****
Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
****
Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
****
Por Roberto de Barros Freire*
Foi noticiado que a escola Notre Dame puniu uma professora por ela ter manifestado sua opinião política. Punição realizada a pedido de pais de alunos, que se pudessem empregariam uma punição ainda superior aos três dias de suspensão que a infeliz da professora recebeu. Se dependesse deles, é bem capaz que colocariam a professora não na rua, mas na prisão.
Vejo nesse evento um absurdo completo. Em primeiro lugar, vivemos numa democracia onde as pessoas têm o direito de ter suas opiniões, mesmo que distintas da opinião dos pais dos alunos ou da direção da escola. Em segundo lugar, também por vivermos numa democracia, não basta ter o direito de ter uma opinião, é também intrínseco que se tem o direito de manifestá-la, pois, de que adiantaria ter uma opinião se não se pode manifestá-la? Em terceiro lugar, um professor tem não apenas o direito, mas o dever de manifestar sua opinião, para que seus estudantes percebam a multiplicidade de posições que a sociedade possui, inclusive quando são distintas dos pais dos alunos. A função da escola não é referendar a opinião dos pais, mas dar acesso a multiplicidades de posições do mundo, para que os estudantes tenham condições de criar sua própria opinião. É preciso fazê-los transcender as idiossincrasias familiares. Aliás, é função da escola fazer com que os estudantes abandonem os preconceitos domésticos. Se a escola repetir só o que os pais acreditam, os estudantes não precisariam de escola, seria mais econômico e prudente que ficassem em casa. O ensino tem a função de socializar as crianças, para que tomem contato com a multiplicidade social, cultural, religiosa e política.
Achar que o professor deve ser “neutro” é não apenas equivocado, mas uma posição tendenciosa e ideológica, atrasada, que defende o status quo, antes do que uma visão crítica. Não falar nada diante das calamidades que acontecem na sociedade é consentir com o que acontece, pois quem cala, consente. Se um professor se cala diante das injustiças sociais, ambientais, econômica, cultural e política ele está contribuindo para a continuidade das injustiças, não possibilitando que os estudantes absorvam outras visões, outros pontos de vistas, para que possa um dia ter os próprios. É preciso apresentar o contraditório para que se perceba que há outras formas de pensar e encarar os problemas. Uma escola que fornece apenas um ponto de vista, não forma, deforma seus estudantes, criando crianças tendenciosas e com visões limitadas e unilaterais.
Pelo que a reportagem mostrava a professora falou sobre questão ambiental, inflação e urna eletrônica. Não fez política partidária, falou para os alunos o que está acontecendo. Ela mentiu??? Então temos que formar alunos alienados? Ora, não existe neutralidade. Não suportar liberdade de expressão é que é problemático, isso é fascismo. E a justiça deveria se posicionar contra esses atos autoritários dos pais dos alunos e da direção da escola contrários a autonomia dos professores. Um professor não pode ser punido por manifestar sua opinião, ainda que não seja a opinião dos pais ou da direção da escola.
Temo que a ditadura está se implantando nessas atitudes miúdas, perseguindo a autonomia dos professores, proibindo as pessoas de se manifestarem, ameaçando a liberdade de cátedra. Houve épocas em que se respeitava os professores, hoje não se acredita na ciência, nem nas autoridades pedagógicas, segue-se apenas as ideologias mais tacanhas e medíocres. Qualquer um sem formação coloca em xeque as opiniões dos professores. Quando não se confia mais nos professores é porque se elencou a ignorância como o grande condutor dos homens. Não é à toa que há todo esse negacionismo da ciência em solo nacional e as pessoas acreditando nas fake news de WhatsApp.
No Brasil, pessoas sem cultura e conhecimento querem submeter professores e cientistas às suas ideologias pequenas e atrasadas. É um desserviço à nação. Não é à toa que temos péssimas escolhas na nossa representação política. E muitos desses se dizem favoráveis à liberdade: a liberdade de punir, não de se manifestar.
*Roberto de Barros Freire
Professores do Departamento de Filosofia/ UFMT
O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.