Cuiabá e Rondonópolis são a porta de entrada da concentração de rendas, de terras e do projeto de ocupação humana perversa e desalmada que assistimos. Infelizmente está vivo e ativo o modelo da ocupação da Amazônia Legal prescrito e colocado em prática pela ditadura civil-militar. Suas vivandeiras em rebuliço, tentando reoxigenação neste quadro de acumulação crônica do neofascismo, conservadorismo e do atraso, que perpetra desigualdades e injustiças.
Nestes tempos, não mais os incentivos da SUDAM, PROTERRA, dos tempos sombrios da devastação das saudosas matas de madeira de lei por grandes fazendeiros. As expensas dos financiamentos excessivamente privilegiados (SUDAM, PROTERRA, POLOCENTRO...), em grande parte desviados das suas aplicações, por absoluta falta de controle do setor público. Dinheiro de incentivos e isenções e sonegações, é dinheiro do povo. Daí vem o plano não dito de devastação de recursos naturais, preparando a entrada do capitalismo predatório no campo. A porta de entrada não é mais a Transamazônica, erro estratégico da ESG, EMFA, já sob assessoria de organismos multilaterais como o Banco Mundial, o BIRD, com receitas rigorosamente neoliberais.
Um programa eixo que MT entrou de cabeça e corpo, foi o chamado “corredores de exportação”. Claro, de matéria prima, do potencial das commodites, papel imposto a países subdesenvolvidos, como o Brasil. Tornou-se objeto de cobiça a Amazônia Legal e MT, fundamentais para esta política neocolonizadora. Ocupar primeiro pelas patas do boi, com pecuária extensiva para introduzir lentamente a agricultura industrial. Na cena, monoculturas, da carne bovina a borracha, minério, chegando a soja e os produtos atuais da pauta de exportação privilegiada do agronegócio. Como país dependente, exportar produções primárias, hoje ao risco de compra do mercado chinês(soja), e potencialmente da Índia. Podem surgir fatos novos, mas tudo é uma zona cinza.
Com as restrições possíveis de um mercado inseguro com a crise internacional global, a agenda da balança comercial fica francamente dificultada. Eis aí a crise chinesa e as restrições abertas com a entrada de Trump na pauta de protecionismo e rompimento de acordos no mercado internacional. É possível que decorra disto a criação de novos mercados, no entanto continuamos exportadores de matérias primas.
Custos não considerados no Brasil: a perda de recursos naturais, a fraca proteção ambiental, a perda de direitos indígenas, quilombolas, de populações originárias de pescadores e sem terra estão fora deste modelo. Senão, como cosmética, fazer de conta, que ameaça o discurso da proteção ambiental do Brasil e de MT, tomado pelos interesses da bancada ruralista na banda defensora da “terra arrasada”. Daí, as bancadas no Congresso e nos legislativos do agronegócio, da bala, evangélica e Centrão se unirem.
Desde a descaracterização como do Código Florestal, a desativação da fiscalização e direcionamento por parte dos órgãos públicos responsáveis, a desativação da demarcação de terras indígenas e quilombolas. A desativação da perspectiva da reforma agrária, o êxodo para cidades, índios urbanizados, compõem o quadro de desigualdade, violência e miséria também nas cidades. É muito grande a escala de benefícios que contempla a produção de soja aqui em MT. Além do alto custo no modelo predatório na natureza, na lógica de produzir sem limites e restrições, não paga imposto. Mato Grosso é o maior produtor de soja, coerentemente, o maior consumidor e aplicador de venenos agrícolas no país, os agrotóxicos. As estatísticas são ruins e não confiáveis. Há muito “veneno nosso de cada dia”, indo além dos seis quilos por habitante/ ano.
O canto de revolta da Imperatriz Leopoldinense é real, com suas alas denunciando a realidade do agronegócio, o impacto deletério sobre os povos indígenas e seus venenos. Que não são químicos, como a agressão e a espoliação das terras e povos indígenas, mais recente, um seu braço auxiliar, as hidrelétricas e as vias de transportes de grãos in natura. Os povos indígenas resistem e pedem socorro. De MS as fronteiras, Juruena, Tapajós, Teles Pires, Perigara, tantos outros cursos d’água e territórios sagrados, todos os espaços e entornos onde vivem os povos indígenas .Será? – que eu serei o dono desta terra? Qual modelo de desenvolvimento?
Waldir Bertulio é professor aposentado da UFMT