Por Waldir Bertúlio*
O Governo Federal, dos tempos de Getúlio Vargas, decidiu extinguir o Território do Iguaçu (entre Paraná e Santa Catarina). Havia também o Território de Ponta Porã, que ocupava áreas desde a hoje grande Dourados até as fronteiras com o Paraguai. O então parlamentar João Ponce de Arruda, sub-repticiamente insere na lei a ser votada, também o território de Ponta Porã. Extinguiram os dois territórios em uma só canetada e votação. Equipe do Governo do Estado foi receber o acervo dos territórios, chefiada por Arquimedes Pereira Lima. Dourados e mais sete municípios pertenciam ao território de Ponta Porã.
João Augusto Capilé Junior era Prefeito de Dourados, assumindo a gestão no lugar de Carvalinho, a quem apoiou na eleição a prefeito. Para assumir a prefeitura, renuncia ao mandato de Vereador, ao qual foi eleito com o maior sufrágio de votos, tendo comandado a prefeitura de Dourados por duas gestões. Mais conhecido como Sinjão Capilé, defendia princípios de austeridade, inovação e progresso para o município. Aqueles tempos eram de enfrentamento pesado na política, onde a violência e a briga entre clãs e grupos políticos eram duras e sangrentas. Uma das inovações era o planejamento, a transparência no uso dos recursos públicos. Os oponentes políticos lutavam permanentemente para encontrar algo que desgastasse ou maculasse seu nome na gestão do município de Dourados.
Nada encontrando, denunciaram como desvio, o desaparecimento de uma simples “bigorna” de ferreiro que existia na Usina a óleo diesel que fornecia luz para a cidade. Denúncia: roubaram a bigorna, outra, que o gestor da Usina era compadre do então prefeito, por isso, “mancomunados”. A equipe do Governo deu oficialmente como extraviada a bigorna, que tentavam como a única prova frágil de possível desvio. Sua gestão foi ilibada. Ele tinha concretizado através da proposta encaminhada pelo parlamentar Dr. Camilo a criação do município de Itaporã. Ativista de um projeto de colonização pública, foi fundador da Colônia de Dourados. Veio de vez para Cuiabá em 1961, ocupando vários cargos públicos. Pensou e implementou projetos de colonização para pequenos e médios agricultores. Um sonhador com pés no chão, sabendo sobretudo, que a política é jogo duro e pesado. Exímio articulador político, conduziu uma proposta de modernização e rigor na gestão pública.
Mas, o que é encantador na história de vida de Sinjão Capilé? A compreensão essencial de que na política, no jogo político, é que se expressam as decisões que podem melhorar a vida da população com a boa gestão pública. Caminhou com sua experiência, conhecimento e persistência, em uma pedagogia política do convencimento sobre o caráter público das representações políticas. Culto, literato, sóbrio e crítico nos embates e conflitos políticos. Como pensador, manteve crítica radical aos valores da sociedade e seu confronto com uma filosofia de vida que veio reduzindo implacavelmente os valores humanos e éticos. Dizia, temos que procurar em nossas condições, buscar os espaços socialmente disponíveis. Temos que desafiar a realidade, na audácia suficiente para que não fiquemos fingindo de acreditar ingenuamente que as realizações podem estar ali, prontas e completas. É preciso construí-las, e sem esperança e crença, isto não seria possível. Nos últimos tempos aguçou sua preocupação com os destinos do Brasil, especialmente dos dois Mato Grosso com a necessidade do progresso e o empobrecimento profundo da representação política.
Dizia, tenho saudade sim do passado, mas é o futuro que nos espera. Sua inquietude: como parar e reabilitar a feroz máquina de moer governamental que coloca a política em descrédito e no fundo do poço? Sinjão Capilé completaria hoje 100 anos de idade, deixou este plano há nove meses atrás. Seguiu acreditando no caminho da redenção política, do crescimento e do progresso sócio econômico. Sem dúvida, um homem à frente dos seus tempos vividos. Com a certeza da mudança no tempo presente!
*Waldir Bertulio é professor da UFMT.