A crise pela qual passa a Venezuela tem levado venezuelanos a cruzar a fronteira com a ilusão de tentar uma vida melhor no Brasil. Chegando aqui, entretanto, eles têm enfrentado a miséria, fome, ataques xenófobos, violência, machismo e precarização do trabalho. A prefeitura estima que mais de 40 mil venezuelanos tenham se mudado para Boa Vista, capital de Roraima, o que representa um aumento de mais de 10% da população da cidade nos últimos dois anos.
Em fevereiro, um homem chegou a atirar gasolina em uma casa onde viviam 13 venezuelanos em Boa Vista, ateando fogo contra o imóvel e deixando três feridos. A crise chega, também, aos serviços públicos do estado de Roraima e de sua capital. O aumento da população fez crescer a procura por saúde e educação públicas, sem que houvesse o devido e proporcional investimento orçamentário.
A situação é relatada por Cláudia Magalhães, secretária-geral da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Roraima (SesdufRR – Seção Sindical do ANDES-SN). “Nós temos uma fronteira com a Venezuela muito próxima, a 200 km de Boa Vista. Essa troca entre brasileiros e venezuelanos sempre existiu, é comum. Devido à questão política na Venezuela, que se agravou nos últimos anos, o fluxo migratório que era incipiente se tornou intenso. Em Boa Vista há quatro anos não se via moradores de rua, e hoje se vê pessoas dormindo nas praças”, relata.
A docente ressalta que os dois principais problemas enfrentados pelos venezuelanos em Roraima são a fome e a xenofobia. “A xenofobia está muito forte, e a fome também. Temos ressaltado a importância de apartar a fome. Muitas pessoas chegam em quadro de desnutrição grave. Muitas crianças venezuelanas que morreram com sarampo eram desnutridas, o que fez o tratamento contra a doença pouco efetivo”, comenta Cláudia.
A diretora da SesdufRR-SSind relata outras dificuldades dos venezuelanos em solo brasileiro. “Não há uma política migratória por parte do governo. E, muitas vezes, a mídia local gera, na população, a associação da imigração venezuelana com a todas as mazelas de Roraima. Estamos vendo práticas xenófobas nas redes sociais e na imprensa local. A prostituição tem aumentado entre as mulheres imigrantes. Foram relatados casos de exposição e fragilidade dessas pessoas, sujeitas à agressão física, à exploração sexual, ao trabalho escravo. Há relatos de imigrantes que trabalham e depois não recebem nada. Motoristas que aceleram e avançam sobre imigrantes na rua, etc.”, relata a docente.
“Essa problemática não é do estado de Roraima, é do Brasil. Está acontecendo aqui, mas atinge o país como um todo. Essa migração gera um impacto na saúde da população local, como já prevíamos. Há uma inflação do número de pessoas atendidas no sistema de saúde, e o estado e o município não estão conseguindo dar conta, assim como nas escolas. Isso tudo gera uma demanda financeira maior e que tem sido ignorada pelo governo. A atenção que está sendo dada para essa questão não é compatível com a demanda”, completa Cláudia, ressaltando que, se não fosse pela pressão da sociedade civil organizada, o poder público de Boa Vista e de Roraima teria feito ainda menos em relação aos problemas dos venezuelanos.
Ações de solidariedade da SesdufRR-SSind
A SesdufRR-SSind tem atuado em solidariedade aos venezuelanos. Além de pressionar o poder público para maiores investimentos em serviços públicos e para garantir segurança aos imigrantes, a seção sindical tem recolhido doações de roupas e alimentos entre a comunidade acadêmica da UFRR. Docentes também levaram ao Congresso do ANDES-SN peças de artesanatos dos indígenas venezuelanos da etnia warao, cujo dinheiro arrecadado está sendo utilizado para retirar os indígenas das ruas e estradas. “A SesdufRR-SSind tem realizado campanhas de recolhimento de alimentos, de roupas, entre outras coisas para ajudar os migrantes. Fazemos isso por parte do Centro de Migração e de Direitos Humanos, que faz parte de uma das pastorais da igreja católica”, conta Cláudia.
A docente conclui ressaltando que, em meio aos problemas e à xenofobia, há muita solidariedade da sociedade de Roraima com os venezuelanos. “Importante dizer que há muita xenofobia, mas grande parte da população é solidária, de organizações religiosas a sindicais. Há muita gente fazendo o bem”, diz a diretora da SesdufRR-SSind.
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Fonte: ANDES-SN