Roberto Boaventura da Silva Sá
Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP
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No sentido oposto do que seria necessário, várias coisas estão se desmanchando no Brasil. O ensino médio é uma delas. O mais recente capítulo de um longo processo de seu desmonte foi o anúncio governamental de uma Medida Provisória (MP) que altera a estrutura curricular dessa etapa de nossa educação formal.
Dentre outras barbáries, a MP transforma as atuais treze disciplinas da grade em cinco “grandes áreas”, sendo uma profissionalizante, e torna obrigatório apenas os ensinos de português, matemática e inglês. Para o regozijo dos educadores pós-modernos, o restante fica por conta da flexibilidade curricular; ou seja, do que é possível cada unidade escolar ofertar diante de sua realidade.
E para falar de realidade, e, consequente, de desigualdades sociais, temos novos números acabados de sair do forno do próprio MEC. Na manhã de anteontem (04/10), o Ministério da Educação divulgou os resultados do ENEM/2015.
Diante dos números, a mídia “manchetou” seus jornais e telejornais. Em geral, o resumo midiático ficou da seguinte forma: “Das 100 escolas com maior nota média no ENEM/2015, 97 são privadas”; “Das 100 melhores escolas no ENEM/2015, apenas 03 são públicas”. As três públicas são institutos federais.
Pois bem. Dito de um jeito ou de outro, a realidade é a mesma: a tragédia no ensino médio é cada vez mais marcante entre o proletariado. Aqui, uso a palavra “proletariado” – e não outra equivalente qualquer – por saber que esse termo faz tremer até os anjinhos do céu.
E é bom que tremam mesmo, pois se uma revolta popular não ocorrer neste país, a violência desenfreada, fruto da ignorância socialmente produzida, será tão óbvia quanto incontrolável e insuportável. A pavimentação para a tragédia, seja ela do tipo que for, já foi feita. Essa pavimentação pode ser lida (também) por meio desses números explicitados pelo ENEN. Por trás deles há muitas coisas sendo ditas.
De tudo o que está sendo dito por esses números, destaco a equivalência entre a tragédia do ensino formal com a pobreza. Equivalência, repito, não natural, mas socialmente criada e consolidada.
Estou dizendo isso porque há décadas o ensino brasileiro, principalmente o nível médio, vem se mostrando fracassado. Todavia, a cada pico do fracasso, as propostas apresentadas são, de antemão, igualmente fracassadas.
De todos esses fracassos, o último foi exatamente a imposição da transformação do ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio – em vestibular nacional unificado para as universidades, com ênfase às federais.
Como sempre foi um opositor do ENEN, venho catalogando um enorme conjunto de tolices ditas por “gente muito importante” da área da educação. Uma das tolices foi dizer que o ENEM, naturalmente, melhoria o nível do ensino médio.
E melhorou mesmo, mas apenas das escolas privadas. Das públicas, como era previsto, piorou; e muito. Na verdade, degradou-se. Virou pó, assim como o governo do partido político (PT) que nos impôs isso ao invés de enfrentar o problema como deveria, posto reivindicar para si a representação do proletariado, com ênfase aos segmentos sociais mais desvalidos, como os negros, por exemplo.
Resumo da tragédia brasileira: estamos diante de um dos momentos mais complexos de nossa história. Urge a qualificação – educacional e cultural – de nosso povo. Caso contrário, preparemo-nos. Literalmente, muito chumbo grosso vira por aí.