Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT
Depois de quase um mês de férias, retomo a escritura de meus artigos tratando de um importante tópico de nossa educação: a aprovação automática e um recente questionamento judicial sobre a questão por parte de uma escola particular do Distrito Federal (DF).
Antes, algumas lembranças. A quem viveu tempos estudantis mais rigorosos, sempre foi difícil entender a lógica que move a aprovação automática na educação brasileira. Naqueles idos tempos, ou aluno estudava, e era “aprovado de ano”, ou gazeteava tanto que, ao final, “reprovava de ano”. Simples assim.
Para a maioria, as dificuldades tinham de ser superadas, e pronto. Para isso, restava o estudo sério dos “pontos”. Em tais estudos, a memorização nunca foi condenável. Era até salutar e prazeroso ver como todos tinham de usar o cérebro para reter informações e depois processá-las como era possível. E sempre era possível.
Claro que muitas “maquinas humanas” foram produzidas por aquele sistema, mas o contrário também é verdadeiro. Os grandes intelectuais deste país se formaram naqueles moldes. Com o atual formato, duvido que este país consiga formar, nos limites da escola, algum outro intelectual. No máximo, continuará formando apenas acadêmicos; e às toneladas. Produção em série!
Mas o que mudou tanto em nossa educação?
Quase tudo. Das mudanças, destaco a aprovação automática. Por ela, nenhuma escola pode reter seus alunos antes dos períodos pré-marcados; ou seja, apenas a cada três anos, os professores, em tese, têm alguma autonomia para esse encaminhamento, hoje, considerado traumático e ineficiente para o desempenho escolar.
Após a inserção desse novo modelo de avaliação de nossos estudantes, acompanhado de um conjunto de consequências gravíssimas, o país vem colhendo os piores resultados na educação formal. Em todas as avaliações (nacionais ou internacionais) descemos a ladeira.
Das gravíssimas consequências, destaco a perda do papel social de nossos professores. Conforme as novas teorias, os docentes não devem ultrapassar o limite de um mediador do conhecimento. Logo, transmitir um saber, jamais. Essa postura é vista como autoritária etc. A lista da estupidez segue na mesma proporção da abundância dos teóricos estúpidos, todos vinculados à lógica da pós-modernidade.
Pois bem. Em meio ao caos, uma escola particular do DF, recentemente, entrou, e ganhou, na justiça, o direito de exercer as avaliações de desempenho de todos os seus estudantes com absoluta autonomia (conf. https://globoplay.globo.com/v/6363698/).
Essa decisão está na contramão de uma recomendação do MEC de 2010. Recomendação que, no caso das escolas públicas, significa imposição sem nenhum direito ao contraditório. A escola que se opuser a qualquer “recomendação” do MEC está condenada à miséria. Por isso, ninguém se opõe. Todos se submetem. Como consequência desse servilismo, o desânimo em relação à profissão vai se proliferando como praga em nossa educação.
Como consequência da consequência anterior, as escolas públicas vão despencando a cada nova avaliação.
É claro que no processo ensino aprendizagem não se deve apostar, previamente, na reprovação de nossos estudantes, mas isso não pode ser retirado de cena. Verificações mais rigorosas do aprendizado devem ocorrer sempre. Isso auxilia o estudante a buscar responsabilidades.
Depois dessa corajosa atitude localizada, espero que o país comece a repensar toda a dinâmica de nosso sistema educacional. Quase tudo está no rumo da descida de tom. É preciso rever a situação.