Nesta terça-feira, 02/04, docentes, estudantes e servidores técnico-administrativos da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) escolhem a Reitoria que administrará a instituição pelos próximos quatro anos. Conforme acordado entre todos os envolvidos antes mesmo do início do processo, a chapa indicada pela comunidade no final da votação de hoje, que já se dá em segundo turno, ocupará o primeiro lugar na lista tríplice enviada ao Governo Federal e, seguindo a tradição democrática, deve ser a indicada ao posto.
Na segunda-feira, 01/04, a comunidade ouviu o último debate entre os candidatos Marluce Souza e Silva e Silvano Galvão (Chapa 1) e Evandro Soares e Márcia Hueb (Chapa 2). O auditório do teatro universitário estava praticamente lotado, mas, muito embora as duas candidaturas representem grandes diferenças de concepção de universidade e formas de financiamento, o debate acabou perdendo algum espaço para acusações sem provas e o atual reitor, Evandro Soares, que ignorou o convite da Associação dos Docentes (Adufmat-Ssind) para assinar carta de compromisso no dia 26/02 afirmou, em resposta à pergunta da própria entidade, que considera justo cobrar pela sua permanência nos campi.
O debate começou com as falas das entidades que organizam e realizam o pleito. A representante dos servidores técnico-administrativos, Merilin Castro (Sindicato dos Técnicos – Sintuf/MT), lembrou que a categoria está em greve e que os trabalhadores esperam diálogo da próxima administração. O representante estudantil (Diretório Central dos Estudantes - DCE), Wesley Da Mata, ressaltou a dedicação da comunidade acadêmica na construção da Consulta. Pela Adufmat-Ssind, o diretor geral, Maelison Neves, lembrou que na mesma data o golpe empresarial-civil-militar sofrido no Brasil em 1964 completou 60 anos, e a realização da consulta significa mais uma forma de reafirmar a ojeriza a este modelo nefasto de política.
Em seguida as chapas se apresentaram e a Comissão deu início ao primeiro bloco de perguntas, feitas pelas categorias. O Sintuf-MT perguntou sobre as propostas de incentivo à qualificação da categoria, que é um direito, mas muitas vezes esbarram nas chefias, até mesmo pela falta de técnicos. A Adufmat-Ssind perguntou qual será a postura da gestão em relação às sedes da entidade dentro dos campi, e, por fim, o DCE questionou sobre as políticas voltadas para as mães, especialmente do período noturno.
A Chapa 1 respondeu que é solidária à greve dos servidores técnico-administrativos e que tem propostas de valorização e qualificação para todos os servidores e de melhoria de condições para os estudantes. Além disso, afirmou que o dimensionamento da falta de técnicos será construído junto com as entidades. Sobre as sedes da Adufmat-Ssind e de todas as outras entidades, afirmou que estarão garantidas. “As entidades sempre estiveram dentro, perto, não é possível que sejamos expulsos da nossa casa. As entidades inclusive, estão realizando este processo tão importante para todos nós. Em Sinop os centros acadêmicos não têm nem sala. Nós estaremos atentos a garantia dos direitos dos trabalhadores”, afirmou a candidata pela Chapa 1, professora Marluce Souza e Silva.
A Chapa 2 respondeu que a capacitação dos servidores técnico-administrativos não é só uma promessa, mas uma realidade. “Implantamos um mestrado exclusivamente para os técnicos – isso representa um aumento de cerca de 50% de salário. Para o próximo ano, temos a proposta de mais três mestrados ou um doutorado, dependendo da demanda”, disse o candidato da Chapa 2, Evandro Soares. Sobre as sedes da Adufmat-Ssind, o atual reitor afirmou que não existe cobrança de aluguel, nem de luz ou internet, que tudo é pago com recursos públicos e, se a Adufmat-Ssind recebe contribuição sindical, precisa pagar as próprias contas. Reafirmou, assim, a ideia de cobrar aluguel das entidades apesar dos contratos de comodato em plena vigência, como já tentou fazer em 2021. “Temos que fazer o que é legal e certo”, concluiu, sem tocar no fato de que ignorou a convocação da Adufmat-Ssind para assinatura da carta de compromissos – que continha, inclusive, a cláusula de respeito ao contrato de comodato.
Sobre as políticas para as discentes que são mães, Soares afirmou que a Andifes conseguiu aumentar o recurso destinado ao Pnaes (Plano Nacional de Assistência Estudantil) e isso permitirá o pagamento de bolsa às mães; o candidato se colocou contrário à proposta de creche defendida pela Chapa 1, dizendo que isso fere os princípios de universalidade e equidade do serviço público. Voltando a citar sua preferência pela “legalidade”, defendeu a atuação em favor da aprovação do PL 2189/19 (Gustinho Ribeiro - SOLIDARI/SE), que visa a criação de “espaços kids” dentro das instituições de ensino.
Foi justamente durante o segundo bloco, quando as perguntas deveriam ser feitas pelas próprias chapas, que as acusações tiveram maior expressividade. O candidato da Chapa 2, Evandro Soares, atacou sua oponente, dizendo que, como diretora do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) há oito anos, ela também era responsável pelo caos que denuncia, mas preferiu ser o tipo de diretor “inerte, que transfere sua responsabilidade aos outros”. “Se é assim agora, imaginem depois?”, provocou, como fez em praticamente todos os debates. Por fim, questionou quais foram as principais mudanças no ICHS durante sua gestão e como conseguiu recursos. Neste mesmo bloco o atual reitor disse, sem nenhuma prova, que a candidata da Chapa 1 faltou a metade das atividades do Conselho Universitário quando era conselheira, e também atacou apoiadores da chapa adversária.
A candidata da Chapa 1, Marluce Souza e Silva, rebateu. “Quando a pessoa enxerga só a si mesmo, tem dificuldade de reconhecer as contribuições dos outros. Eu não sou gestora de gabinete, eu ando nos corredores, converso com os estudantes, técnicos e docentes”, pontuou, respondendo, em seguida, que durante as suas duas gestões no ICHS nunca deixou de realizar pesquisas, seminários regionais e nacionais, além do maior projeto de extensão da universidade - que totalizou 900 horas - com palestrantes de reconhecimento nacional e internacional. Também disse que nunca deixou de dialogar com as entidades representativas, lançar livros, e deu um prazo de 48h para que Evandro apresente provas sobre suas ausências no Consuni e que sustentem os ataques aos seus apoiadores. “Nós poderíamos ter realizado muito mais se não estivéssemos aqui, enfrentando as dificuldades. Eu fui do Consuni, sim, ajudei a construir muitas coisas, inclusive um plano de segurança para a universidade que foi aprovado em abril de 2023 e até agora não foi implementado. Então eu devolvo a pergunta, o que foi que você fez, Evandro?”, finalizou a candidata.
Em resposta, o candidato da Chapa 2 disse que conseguiu recursos diversos para a instituição, com parlamentares de todas as inspirações ideológicas, sendo R$ 12 milhões para a saúde indígena, cerca de R$ 500 mil para a Equoterapia, os quais fez questão de dizer que vieram do deputado federal Abílio Brunini (PL/MT), entre outros. “Eu trabalho não para mim, mas para que os outros realizem seus projetos”, afirmou Soares.
Souza e Silva voltou a reclamar das perdas orçamentárias que a universidade não conseguiu recuperar, e Soares respondeu que sua gestão mudou a UFMT quando inseriu um plano estratégico de discussão do orçamento dentro dos conselhos.
A preocupação com orçamento é uma das principais dentro da instituição. Estima-se que, nos últimos 10 anos, as universidades federais perderam cerca de R$ 120 bilhões do recurso destinado ao ensino superior. Isso ficou ainda mais claro na abertura do terceiro bloco do debate, com a pergunta da professora Meire Rose, sobre como administrar a instituição com recursos insuficientes.
A pergunta dos técnico-administrativos foi sobre como melhorar a gestão de contratos, fiscalizados pelos servidores, que acabam sofrendo críticas injustamente e, em alguns casos, até assédio. O segmento estudantil perguntou sobre as propostas de extensão para levar a universidade para além dos muros da UFMT.
A candidata da Chapa 1 iniciou as respostas, reafirmando que não será fácil administrar com orçamento tão reduzido, e que justamente por isso a comunidade, como um todo, precisa debater como melhor utilizá-lo. O candidato à vice-reitor, Silvano Galvão, respondeu sobre a fiscalização, alegando que as críticas ouvidas dizem respeito à indicação aleatória de pessoas para este ofício. “A discussão tem de ser a qualificação e diálogo humanizado com os técnicos, porque as vezes nem ele mesmo quer ficar naquela função. Então, temos de buscar as experiencias exitosas para que possamos melhorar dia após dia esse setor”, disse. Sobre a extensão, a Chapa 1 respondeu que é um dos pilares da universidade que mais arrecada recursos e que estes não estão sendo utilizados em seu benefício atualmente, o que é um equívoco.
O candidato da Chapa 2, Evandro Soares, afirmou que continuará buscando emendas parlamentares e estabelecendo relacionamentos com os setores público e privado para arrecadação de recursos. Sobre a análise de contratos, lamentou que a universidade já teve 25 engenheiros no setor e hoje não tem nem 10, devido a perda de servidores técnico-administrativos. Sua proposta, no entanto, é fazer um termo administrativo que permita a contratação de empresa terceirizadas para fiscalizar os contratos com outras empresas terceirizadas. Com relação à extensão, exaltou políticas voltadas às populações indígena e quilombola, o programa Bid-Pantanal, ampliação das bolsas e a realização da Jornada Universitária pela Reforma Agrária (Jura).
Novo bloco de perguntas trouxe questões relacionadas às políticas para a pós-graduação e as péssimas condições do Restaurante Universitário (RU), além do corte de bolsas no orçamento da UFMT.
De acordo com a candidata Marluce Souza e Silva, a pós-graduação da UFMT é bem autônoma, inclusive para a captação de recursos, o que facilita a sua gestão, diferentemente da graduação. No entanto, há problemas gerados pela falta de técnicos, e isso precisa ser resolvido. Com relação ao Restaurante Universitário, reafirmou as péssimas condições denunciadas há anos pelos estudantes, além dos problemas nas contas, como o quilo de açúcar a R$ 53, que não foram resolvidos até hoje. A candidata também falou sobre os problemas que atingiram recentemente as aulas de campo os estudantes, incluindo a contaminação de alguns deles.
O candidato Evandro Soares afirmou que a melhoria da pós-graduação está ligada à internacionalização, e que a atual gestão investiu nisso trazendo convidados internacionais e recursos para publicações. Seminários para que a sociedade decida quais são suas demandas, além da disponibilização de “cartão pesquisador” também foram citadas como políticas que podem ajudar. Com relação ao RU, pareceu nervoso ao reclamar que as denúncias devem ser lavadas à ouvidoria da instituição, que alegou ser uma das melhores do país. “Quem não faz denúncia é conivente. Quem não faz a denúncia à ouvidoria e fala aqui no púlpito está prevaricando”, disse. A candidata à vice-reitora, Márcia Hueb, se colocou à disposição para atuar pessoalmente no caso dos estudantes intoxicados durante aula de campo, e destacou que não se pode falar de hospitalização sem saber das causas.
O último bloco, das Considerações finais, foi basicamente marcado por agradecimentos e pedidos de votos por parte das duas chapas. A Chapa 1 destinou parte do seu tempo à leitura do depoimento dos estudantes de Geologia que foram intoxicados durante aula de campo. Eles denunciaram falta de condições de hospedagem e alimentação, além do transporte, como no caso em que houve a explosão de um dos pneus do ônibus que transportava estudantes do curso de Geografia (saiba mais aqui).
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind