações, prestes a receber uma herança de condenados sociais. Pena que nossos discursos não cheguem a todos da mesma forma como chegam os de nossos adversários, tantos os internos quanto os externos.
Diante do exposto, homenageio apenas os professores que, com autonomia, pensam e lutam por um porvir digno para as nossas novas gerações.