José Domingues de Godoi Filho
UFMT/Faculdade de Geociências
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Em 12 de maio, com a publicação da Medida Provisória 727/2016, os vampiros “transilvânicos”, comandados pelo Drácula Temer e aliados à turma da “privataria tucana”, ressuscitaram o processo de desestatização implantado pelo governo FHC, que pretendia entregar à iniciativa privada as empresas estatais de interesse do capital privado, incluindo a Petrobrás, a Eletrobrás, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, dentre outras.
Com tal medida, agora poderão ser objeto de desestatização todas as empresas controladas, direta ou indiretamente, pela União e as estaduais e municipais. De acordo com o art.1º: “Fica criado, no âmbito da Presidência da República, o Programa de Parcerias de Investimentos - PPI destinado à ampliação e fortalecimento da interação entre o Estado e a iniciativa privada por meio da celebração de contratos de parceria para a execução de empreendimentos públicos de infraestrutura e de outras medidas de desestatização.
§ 1º Integram o PPI:
I- os empreendimentos públicos de infraestrutura executados por meio de contratos de parceria celebrados pela administração pública direta e indireta da União;
II- os empreendimentos públicos de infraestrutura que, por delegação ou com o fomento da União, sejam executados por meio de contratos de parceria celebrados pela administração pública direta ou indireta dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios; e
III- as demais medidas do Programa Nacional de Desestatização a que se refere a lei nº 9.491, de 1997.” (grifo meu)
A MP 727/2016, no melhor estilo “transilvânico temerista”, se aprovada, será implementada por decretos que passarão por cima de qualquer outra medida, senão vejamos:
Art. 4º. O PPI será regulamentado por meio de decretos que, nos termos e limites das leis setoriais e da legislação geral aplicável, definirão:
I- as políticas federais de longo prazo para o investimento por meio de parcerias em empreendimentos públicos federais de infraestrutura e para a desestatização;
II- os empreendimentos públicos federais de infraestrutura qualificados para a implantação por parceria e as diretrizes estratégicas para sua estruturação, licitação e contratação;
III- as políticas federais de fomento às parcerias em empreendimentos públicos de infraestrutura dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios;
IV - as demais medidas de desestatização a serem implementadas; e
V - a agenda das ações.
No art. 5º, a MP 727/2016 dispõe que “os empreendimentos do PPI serão tratados como prioridade nacional por todos os agentes públicos de execução ou de controle (grifo meu), da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.” Assim, não só os agentes encarregados de conduzir as parcerias, mas também os órgãos de controle, devem dar prioridade aos empreendimentos do PPI.
O Capítulo II da MP 727/2016 define que a execução dos projetos terá como órgão assessor ao Chefe do Poder Executivo o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República (grifo meu) e incorporará as atribuições do Conselho Nacional de Desestatização criado pela mesma Lei N° 9.491, de 1997, que esteve à frente das privatizações de FHC.
Estabelece o art. 7º: - “Fica criado o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República como órgão de assessoramento imediato ao Chefe do Poder Executivo no estabelecimento e acompanhamento do PPI.
§ 1º. O Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República opinará, previamente à deliberação do Presidente da República, quanto às propostas dos Ministérios setoriais e dos Conselhos Setoriais (incisos IV e X do § 1.º do art. 1º. da lei nº. 10.683, de 2003) sobre as matérias previstas no art. 4º desta lei, e acompanhará a execução do PPI.
§ 2º. O Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República passa a exercer as funções atribuídas:
I- ao órgão gestor de parcerias público-privadas federais pela lei n.º 11.079, de 2004;
II- ao Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte pela lei nº 10.233, de 2001; e
III- ao Conselho Nacional de Desestatização pela lei nº 9.491, de 1997.
§ 3º. O Conselho será presidido pelo Presidente da República e integrado, com direito a voto, pelo Secretário Executivo do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, que também atuará como Secretário Executivo do Conselho, pelo Ministro Chefe da Casa Civil, pelos Ministros de Estado da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão, dos Transportes, Portos e Aviação Civil e do Meio Ambiente e pelo Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES.
§ 4º. Serão convidados a participar das reuniões do Conselho, sem direito a voto, os Ministros setoriais responsáveis pelas propostas ou matérias em exame e, quando for o caso, os dirigentes máximos das entidades reguladoras competentes e o Presidente da Caixa Econômica Federal.
§ 5º A composição do Conselho do Programa de Parcerias de Investimento da Presidência da República observará, quando for o caso, o § 2.º do art. 5º da lei 9.491, de 1997.
§ 6º. Visando ao aprimoramento das políticas e ações de regulação, o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República poderá formular propostas e representações fundamentadas aos Chefes do Poder Executivo dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como recomendações aos órgãos, entidades e autoridades da administração pública da União.
Com tal definição e, como já mencionado, “os empreendimentos do PPI serão tratados como prioridade nacional por todos os agentes públicos de execução ou de controle, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. As obras de infraestrutura representarão, em todos os níveis federativos, o caminho prioritário para a acumulação e lucro, tanto para os investidores e especuladores nacionais, quanto para os internacionais. Sob o comando da Presidência da República, com a aprovação da MP 727/2016, tal prioridade será imposta acima de tudo e de todos, inclusive nos planos estadual e municipal.
No art. 18 são, na prática, eliminados os obstáculos sociais, ambientais, culturais e trabalhistas que possam postergar ou interferir no lucro buscado pelos investidores privados.Vejamos:
- “Art. 18. Os órgãos, entidades e autoridades estatais, inclusive as autônomas e independentes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, com competências de cujo exercício dependa a viabilização de empreendimento do PPI, têm o dever de atuar, em conjunto e com eficiência, para que sejam concluídos, de forma uniforme, econômica e em prazo compatível com o caráter prioritário nacional do empreendimento, todos os processos e atos administrativos necessários à sua estruturação, liberação e execução. (grifo meu)
§1º Entende-se por liberação a obtenção de quaisquer licenças, autorizações, registros, permissões, direitos de uso ou exploração, regimes especiais, e títulos equivalentes, de natureza regulatória, ambiental, indígena, urbanística, de trânsito, patrimonial pública, hídrica, de proteção do patrimônio cultural, aduaneira, minerária, tributária, e quaisquer outras, necessárias à implantação e à operação do empreendimento. (grifo meu)
§2º Os órgãos, entidades e autoridades da administração pública da União com competências setoriais relacionadas aos empreendimentos do PPI convocarão todos os órgãos, entidades e autoridades da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, que tenham competência liberatória, para participar da estruturação e execução do projeto e consecução dos objetivos do PPI.”
Trata-se da retomada da “privataria” do tucanistão de FHC, de forma ainda mais agressiva, com a adoção da ultraliberal “Agenda Brasil” anunciada inicialmente como “Ponte para o Futuro” (ou, melhor - para o atraso?). A prioridade é o empreendimento e a garantia da acumulação capitalista.
Todos os órgãos, inclusive o MMA – Ministério de Meio Ambiente, terão o “dever de atuar, em conjunto e com eficiência, para que sejam concluídos, de forma uniforme, econômica e em prazo compatível com o caráter prioritário nacional do empreendimento, todos os processos e atos administrativos necessários à sua estruturação, liberação e execução”.
O conceito de liberação adotado deixa claro a voracidade e a disposição de impor os empreendimentos a qualquer custo: “a obtenção de quaisquer licenças, autorizações, registros, permissões, direitos de uso ou exploração, regimes especiais, e títulos equivalentes, de natureza regulatória, ambiental, indígena, urbanística, de trânsito, patrimonial pública, hídrica, de proteção do patrimônio cultural, aduaneira, minerária, tributária, e quaisquer outras, necessárias à implantação e à operação do empreendimento”. Ou seja, na prática, como mencionei anteriormente, o MMA, o IBAMA, o ICMBIO, a FUNAI, a Fundação Cultural Palmares e o IPHAN não poderão atuar para evitar que empreendimentos passem por cima das leis de proteção do meio ambiente, de indígenas e outros povos e comunidades tradicionais; ao contrário, serão convocados para emitir as licenças necessárias aos empreendimentos definidos como prioritários pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República.
A situação (o golpe) começou ser pavimentada com a aprovação, sem alarde, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, no dia 27/04/2016, da PEC 65/2012, que rasga a legislação ambiental aplicada em processos de licenciamento de obras públicas, como demonstra didaticamente o Ministério Público Federal/Grupo de Trabalho Grandes Empreendimentos em sua nota técnica: -“ A Proposta de Emenda Constitucional nº 65/2012, ao acrescentar o § 7 no art. 225 da Constituição com a redação apresentada e aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal , altera por completo a sistemática vigente acerca do licenciamento ambiental, em flagrante. Violação a Cláusulas Pétreas da Constituição Federal, a princípios constitucionais explícitas e a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil perante a comunidade internacional.”(NOTA TÉCNICA – A PEC 65/2012 – MPF)
Soma-se o Projeto de Lei do Senado (PLS) 654/2015, de autoria do Senador Romero Jucá, que define um prazo curtíssimo para o licenciamento de grandes obras consideradas estratégicas pelo governo, como grandes hidrelétricas e estradas e que estabelece que em caso de descumprimento dos prazos, as licenças estarão automaticamente aprovadas. Com a aprovação da MP 727/2016, o “zelo” do Senador Jucá pelas questões socioambientais se tornará dispensável. Haja golpes.
Também é importante ressaltar que é criado, dentro do BNDES, um espaço privado para ampliar os ganhos dos investidores com a criação do Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias:
- “Art. 16. Fica o BNDES autorizado a constituir e participar do Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias, que possuirá prazo inicial de dez anos, renovável por iguais períodos, natureza privada e patrimônio próprio separado do patrimônio do administrador e dos cotistas, e que terá por finalidade a prestação onerosa, por meio de contrato, de serviços de estruturação e de liberação para parcerias de empreendimentos no âmbito do PPI.
§1º O Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias será sujeito de direitos e obrigações próprios, com capacidade de celebrar, em seu nome, contratos, acordos ou qualquer ajuste que estabeleça deveres e obrigações e seja necessário à realização de suas finalidades.
§ 2º. O administrador e os cotistas do Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias não responderão por qualquer obrigação do Fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem.
§ 3º. O Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias será administrado, gerido e representado judicial e extrajudicialmente pelo BNDES.
§ 4º O Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias poderá se articular com os órgãos ou entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuja atuação funcional seja ligada à estruturação, liberação, licitação, contratação e financiamento de empreendimentos e atividades, para troca de informações e para acompanhamento e colaboração recíproca nos trabalhos.
§ 5º Constituem recursos do Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias:
I- os oriundos da integralização de cotas, em moeda corrente nacional, por pessoas de direito público, organismos internacionais e pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, estatais ou não estatais;
II- as remunerações recebidas por seus serviços;
III- os recebidos pela alienação de bens e direitos, ou de publicações, material técnico, dados e informações;
IV- os rendimentos de aplicações financeiras que realizar; e
V- os recursos provenientes de outras fontes definidas em seu estatuto.
§ 6º. O Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias destinará parcela do preço recebido por seus serviços como remuneração ao BNDES pela administração, gestão e representação do Fundo, de acordo com o seu estatuto.
§ 7.º O Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias não pagará rendimentos a seus cotistas, assegurado a qualquer deles o direito de requerer o resgate total ou parcial de suas cotas, fazendo-se a liquidação com base na situação patrimonial do Fundo, sendo vedado o resgate de cotas em valor superior ao montante de recursos financeiros disponíveis ainda não vinculados às estruturações integradas já contratadas, nos termos do estatuto.
§ 8.º O estatuto do Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias deverá prever medidas que assegurem a segurança da informação, de forma a contribuir para a ampla competição e evitar conflitos de interesses nas licitações das parcerias dos empreendimentos públicos.”
O BNDES, se aprovada a MP 727/2016, será o responsável pela garantia das condições financeiras e técnicas para a estruturação dos projetos de infraestrutura destinados aos investidores privados. Como fica claro no art. 16, § 8º, todo o processo não terá preocupação nenhuma com a transparência; ao contrário, o Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias “deverá prever medidas que assegurem a segurança da informação”. Ficam para trás qualquer perspectiva de transparência e de compromisso socioambiental também por parte do BNDES.
Finalmente, considerando, as fundações de apoio, de direito privado, impostas às universidades públicas, os cortes orçamentários, o estupro produzido pela DRU – Desregulamentação das Receitas da União, na destinação de verbas, previstas constitucionalmente, para a educação e o famigerado Código de Ciência, Tecnologia e Inovação, o art. 17 da MP 727/2016 abre espaço para mais um golpe ,isto é, a utilização indevida das universidades públicas para atender interesses privados ao prever que:
- “Art. 17. Para a execução dos serviços técnicos para os quais houver sido contratado, o Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias poderá se utilizar do suporte técnico externo de profissionais, empresas ou entidades de elevada especialização, cabendo aos agentes públicos do Fundo a coordenação geral dos trabalhos e a articulação com a administração pública titular e com os demais órgãos, entidades e autoridades envolvidos.
§1º. A contratação de serviços técnicos pelo Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias será realizada mediante regime de contratação a ser instituído de acordo com a legislação aplicável.
§2º. Os contratos de serviços técnicos celebrados com os profissionais, empresas ou entidades de elevada especialização técnica a que se refere o caput preverão que os autores dos projetos e estudos, na condição de contratados ou de subcontratados, e seus responsáveis econômicos, ficarão proibidos de participar, direta ou indiretamente, da futura licitação para a parceria.”
Com os retrocessos da “Ponte para o Futuro” e a publicação da MP 727/2016, o vampiro Temer retira do túmulo o programa entreguista “tucanistanês” de FHC e incorpora à sua horda os “tucanistaneses” Senador José CHEVRON Serra (Ministro das Relações Exteriores), o economista do apagão Pedro Parente (Presidente da Petrobrás), o mesmo que tentou impor uma penalidade a um docente da USP que publicou um trabalho expondo os descaminhos da política energética do governo FHC e o Senador Aloysio Nunes (líder do governo no Senado) que no dia seguinte à votação do impeachment viajou aos EUA para reuniões com autoridades norte-americanas, lobistas e especuladores. Como divulgado pelo The Intercept o Senador Nunes foi “se reunir com o presidente e um membro do Comitê de Relações Internacionais do Senado, Bob Corker (republicano, do estado do Tennessee) e Ben Cardin (democrata, do estado de Maryland), e com o Subsecretário de Estado e ex-embaixador no Brasil, Thomas Shannon, além de comparecer a um almoço promovido pela empresa lobista de Washington, Albright Stonebridge Group, comandada pela ex-secretária de Estado de Clinton, Madeleine Albright e pelo ex-secretário de Comércio de Bush e ex-diretor-executivo da empresa Kellogg, Carlos Gutierrez.” (Acessível em https://theintercept.com/2016/04/18/porque-o-sen-aloysio-nunes-foi-a-washington-um-dia-depois-da-votacao-do-impeachment/ - Em 01/06/2016.)
Com esse projeto político ideológico busca-se resgatar e incorporar com mais agressividade O TUCANISTÃO DE FHC À TRANSILVÂNIA TEMERISTA.
(*) - O texto foi uma contribuição à construção do TA e do TR para o 61º CONAD sobre a MP 727/2016, conforme encaminhamento da reunião conjunta GTPAUA e GTCT.