A comunidade acadêmica da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) está em processo de mobilização permanente. A decisão, que envolve docentes, estudantes e técnicos, foi tomada na manhã dessa quarta-feira, 17/07, durante um ato organizado em defesa da Universidade Pública e contra os cortes de energia na UFMT. A mobilização permanente deixa a comunidade em alerta para se reunir e realizar intervenções a qualquer comento.
Na terça-feira, 16/07, os estudantes e trabalhadores da instituição enfrentaram uma das situações mais difíceis nesses 49 anos da universidade, após a empresa que fornece energia elétrica no estado suspender o serviço por falta de pagamento.
Os docentes mais antigos lamentaram que a privatização do serviço de energia tenha contribuído para o agravamento da situação. “Conta de energia sempre atrasou, mas antes era uma estatal dialogando com outra estatal, que compreendia a gravidade da situação e resolvia a situação sem cortar”, comentou o professor José Domingues.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, reduziu a discussão a uma “falha de gestão” da Reitoria da universidade, e polemizou nas redes dizendo que já havia liberado recurso para evitar o corte, assim como estava se movimentando para responsabilizar judicialmente a reitora Myrian Serra.
Parte da comunidade acadêmica, no entanto, realiza uma discussão muito mais profunda, compreendendo que os cortes de recursos, aplicados com intensidade desde 2014, são parte do plano para impor o projeto de privatização apresentado mais abertamente nessa quarta-feira pelo governo Bolsonaro em Brasília: o Future-se. A proposta, na verdade, não traz nenhuma novidade além de oferecer toda a estrutura pública à iniciativa privada. Mas privatização e entrega das riquezas construídas no setor público para a iniciativa privada não é nenhuma proposta inovadora no Brasil. Todo mundo sabe, inclusive, que essa relação só representa prejuízo à população, e lucro para empresários.
Depois de cortar os recursos das universidades ao máximo e implementar a Emenda Constitucional 95/16 - congelando por vinte anos recursos já reduzidos -, a proposta de “ampliação da autonomia financeira” das universidades, estreitando a relação com o setor privado, é a última cartada para a privatização do ensino superior.
“Ao contrário do que diz o ministro, nós não estamos aqui para defender governos. Estamos aqui para defender a universidade pública, gratuita e de qualidade. Em 2015, a categoria docente fez a maior greve da história, porque o governo Dilma estava efetuando cortes no orçamento, colocando em risco nosso funcionamento. Da mesma forma estamos aqui agora para evitar que a universidade seja privatizada”, disse o diretor da Vice-presidência do ANDES – Sindicato Nacional, Reginaldo Araújo.
O docente destacou que a grande diferença nesse embate é a defesa de projetos distintos de Educação.
Nesse mesmo sentido, a diretora da Associação dos Docentes da UFMT (Adufmat – Ssind), Lélica Lacerda, ilustrou as posições caracterizadas pela ideia de polarização. “A direita tem um projeto conservador, enquanto a esquerda tem um projeto crítico. Mas conservador de quê? Conservador dessa ordem em que existem pessoas que trabalham, e pessoas que vivem do trabalho alheio. Por exemplo, nós [da esquerda] somos contra os contratos de terceirização que precarizam o trabalho. Nós queremos que a faxineira, a cozinheira, o jardineiro sejam contratados pelo serviço público, com direito à carreira, a férias, com decência. Somos contrários à via da terceirização, na qual a universidade paga muito mais do que os salários dos funcionários para as empresas, e de tempos em tempos essas empresas declaram falência, ficam com todo o dinheiro, não pagam direito nenhum aos trabalhadores e somem. Nós estamos falando aqui sobre a defesa de direitos. Vamos defender direitos quantas vezes for preciso, e se radicalizarem para a direita nós vamos radicalizar para a esquerda, ocupando as ruas”, afirmou.
A reitora da UFMT, Myrian Serra, foi ao ato explicar o que o ministro resolveu polemizar. Os recursos – que nunca deveriam ter sido cortados ou contingenciados –, de fato, foram liberados para o pagamento da dívida, mas já na terça-feira. Segundo a docente, a Reitoria havia agendado uma reunião com a empresa fornecedora de energia para regularizar a dívida na quinta-feira (18), de modo que o corte no início da semana, efetuado em todos os campi no período de 1 hora, surpreendeu a administração.
Serra também declarou que defende a universidade pública e gratuita, e que todas as lutas por esse modelo de universidade são legítimas. “Eu defendo a universidade pública, gratuita e de qualidade, mas nesse momento a minha luta inclui, também, a via institucional. Todas as lutas são legítimas e necessárias”, afirmou.
A mobilização na UFMT teve início ainda durante o período em que a universidade ficou sem energia. No início da tarde de ontem, docentes, estudantes e técnicos se reuniram na Adufmat-Ssind para debater sobre o evento mais latente de todos os efeitos que os cortes de recursos têm exercido. O corte de energia chamou a atenção de todos, mas a ausência de ônibus para pesquisas de campo, realização das obras, reparação de equipamentos e instalações, compra de insumos e material de trabalho, entre outras coisas, já tem sido sentidas pela comunidade acadêmica e denunciadas há muito pelos movimentos sociais organizados na UFMT.
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind