Quarta, 29 Maio 2019 08:53

RACISMO CONTRA JAPONESES - Roberto Boaventura

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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A condição de sermos brasileiros nos dá várias características positivas, mas negativas também. Destas, uma é ignorar culturas alheias. Assim como desconhecemos as culturas dos indígenas, africanos, também ignoramos – e talvez mais – a milenar cultura dos orientais, como a dos japoneses.

Dessa condição, surgem os preconceitos também contra esse povo, de cuja imigração iniciou-se em 1908, quando 165 famílias – a maioria pobre – vieram trabalhar em fazendas de café no oeste de SP.

Particularmente, por conta do local onde nasci, sempre tive contatos com japoneses. Meu ensino médio (antigo 2º grau) foi realizado em um colégio de predominância de descendentes nipônicos. Também tive a oportunidade de trabalhar em uma microempresa desses orientais.

Infelizmente, por imaturidade, acabei não aproveitando tanto essas oportunidades, como, p. ex., estudar a língua japonesa e, consequentemente, me aprofundar naquela cultura.

De qualquer forma, algumas coisas aprendi. Destaco: os japoneses – pelo menos a maioria – são pessoas que cultivam, acima de tudo, a vontade de aprender e de superar dificuldades. Também me chama a atenção o respeito que eles têm pelas crianças e pelos idosos.

Mas por que estou falando dos japoneses agora?

Por conta do artigo “Cabeça de japonês do presidente”, que li, em 27/05, na mídia cuiabana, escrito por um professor de Filosofia.

Quando vi aquele título, confesso que não o entendi, pois, em nada, o atual presidente do Brasil – cujo repertório intelectual é impressionantemente boçal – poderia lembrar a mentalidade de um japonês, via de regras, brilhante.

O que fiz?

Li o artigo.

De chofre, um susto, pois, procurando uma coisa, encontrei outra. O texto é aberto por uma expressão eivada de preconceito: “Só cegos não percebem que o país está destrambelhado...”.

Quem disse a esse “filósofo” que os cegos não percebem o absurdo retrocesso pelo qual estamos passando? Aliás, a maioria dos cegos percebe antes e melhor do que muitos não-cegos as artimanhas não só deste governo, mas perceberam também as falcatruas de governos anteriores, se é que me entendem...

Depois dessa, respirei fundo. Continuei a leitura, pois eu queria entender a relação do título do artigo com o seu corpo.

Textualmente, encontrei apenas um enunciado do “filósofo” fazendo referência àquela atitude racista de Bolsonaro, que insinuou, por meio de gesto com os dedos, o tamanho da genitália de um japonês, que fazia questão de uma foto com o presidente brasileiro: “...recentemente chamando os japoneses de miniaturas, com alusões subterrâneas nefastas”.

Fora isso, o texto do “filósofo” centra-se no óbvio: mostrar a exuberante boçalidade de Bolsonaro, que poderia ser sintetizada no seguinte fragmento escrito pelo articulista: “O passado do presidente o condena, revela uma criatura baixa, pequena, atrasada, defensor (sic.) das piores práticas humanas...”.

Ora, ora!

Se for isso que o articulista pensa sobre Bolsonaro, então infiro que o “filósofo” caiu na mesma armadilha racista – logo, abominável – exposta pelo presidente. Assim, o “filósofo” e o presidente se unem na mesma estupidez.

Explico: para o filósofo, “a cabeça de japonês do presidente” seria “pequena”, no caso, equivalendo ao tamanho da genitália do oriental, apontado pelo gesto grosseiro e racista do presidente.

Há muito eu não via um “filósofo” bater em sua própria face, pensando esmurrar a do outro.

A despeito desse mico filosófico, reafirmo a importância da Filosofia na vida de todos nós.

 

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