Numa democracia, o fato de apoiar ou não determinada candidatura ou o processo de nomeação não reduz as responsabilidades de qualquer representante perante os supostos representados. Pelo contrário, a pouca legitimidade, sob o argumento de contradições políticas, poderia impulsionar ao diálogo, como estratégia. Destaque: numa democracia.
O Governo Bolsonaro, no entanto, não é afeito a democracias, e incentiva o pouco diálogo entre os que dão sustento à sua base de apoio e a sociedade. Assim são seus ministros, secretários e outros apoiadores. Nas universidades e instituições federais de ensino superior, esse papel já é desempenhado, oficialmente, por 20 interventores.
Essa também tem sido a postura do reitor nomeado por ele na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em outubro do ano passado, afirma a Associação dos Docentes da instituição (Adufmat-Ssind). Já a partir da campanha crítica ao modelo adotado para simular a participação da comunidade acadêmica na escolha do Reitorado em 2020, os candidatos que aceitaram participar da consulta rejeitaram qualquer diálogo com as entidades representativas que se colocaram contrárias a adoção de recursos digitais, que impediram a participação efetiva de estudantes, docentes e servidores técnico-administrativos no processo de escolha. Além disso, pela primeira vez desde a ditadura militar, a UFMT não respeitou a paridade dos votos.
“A leitura que a Adufmat-Ssind fez daquele processo era de que os candidatos não seriam reitores, mas a interventores. Isso ficou demonstrado logo depois da eleição, quando as duas candidaturas derrotadas solicitaram a impugnação, indicando fragilidades que as entidades já aviam destacado. Depois da posse, o sindicato, do qual o reitor já até fez parte, tem sido cada vez mais hostilizado por aquele que reivindica nos representar, seja nos espaços públicos de diálogos, como conselhos, seja nas demandas diretas”, afirmou a diretora do sindicato, Lélica Lacerda.
Um dos debates que a Reitoria se recusou a participar, mas foi convidada, foi a Live “O Ensino Remoto nas Universidades Brasileiras é o novo normal?”, transmitido pelos canais oficiais da Adufmat-Ssind no dia 11/02/2021. Diante da obrigatoriedade do ensino remoto, aprovado por ordem do Governo Federal, e do mar de dúvidas geradas na comunidade docente, nenhum representante da Reitoria se dispôs a tentar elucidar qualquer questão.
Já em dezembro de 2020, poucos meses depois da nomeação, o reitor demonstrava irritação com qualquer manifestação das entidades. Diante da leitura da Carta Aberta da Adufmat-Ssind ao Consepe, Soares chegou a dizer que, para além do sindicato, ninguém mais defenderia os trabalhadores, se colocando claramente como representante do Governo e não da comunidade acadêmica que, teoricamente, o teria indicado. “O sindicato tem um papel importante na defesa do trabalhador, quem vai defender o trabalhador não é o Governo, não é o Consepe, não é a universidade, é o sindicato. Mas não é papel do sindicato gerir a universidade. É muito fácil não estar na gestão e pedir para fazer fala toda hora”, reclamou.
O recadastramento de docentes solicitado no início do ano pela universidade é outro ponto de impasse. O pró-reitor responsável se colocou à disposição para dialogar, mas a Adufmat-Ssind se movimentou também para ouvir o reitor e não foi atendida. Segundo o sindicato, as questões essencialmente políticas, não meramente burocráticas, devem ser tratadas diretamente com quem pode responder sobre as pretensões e garantias políticas relacionadas aos rumos da universidade, diante de um Governo tão traiçoeiro.
Mas ao contrário do sindicato que, segundo o reitor, não pode sugerir alternativas e estratégias políticas para a instituição, o Governo Federal – que além de não construir o cotidiano, retira recursos para torná-la cada vez mais inviável, desrespeitando sua autonomia - tem o poder de ditar cada regra, desde novas exigências de entrega de documentos, retorno das aulas, até a implementação de decisões via decretos e leis.
“Nós lamentamos a postura da Reitoria. Só podemos reiterar que o sindicato manterá sua prática de denunciar e participar ativamente, e criticamente, de todas as discussões que interessam à categoria, à comunidade acadêmica e aos trabalhadores, independente de burocracias e espaços institucionais. Foi assim que conquistamos tudo o que temos e é assim que seguiremos defendendo não apenas nossos direitos, mas a universidade pública, a Educação e a democracia, tudo o que o Governo Bolsonaro e seus pilares tentam, a todo momento, destruir”, concluiu a diretora da Adufmat-Ssind.
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind