Quarta, 09 Fevereiro 2022 14:34

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Valfredo da Mota Menezes*

 

Desde que o mundo é mundo, ou pelo menos desde que a história foi registrada, há sempre alguém querendo ser superior ou ter mais que o outro. Mesmo que a sociedade em determinada época buscasse uma igualdade entre os seus membros, alguma pessoa ou grupo se impôs pela força e/ou pelo misticismo. Famílias inteiras, em associação com os sacerdotes, passavam a controlar a sociedade pela força, pelo medo e pelo conformismo religioso. Diziam que foram “escolhidos pelo próprio Deus” e que todos lhes deviam obediência e trabalho. Essas famílias reais não trabalhavam. Os sacerdotes também não trabalhavam. Eram os plebeus que trabalhavam e sustentavam os donos do poder. Com seu exército, esses poderosos invadiam outras terras e transformavam os habitantes dominados em escravos. Apenas os escravos e os plebeus trabalhavam. A exploração era incorporada, fazia parte da cultura daquelas sociedades. A obediência era cobrada como um dever para com Deus. Era necessário sofrer na terra para ter o “reino do céu”. Com o tempo, entretanto, alguns indivíduos dessas sociedades começaram a contestar essa cultura. Religiosos subalternos começaram a pôr em dúvida as afirmações da cúpula. Houve ruptura, revoltas, tentativas de deposição dos nobres, matança de muita gente, mudanças nas relações sociais. A luta revolucionária da plebe, inicialmente associada à burguesia, derrubou reinos e impôs repúblicas.  Entretanto, depois, em lutas internas, a burguesia assumiu o poder dos monarcas, matou todos os líderes populares, a sociedade volta a ser dividida e, novamente, a plebe volta a ser explorada.

Com o passar do tempo, as lutas e revoltas populares, assim como algumas novas orientações religiosas, provocaram uma mudança profunda na sociedade. Já quase não havia escravidão e o trabalho passou a ser “abençoado por Deus".  Todos trabalhavam. Essa mudança provoca o fim do feudalismo e o desenvolvimento de um novo regime social, o capitalismo. Entretanto, também nesse novo regime, a sociedade continuou dividida entre dois grupos, um minoritário, mas, que controla e possui a maioria dos meios de produção, chamado de burguesia ou capitalista e outro maioritário, sem controle sobre os meios de produção, que vende o seu trabalho, chamado assalariado ou apenas trabalhador ou proletário.

 Já antes desse período, mas que continuou também no regime capitalista, os membros da elite perceberam a necessidade de estabelecer algumas normas para a convivência desses dois lados da sociedade. Foram criando regras, leis, estruturas burocráticas, de segurança, estruturas jurídicas e outras que, progressivamente, levaram a formação do “Estado”. Porém, nem tudo o que foi estabelecido foi consensual. Desde o início até a atualidade sempre houve disputas ferrenhas entre os dois lados, no sentido de aumentar o controle do Estado para o benefício de um dos grupos.

No nosso país e em muitos países latino-americanos, o regime feudal ainda caminhou ao lado do capitalismo por muitos anos. A escravidão mantinha a riqueza nas mãos do “coronel” capitalista. Apenas os escravos trabalhavam. Depois da abolição, a elite capitalista importou mão-de-obra europeia para a produção rural e para a incipiente indústria e a maioria dos negros escravos foi abandonada. Sem escolas, sem instrução profissionalizante e sem terras, migraram para a periferia das grandes cidades onde, a maioria, ainda continua.

A tensão entre os dois lados se mantém. Para evitar uma ruptura e/ou diminuir as tensões são realizadas, de tempos em tempos, votações para eleger quem deverá controlar o Estado. No início, só a burguesia votava. Só depois de muita luta todos os proletários foram incluídos como eleitores.

Aí entra a grande mídia, a qual sempre pertenceu ao capitalista. Ela se encarrega de apresentar a narrativa que interessa ao dono. Vai dando novo significado a linguagem. Ninguém mais fala que a disputa é entre pobres e ricos, entre capital e trabalho. Passou-se a chamar apenas de esquerda e de direita. Desde o século dezenove, mas principalmente no século vinte, revistas e jornais da burguesia se encarregaram de definir e dar novos significados para a esquerda: “contra a família, contra a sua propriedade”, “contra a liberdade”. “É comunista e comunista é anticristo”. Definiram também novos significados para a direita: “cristã”, “a favor dos bons costumes, da propriedade, da família e da liberdade”.

A ignorância e o medo foram, com o tempo e a repetição, transformando essas definições em verdades para grande parte da população. Os partidos viraram agremiações e alguns políticos viraram santos. Paixões embotam a consciência de classe. Pessoas transformam a estupidez de alguns políticos em virtudes. Passamos, como no futebol, a ter torcidas. “Torço pelo River porque não gosto do Flamengo”. Tudo que se tenta fazer para a conscientização do povo e mostrar a profundidade da questão é escamoteado pelos “especialistas” ouvidos pela grande imprensa. Criaram também termos que foram, progressivamente, tornados pejorativos ou positivos na dependência de seus interesses. Quem é a favor do povo é “populista”. Quem é a favor de o Estado cuidar dos pobres, mesmo que seja somente com educação e saúde, é “estatizante” e “perdulário”.

Apregoam contra a “ditadura” do Estado, que “não deve controlar o mercado”. “O lucro do capital é o que mantém o seu emprego”. “Quanto menor o tamanho do Estado, menos gastos desnecessários”. “A confiança virá com as reformas e com as privatizações”. “Temos que modernizar as leis trabalhistas”. “O Estado não sabe administrar, temos que privatizar”.

O patrão já não te chama de empregado, agora você é um ”Colaborador”. Não há mais a necessidade de esclarecer o que é tudo isso, basta usar os termos positivos ou negativos e aprofundar a narrativa.

Conheço dezenas de bons profissionais da área de saúde e de outras áreas que, embora tenham uma ação humanitária e solidária com os pobres, incoerentemente votam naqueles que querem diminuir o SUS, diminuir as Universidades e, consequentemente, diminuir o Estado. Absorveram as narrativas e dizem, acriticamente, “não voto na esquerda”.

É no processo eleitoral que vamos escolher qual dos dois lados vai dirigir o Estado. Nesse momento é que você deve decidir “de que lado você está”. Se você, mesmo conhecendo a história, acha que o capitalista vai trazer benefícios para você e sua família, vote nele.
 
*Médico, Professor Associado – Medicina/UFMT (aposentado). Doutor em Medicina Interna e Terapêutica.   
Quinta, 03 Fevereiro 2022 11:07

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo/USP. Prof. de Literatura da UFMT
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            Depois de alguns meses sem escrever meus artigos, rompo o jejum para prestar minha homenagem à poeta Marilza Ribeiro, que nos deixou bem na abertura deste mês. Por conta de complicações advindas da covid, mais uma morte; menos uma vida.
           Durante quase 90 anos de iluminada existência, Marilza Ribeiro extrapolou a semântica de seu sobrenome. Muito mais do que um mero riacho, ela foi um caudaloso rio de poemas. E os escrevia porque sempre tinha o que dizer a alguém. E sempre tinha algo a dizer – e na forma mais elevada possível da escritura, que é a poesia – porque lia compulsivamente; por isso, compreendia e poetizava seu mundo, seu tempo, ainda que tão complexo; sentia suas dores e suas alegrias.
           Mas nesta homenagem, absolutamente limitada, ao invés de falar de seus poemas, dispersos em livros e folhas avulsas, geralmente num amarelo bem forte, que ela costumava fotocopiar e presentear seus amigos, falarei um pouco de sua pessoa e de minha aproximação consigo.
           Começo recordando que a primeira vez que ouvi o nome de Marilza Ribeiro foi no início de 1987, em Barra do Garças. Assim que cheguei ao campus da UFMT naquela região, um colega professor falava de forma absolutamente entusiasmada dessa poeta, até então desconhecida por mim, um ser em construção recém-chegado ao Mato Grosso.
           De lá para cá, pude conhecer seus livros, mas nunca havia tido a oportunidade de conhecê-la pessoalmente; no fundo, eu achava que sequer tinha esse direito. Em minha imaginação, Marilza era um pouco parecida com aquelas musas – sempre inatingíveis – de quem o trovador medieval não ousava se aproximar, até para não lhe causar enfastio. Eu tinha medo de ser impertinente. E assim permaneci por anos; na verdade, por décadas.
           Todavia, não há muito tempo, em um desses inesquecíveis dias, uma colega da Área de Literatura, do Instituto de Linguagens, e outro da Faculdade de Comunicação, aos quais devo muito, convidaram Marilza para um informal “bate-papo” com alunos e professores da UFMT. Claro que eu não podia mais perder tempo. Ainda que eu continuasse a não me sentir à altura de me aproximar e de me apresentar à poeta, pelo menos era a oportunidade que eu tinha de conhecê-la, de vê-la.
           Para minha surpresa, quando a vi, absolutamente desenvolta e com as roupas maravilhosamente coloridas que ela sempre usava, de chofre, me lembrei de que aquela linda senhora, de cabelos já bem grisalhos, era a mesma que eu via com frequência num shopping próximo à Universidade durante o horário de almoço e do meu sagrado café. E toda vez que eu a avistava, aliás, sempre carregando duas sacolas, uma em cada mão, eu a acompanhava com os olhos até que desaparecesse do meu campo de visão. E toda vez que ela passava por mim, educadamente, me cumprimentava apenas com um aceno de sua cabeça, pois estava sempre a cantar – aliás, afinadíssima – alguma pérola de nossa MPB:“...agora eu era o herói/ E o meu cavalo só falava inglês...”; “A deusa da minha rua/ Tem os olhos onde a lua/Costuma se embriagar...”; “Se essa rua, se essa rua fosse minha...”
           Seu repertório era imenso e primoroso. Consoante seu relato, muito das canções que aprendera a gostar era ouvido no piano, “tocado maravilhosamente” por Mirtes, uma irmã sua.
           Sua memória, impressionante. Sua voz era de uma força que não se abatia com a idade; ao contrário: embaraçava o tempo.
           Depois dessa sua participação na UFMT, me encorajei e disse a ela de minha admiração também por sua figura, que estava sempre cantando e assoviando... como se esparramasse flores perfumadas por onde passava. Soube bem depois, por ela mesma, que ela fazia mini-shows musicais na fila da agência do Correio, que fica nas imediações do mesmo shopping. “A vovó”, disse-me ela, “era aplaudida por todos” naquele local. E não era pra menos. Marilza era um show de ser humano, desses cada vez mais raros de nossa espécie.
           E assim nasceu uma das mais lindas amizades que já fiz até hoje. Dali até poucos dias, antes que ela se mudasse de Cuiabá para o litoral de SP, quando nos despedimos numa animada reunião, junto com outras figuras maravilhosas de nossas artes locais, excetuando o período dessa absurda pandemia, quase todos os dias eu tive o privilégio que poucos tiveram: tomar um café com Marilza; e o melhor daqueles já saudosos encontros é que eu não tinha a menor pressa de sair dali. Por vezes, até me atrasei para alguma reunião. Não me arrependo. Depois desses cafés, quase sempre eu a deixava para suas compras num supermercado, também próximo. Ela descia do carro e já encontrava o tom correto de alguma canção. Pronto. Lá ia minha poeta distribuir suas flores perfumadas, agora no supermercado. Isso me fazia sentir absolutamente orgulhoso e radiante: como poucos, eu tinha a chance de conviver com uma poeta! Sabe o que isso, caro leitor?
           Quantos poemas! Quantas histórias! Quantas músicas! Quantas alegrias! Quanta identificação! Agora, quanta saudade! Como consolo dessa saudade que aperta o coração, resta-me agradecer a vida pela oportunidade que me deu de conhecer Marilza Ribeiro, aquela senhora sempre cantante, que invariavelmente carregava duas sacolas, uma em cada mão.
           O que havia naquelas duas sacolas?
           Presentes. Em uma, presentes para filhos, netos, bisnetos... Em outra, muitos, mas muitos e caríssimos poemas: presentes para a humanidade toda.
           Marilza Ribeiro!
           Presente! Eternamente, presente!

Quarta, 02 Fevereiro 2022 11:22

 

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Por José Domingues de Godoi Filho
Professor da UFMT/Faculdade de Geociências

 

“Houve um dia,
no começo do mundo
em que o homem
ainda não sabia
construir sua casa.
Então disputava
a caverna com bichos
e era aí sua morada.
Deixou para nós
seus sinais,
desenhos desse mundo
muito antigo.
Animais, caçadas, danças,
misteriosos rituais.
Que sinais
deixaremos nós
para o homem do futuro?”

(CAVERNA, de Roseana Murray)


O atual governo, em 12 de janeiro de 2022, continuou, com sua voracidade destruidora, indicando que sinais pretende deixar para as futuras gerações. Desconsiderando o trabalho e a posição dos servidores técnicos da área especializada em pesquisa e conservação de cavidades naturais subterrâneas, no âmbito do governo federal, de pesquisadores de universidades públicas, de órgãos estaduais de meio ambiente, de sociedades científicas, dentre outros, assinou, de forma autocrática, o Decreto Federal 10935/2020, que dispõe sobre a proteção das cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional, revogando o Decreto Federal 99556/1990.

O atual decreto atinge diretamente um patrimônio nacional importante e frágil – as cavidades naturais subterrâneas. O setor ambiental foi totalmente desconsiderado, para atender os “tocadores da boiada” do Ministério de Minas e Energia (MME) e do Ministério de Infraestrutura (MINFRA), com a conivência da Secretaria de Apoio ao Licenciamento Ambiental e Desapropriações (SPPI/SEGOV/PR).

CAVERNAS E SUA IMPORTÂNCIA.

O atual decreto, com alguns ajustes de redação, mantém o disposto no Decreto Federal nº 6.640, de 7/11/2008, isto é:

- “Considera-se cavidade natural subterrânea o espaço subterrâneo acessível pelo ser humano, com ou sem abertura identificada, conhecido como caverna, gruta, lapa, toca, abismo, furna ou buraco, incluídos o seu ambiente, o conteúdo mineral e hídrico, a fauna e a flora presentes e o corpo rochoso onde se inserem, desde que tenham sido formados por processos naturais, independentemente de suas dimensões ou tipo de rocha encaixante”.

As paisagens caracterizadas pela presença de cavernas, rios subterrâneos, minerais raros, fauna singular, como também pela ocorrência frequente de sítios arqueológicos e paleontológicos são denominadas cársticas. Em decorrência desses atributos, a espeleologia, ciência que estuda as cavernas, ganhou grande importância nos processos de licenciamento ambiental, que visam exercer controle prévio e acompanhamento de atividades, que utilizem recursos naturais, potencialmente poluidoras ou que possam causar degradação ambiental(1)

No caso brasileiro, desde o século XIX, com o trabalho do dinamarquês Peter Wilhem Lund, as cavernas têm fornecido importantes registros fossilíferos sobre a paleontologia de vertebrados do Pleistoceno brasileiro. Esses documentos paleobiológicos têm sido fundamentais para o conhecimento taxonômico, anatômico e paleoecológico dos mamíferos. (1)

Como as cavernas se constituem num meio favorável à preservação de vestígios arqueológicos, sua relação com a arqueologia é óbvia; sendo inúmeros os registros existentes em suas paredes sobre os usos diversos como abrigo, moradia, palco de rituais, cemitérios e suporte para arte. (1)

É importante registrar que foi nas cavernas que se concentraram as ossadas dos mais antigos brasileiros, com destaque para o esqueleto de “Luzia”, encontrado em Lagoa Santa, no abrigo de Lapa Vermelha IV, com idade superior a 11.000 anos, sendo um dos esqueletos mais antigos das Américas, encontrado até o momento.

As cavernas também guardam registros paleoambientais importantes, sendo que no caso brasileiro as estalagmites de nossas cavernas se constituem em verdadeiros arquivos paleoclimáticos. Por exemplo, estalagmites da Caverna Paraíso, no Pará, mostrou que há cerca de 21 mil anos o leste da Amazônia era bem menos úmido do que hoje, com 58% da chuva dos tempos atuais. (2)

De acordo com UNESCO, as águas subterrâneas de aquíferos cársticos representam a mais significativa e segura fonte de água potável (3), estimando-se que os aquíferos cársticos abastecem cerca de 25% da água potável do mundo (4).

Ainda que resumidamente, é possível verificar a importância das paisagens cársticas e das cavernas. Trata-se de “um conjunto de elementos naturais e culturais digno de valoração e conservação”[...], por outro lado, possuem peculiaridades que os tornam mais vulneráveis às interferências humanas mal planejadas”. (1)

E QUAIS OS SINAIS PARA AS FUTURAS GERAÇÕES?

O sinal mais significativo, cobrado pela poeta acima, para as futuras gerações do ato presidencial, editado a portas fechadas, são os interesses econômicos de mineradoras, barrageiros, empreiteiros, agroespoliadores, dentre outros,justificadoscom o argumento de serem empreendimentos “de utilidade pública”.

Frente a importância das cavernas e da fragilidade de seus componentes, tem sido ressaltada, por instituições nacionais e internacionais e pelos que se dedicam ao seu estudo, a importância de medidas de conservação, prevenção e mitigação dos impactos das atividades humanas. Sinal que o atual governo não pretende deixar para as futuras gerações.

A legislação brasileira, desde a promulgação da atual Constituição Federal e das discussões ocorridas na Rio-92, vinha buscando o estabelecimento de normas para a conservação e uso das cavernas. Contudo, o atual governo vem destruindo tudo que se refere às questões socioambientais – a legislação e as instituições oficiais especializadas, para atender questionáveis interesses econômicos.

Com o absurdo Decreto Federal 10935/2022, que autoriza a destruição de cavernas, patrocina e deixa como sinal um enorme retrocesso na proteção das cavidades naturais subterrâneas. Produz mais um desmonte no licenciamento ambiental e atropela portarias, decretos e instruções normativas para a conservação e uso das cavernas. O previsto pelo Decreto Federal 6640/2008 que determina que “a localização, construção, instalação, ampliação, modificação e operação de empreendimentos e atividades, considerados efetiva ou potencialmente poluidores ou degradadores de cavidades naturais subterrâneas, bem como de sua área de influência, dependerão de prévio licenciamento pelo órgão ambiental competente”, se transformou em figura de retórica, permitindo, com o discurso da necessidade de empreendimentos considerados de utilidade pública, o que inclui diversos projetos de infraestrutura e todas as atividades minerárias, a ocorrência de impactos negativos irreversíveis, até mesmo em cavidades de máxima relevância. O sinal de exterminador e depredador do ambiente é um dos que mais agrada o capitão de plantão no Palácio do Planalto.

Como bem analisado e ressaltado pela Associação Nacional dos Servidores de Meio Ambiente (ASCEMA-NACIONAL), a aplicação do Decreto 10.935/2022 poderá resultar:

- Na redução nos atributos que permitem classificar uma cavidade como de máxima relevância (passa a desconsiderar morfologia única, isolamento geográfico, interações ecológicas únicas, cavidade testemunho e habitat essencial para a preservação de populações geneticamente inúmeras de espécies de troglóbios endêmicos ou relictos).

- Emriscos de perdas insubstituíveis ao patrimônio cultural, biodiversidade e geodiversidade, devido às peculiaridades das cavidades de máxima relevância, não havendo possibilidade viável de compensação.

- Na aceitação, como compensação, de cavernas testemunho sem necessariamente as mesmas características da caverna impactada, ao utilizar o termo “similar”.

- Na redução e fragilizaçãoda compensação, uma vez que as normas atuais exigem duas cavidades testemunho para cada cavidade de alta relevância impactada irreversivelmente, sendo que o atual decreto exige apenas uma, inclusive para cavidades de máxima relevância.

- Na definição do sistema de classificação das cavidades, atributos ambientais similares e formas de compensação, por ato do Ministro de Estado de Meio Ambiente, do Ministro de Estado de Minas e Energia e do Ministro de Estado de Infraestrutura, ou seja, inclui Ministérios que não tem atribuições técnico-científica sobre o tema espeleologia, estabelecendo uma hegemonia decisória (2/3) a setores que não tem qualquer respaldo institucional para tratar do assunto, gerando conflitos de interesse e privilegiando o lobby.

- Na permissão para que empreendedores solicitem revisão de todos os processos autorizativos e compensatórios já realizados até o momento, no âmbito da proteção de cavidades.

A Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE) e vários técnicos que trabalham com o tema apontam, com pertinência, os retrocessos que o Decreto 10935/2022 impõe à legislação espeleológica nacional, dentre eles:

– Permite que o órgão ambiental licenciador autorize a destruição total ou parcial de cavernas de máxima relevância por atividades ou empreendimentos considerados “de utilidade pública”, que não possuam alternativas técnicas e locacionais viáveis, que tenha viabilidade do cumprimento da medida compensatória e que os impactos negativos irreversíveis não gerem a extinção de espécie que conste na cavidade impactada (Inciso I, II, III e IV do Art. 4º);

– Excluí dos atributos que classificam uma cavidade subterrânea como de máxima relevância as condicionantes morfologia única, isolamento geográfico, interações ecológicas únicas, cavidade testemunho e hábitat essencial para preservação de populações geneticamente viáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relictos (§ 4º do Art. 2º);

– Possibilita que o empreendedor solicite a revisão, a qualquer tempo, da classificação do grau de relevância de cavidade natural subterrânea, independentemente do seu grau de relevância, tanto para nível superior quanto para nível inferior (§ 9º do Art. 2º);

– Possibilita que o empreendedor compense o impacto sobre uma cavidade subterrânea com a preservação de uma cavidade testemunho qualquer, sem ter o conhecimento sobre a real relevância desta caverna que está sendo preservada, pois o decreto atribui automaticamente máxima relevância, sem a exigência de estudos específicos (Art. 7º);

– Deixa aberta a possibilidade do Ministro de Estado de Minas e Energia e do Ministro de Estado de Infraestrutura realizar modificações em atributos ambientais similares da classificação de relevância e definir outras formas de compensação através de atos normativos (Art. 8º).

Lamentavelmente, o atual Presidente da República e seus asseclas já passaram dos limites e, não só pretendem destruir os “...sinais, desenhos desse mundo muito antigo” deixados pelos nossos ancestrais, como deixar “para o homem do futuro” sinais de barbárie, destruição e descompromisso com a vida.

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(1)CRUZ, J.B.; PILÓ, E.L. (org.) Espeleologia e licenciamento ambiental. Brasília: ICMBio, 262p, 2019.
(2) WANG, X. et al. Hydroclimate changes across the Amazon lowlands over the past 45,000 years. Nature, v. 541: 204-207, 2017.
(3) AURELI, A. The UNESCO IHP’s Shared Aquifer Resources Management Global Project. AQUAmundi, 1, 1-6, 2010.
(4) FORD, D. C.; WILLIAMS, P. Karst hydrogeology and geomorphology. London: Unwin Hyman, 2007.

Terça, 01 Fevereiro 2022 17:34

 

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Publicamos, a pedido do Prof. José Domingues de Godoi Filho, a Carta Aberta do professor Althen Teixeira Filho (UFPel) ao diretor presidente da ANVISA, cobrando uma manifestação pública sobre algumas das liberações de agrotóxico pela Agência.

 

CARTA ABERTA

 

Senhor Antonio Barra Torres

M.D. Diretor Presidente da ANVISA

 

Ilustre senhor,

      Antes de mais nada, expresso minha solidariedade e admiração frente à sua atitude de cobrar, especialmente de um presidente da República, uma manifestação sobre temas de relevância nacional, de respeito humano e de cuidados para com à “res publica”.

      Parabéns pela sua coragem e consciência cidadã!

      Também ressalto, com ênfase e sinceridade, tanto sua apresentação como um “Oficial General da Marinha do Brasil, que por 32 anos serviu seu país, pautado em austeridade, honra, dignidade”, quanto sua atenção como Diretor Presidente da Anvisa para com a família brasileira.

      Em assim sendo, e frente à crescente e alarmante situação há muito vivida no Brasil, tomo a liberdade de cobrar-lhe uma manifestação pública sobre algumas das liberações de agrotóxicos que a instituição sob sua responsabilidade encaminha.

      Tenho a certeza, então lastreado na sua auto apresentação, que Vossa Senhoria desenvolverá leitura de pareceres destes venenos agrícolas com olhos de médico, utilizará a ciência como referência e terá parâmetros humanos baseados no seu juramento hipocrático. Deste modo, aguarda-se que sua manifestação terá um mínimo de atenção para com o adoecimento da população em geral e, fundamental, de piedade e comiseração para com as crianças brasileiras que sofrem impactos inomináveis dos venenos agrícolas, muitos dos quais as acompanham, entristecem, sufocam e assolam durante toda a sua vida.

      Outrossim, também não deixará de perceber a gravíssima e inegável destruição de nichos da natureza, assim como o extermínio de seres fundamentais à sobrevivência da própria espécie humana, como é o caso do aniquilamento das abelhas.

      Para objetivar nesse primeiro momento, sugiro-lhe que proceda a análise e leitura atenta do “PARECER TÉCNICO DE REAVALIAÇÃO NO 07, de 2015/GGTOX/ANVISA”, o qual “Reavalia os riscos à saúde humana do ingrediente ativo 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D)”. Ali Vossa Senhoria encontrará exemplos cristalinos de sofismas, tergiversações e encaminhamentos na defesa de interesses particulares.

      Por consequência, caso Vossa Senhoria tenha o mesmo entendimento de inúmeros outros que estudam, pesquisam e publicam sobre o assunto, sugiro-lhe a imediata constituição de uma comissão composta por médicos, pesquisadores e professores universitários ISENTOS, no sentido de que as liberações dos venenos agrícolas possam ser reavaliadas.

      Não convoque os que acham que “glifosato não é tóxico e pode ser bebido”, nem os que tomam verbas das empresas para “desenvolverem pesquisas”, ou os que publicam disparates bajulatórios, e muito menos os que viajam aqui e alhures refestelando-se com despesas pagas pela indústria química.

      Rever um parecer ou um ato errado da sua instituição não diminuirá o senhor em nada. Muito pelo contrário.

      Envio-lhe sinceros abraços pampeanos fraternos.

 

Dr. Althen Teixeira Filho

Professor Titular / Instituto de Biologia/ UFPel

 

 

 

Quinta, 09 Dezembro 2021 11:09

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Há 73 anos, no dia 10 de Dezembro d 1948, a recém criada Organizações das Nações Unidas (ONU), em sua Assembleia Geral aprovava um dos documentos mais significativos de sua história ao longo dessas mais de sete décadas. Este documento é a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Bem diferente do que muitas pessoas desavisadas, que confundem ou pretendem confundir a cabeça de outras pessoas, enfim, da opinião pública, imaginam, como acontece no Brasil com um certo segmento ideológico ou de pensamento social, Direitos Humanos não são sinônimo de “direitos de bandidos”, mas sim, a garantia de todos os direitos que todos os seres humanos tem, como inalienáveis e fundamentais para que as sociedades sejam realmente justas e igualitárias e não o espaço apenas para os privilegiados, os donos do poder e seus assemelhados.

O artigo primeiro da Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece , de forma clara, do que se trata aquele documento aprovado há tanto tempo e que, ao longo dessas décadas, vem sendo aperfeiçoado com outras decisões de sucessivas Assembleias Gerais da ONU, melhor especificando ou cobrindo lacunas não contidas formalmente na Declaração original.

Pois bem, o artigo primeiro da Declaração Universal dos Direitos Humanos assim estabelece e proclama que esses direitos são inalienáveis, ou seja, não são passivos de serem “negociados”, suprimidos, abolidos ou postergados, pois estão umbilicalmente vinculados `a condição da dignidade humana em todos os lugares e em todos os tempos.

Vamos lá, este artigo primeiro assim reza que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, independente de: origem racial ou país em que nasceram; religião, crença, ideologia, cor da pele ou outras condições físicas, sexo, linguagem, opinião (política ou sobre qualquer outro assunto), direito de manifestação, de organização para fins pacíficos, propriedade, posição socioeconômica (status) ou qualquer outra condição.

Neste particular Direitos Humanos representam o avesso do racismo, da xenofobia, de todas as formas de discriminação, de etnocentrismo e de intolerância de qualquer forma ou natureza. Isto significa que ao combatermos essas formas distorcidas de relacionamento social, cultural, politico ou econômica e com muita frequência, criminosas, existentes ao redor do mundo e particularmente em nosso país, estamos defendendo, direta ou indiretamente os Direitos Humanos.

Neste ano de 2021, o tema a ser “comemorado” ou melhor, que deve servir de base para as reflexões de pessoas e instituições públicas ou privadas, religiosas ou laicas, partidos políticos e movimentos sociais, sindicais e ambientais é : “Igualdade – reduzindo desigualdades (e exclusões), avançando na conquista dos Direitos Humanos”.

A primeira reflexão é que a luta pela plenitude da conquista dos Direitos Humanos passa pela redução e extinção não apenas das desigualdades em si, mas dos mecanismos, inclusive criados e mantidos pelas instâncias governamentais, como, por exemplo, na definição das políticas públicas, na alocação dos orçamentos públicos, na criação de subsídios que contribuem para a acumulação de capital, renda e riqueza em poucas mãos, em segmentos ínfimos da pirâmide social (1% , 5% ou 10% da população), enquanto mais de 50% da população na parte de baixo desta pirâmide social ficam apenas com “migalhas” que caem da mesa e das contas bancárias dos poderosos), como recentes estudos e pesquisas sobre desigualdade de renda, riqueza e propriedade no mundo todo, em, praticamente em todos os países, inclusive no Brasil, tem sobejamente demonstrado.

Aqui cabe uma observação ou destaque, o Brasil é o segundo país com pior distribuição de renda/maior concentração de renda, riqueza e propriedade entre os integrantes do G20 e o que tem o pior índice de Gini (que mede a concentração de renda e a desigualdade) na América do Sul ou até mesmo pior do que  diversos países africanos e asiáticos, extremamente pobres e subdesenvolvidos.

A questão da Igualdade, principalmente em termos sociais, econômicos, políticos, culturais e ambientais, faz parte dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável ou do que chamamos de Agenda 2030. Lamentavelmente, os relatórios da ONU e de outros organismos nacionais e internacionais que avaliam o “progresso” na conquista e manutenção desses objetivos tem demonstrado que, ao longo das últimas três ou quatro décadas, tem piorado muito, principalmente nos últimos cinco anos e, de forma mais direta, durante este período de pandemia, quando os ricos estão ficando mais ricos, milionários ou bilionários, a classe média esta encolhendo, empobrecendo e os pobres estão sendo empurrados ladeira abaixo e estão ampliando o contingente de miseráveis, vivendo ou sobrevivendo com migalhas, afrontando, diretamente a dignidade humana de bilhões de pessoas mundo afora, incluindo no Brasil.

Quando falamos em Direitos Humanos, pelo menos 15 dimensões devem estar no foco de nossas analises e considerações, além de outras que, porventura, não estejam contempladas nesta lista:

O primeiro e mais significativo Direito Humano é a Vida, a ser vivida com dignidade total; depois temos: 2. Direito ao trabalho digno, com salário justo, Descanso seminal e aposentadoria também Digna e justa;3. Direito `a terra; 4. Direito `a moradia, também digna e não habitações sub-humanas como acontece em diversas situações; 5. Direito `a alimentação saudável e de qualidade, não restos de comida colhida em lixões ou no final das feiras livres; 6. Direito `a saúde, pública, universal, de qualidade e humana; 7. Direito ao saneamento básico, com suprimento universal de água tratada, esgoto, coleta e tratamento adequado de lixo/resíduos sólidos; 8. Direito `a Liberdade (de crença, de ideologia, de religião, de associação, de participação, inclusive na gestão pública e nas atividades políticas e outras formas mais); 9. Direito de escolher livre e soberanamente seus governantes e fiscalizar suas ações, principalmente no que concerne `a alocação de recursos oriundos dos orçamentos públicos;  10. Direito de participação na definição das políticas públicas; 11. Direito `a educação pública, de qualidade, laica e socialmente referenciada, com acesso para todos/todas as pessoas; 12. Direito a um meio ambiente saudável e ecologicamente sustentável; 13. Direito `a privacidade, `a imagem pessoal e a honra; 14. Direito a um Sistema judiciário eficiente, transparente, imparcial, independente e, realmente, justo e humano; e, por ultimo, resumindo todos esses direitos, todas as pessoas, em todas as faixas etárias e dimensões sociais e econômicas, tem Direito de viverem felizes e com total dignidade humana.

Antes de concluir, gostaria também de destacar que tanto a ONU quanto a OEA e praticamente quase todos os países mundo afora, inclusive o Brasil, possuem uma vasta legislação que, supostamente ou como se diz, “para inglês ver”, que pretende proteger os direitos (humanos) de diversos grupos.

Neste particular podemos mencionar: Direito dos consumidores; direito das pessoas com deficiência; direito das crianças e adolescentes; direito dos povos indígenas, direito das pessoas idosas; direito dos trabalhadores, tanto do setor público quanto privado; direito da natureza; direito das pessoas privadas de Liberdade; direito das mulheres, direito das pessoas integrantes do grupo LGBT; direito dos migrantes; direito dos usuários dos serviços bancários e serviços públicos e outros mais que aqui neste artigo não são mencionados.

Refletir sobre os Direitos Humanos é fundamental; mas o mais importante á lutarmos para que esses direitos sejam, realmente, respeitados em todas as esferas e dimensões das sociedades, só assim, poderemos construir sociedades e um mundo melhor, de paz, progresso e prosperidade para todos/todas e não apenas para uma minoria privilegiada.

*Juacy da Silva, professor titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitteer@profjuacy

Sexta, 03 Dezembro 2021 14:47

Em reunião conjunta, realizada pelo ICHS na data de 01/12/2021, para a discussão do posicionamento do instituto com relação à aprovação da resolução Consepe 189/2021, que trata da alteração das resoluções Consepe 41/2016 e 25/2019, foi constituída uma comissão para redação de uma nota com o posicionamento do Instituto.

(i) Não é possível aceitar a aprovação da Resolução 189 que impede a homologação de PIAs com mais de 40h. O argumento utilizado para a criação dessa resolução é o Art. 19 da Lei 8112 de 11 de dezembro de 1990 que determina: “Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente” (Redação dada pela Lei nº 8.270, de 17.12.91). Nesse sentido, entende-se que o impedimento da aprovação de PIAs com mais de 40 horas de trabalho semanais não coloca a UFMT dentro da legalidade uma vez que não impede o trabalho excedente. A resolução aprovada apenas impede que seja registrado o trabalho excedente. Consideramos que, para o enquadramento da Universidade a essa legislação, é necessária a existência de um quadro de trabalhadores dentro da carga horária legal suficiente para o desempenho de todas as funções da instituição. Impedir que seja realizado o registro do trabalho excedente das 40 horas não impede, de fato, que ele seja realizado, não configurando assim uma solução para o enquadramento legal.

(ii) O desencontro de informações gerado a partir da aprovação da Resolução Consepe 189/2021 com relação à quantidade de horas semanais trabalhadas excedentes a 40 horas e o impedimento de seu registro no PIA ferem o Código de Ética profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, como consta no Decreto n° 1171 de 22 de junho de 1994 que no Capítulo I, Seção I, VIII prevê que “Toda pessoa tem direito à verdade. O servidor não pode omiti-la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa interessada ou da Administração Pública”. Em detrimento do princípio da legalidade, avocado para a mudança no registro dos encargos docentes, há que se ponderar a violação de outros princípios como a moralidade administrativa, uma vez que se trata de professores altamente engajados com o seu trabalho no ensino, pesquisa e extensão. O não registro das atividades mascara o real trabalho efetivamente realizado. Também há flagrante violação ao princípio da publicidade dos atos administrativos, já que o excedente de trabalho está regido por portarias, atribuições por instâncias superiores, registros em sistemas específicos, como SIEX, dentre outros e, desta forma, não dar divulgação ao registro de encargos representa grave violação à publicidade de atos administrativos atribuídos aos docentes. Vale ressaltar que os docentes do Instituto de Ciências Humanas e Sociais/Campus Universitário Araguaia, reiteradamente, semestre após semestre, estão com encargos que extrapolam as 40 horas. Isso demonstra a falta de profissionais para que haja coerência e isonomia na distribuição das muitas atribuições/responsabilidades que o Instituto possui e que precisa delegar aos docentes. Dessa forma, solicitamos a revogação da Resolução Consepe 189/2021, tendo em vista que ela está ligada à Resolução 158/2010 e que a retomada de sua discussão é condição sine qua non para as discussões acumuladas no Consepe sobre o registro de encargos da extensão e pesquisa, das comissões, dos conselhos e das demais instâncias acadêmicas.

Barra do Garças, 02 de dezembro de 2021.

Documento aprovado pela Congregação do ICHS/CUA/UFMT.

Segunda, 25 Outubro 2021 15:13
 
 
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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Juacy da Silva*

 

“O mundo existe para todos, porque todos nós, seres humanos, nascemos nesta terra com a mesma dignidade. Como comunidade, temos o dever de garantir que cada pessoa viva com dignidade e disponha de adequadas oportunidades para o seu desenvolvimento Integral. Deus deu a terra a todo gênero humano, para que ela sustente todos os seus membros, sem excluir nem privilegiar ninguém” (Papa Francisco, Fratelli Tutti, 218 e 219)

“Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social, mas uma única e complexa crise socioambiental. As diretrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza” (Papa Francisco, Laudato Si, 139)

Estamos às vésperas da COP 26 – mais uma Conferência do Clima, que reunirá em torno de 200 Autoridades, a grande maioria ou quase a totalidade, com poucas ausências, de Chefes de Estado, Chefes de Governos, e milhares de outros participantes. líderes empresariais, religiosos, militantes de ONGs (Organizações não Governamentais), movimentos sociais,  em Glasgow, na Escócia, Reino Unido, de 31 deste mês de Outubro até 12 de novembro próximo (2021).

O grande objetivo ou o que os estudiosos tem denominado de objetivo estratégico é analisar o que os países, principalmente os maiores poluidores do planeta tem feito para cumprirem as metas que firmaram no Acordo de Pais em 2015, para que o aquecimento global/temperatura média da terra, não ultrapasse 1,5 graus, em relação ao que existia no inicio do período de industrialização, há 170 anos.

O que se busca é  que seja realizado um debate franco, honesto, sem mentiras e fake news, sobre o que cada país, realmente, está realizando para enfrentar o aquecimento global e a EMERGÊNCIA CLIMÁTICA, antes que o “ponto do não retorno”, ou seja, o nível de degradação dos ecossistemas, da destruição da biodiversidade e o aquecimento global atinjam níveis intoleráveis, tornando praticamente impossível todos os tipos de vida, inclusive a vida humana, no Planeta Terra, denominado de “Nossa Casa comum”, pelo Papa Francisco.

O que é a COP-26 e qual a sua importância para conter, enquanto é tempo, as mudanças climáticas, o aquecimento global e a emergência climática de que milhares de cientistas tem alertado os governantes, os empresários, a população e, enfim, o mundo?

A COP-26 é mais uma reunião, como suas congêneres anteriores há mais de duas décadas, sob os auspícios e coordenação da ONU, entre representantes das partes, ou seja, dos países que há décadas vem se comprometendo e não cumprindo integralmente com metas que evitem uma catástrofe anunciada em relação `as condições de vida no planeta.

Desde 2015, quando quase duas centenas de países firmaram o ACORDO DE PARÍS, que todos os anos os representantes de governos, de todos os matizes políticos e ideológicos, sistemas econômicos, políticos e sociais, além de representantes de movimentos sociais, ONGs, mundo empresarial, líderes religiosos, cientistas, pesquisadores se reúnem para avaliarem as ações e omissões que os países tem realizado ou deixaram de realizar quanto às metas acordadas.

Mesmo que o Papa Francisco, líder espiritual e pastor de mais de 1,34 bilhão de fiéis, onde estão incluídas pessoas comuns e também governantes, empresários, espalhados por todos os continentes e países, não possa comparecer pessoalmente, a Delegação que representará o Vaticano e a Igreja Católica, estará presente e participará das discussões da COP-26.

Outro líder mundial que deverá comparecer é o atual Presidente dos EUA, Joe Biden que, diferentemente de seu antecessor Donald Trump que chegou a retirar o segundo país que mais polui do Acordo de Paris, o atual presidente decidiu recolocar o seu pais novamente nos trilhos das discussões climáticas, além de ter e estar dando certa ênfase em transformar a economia americana em uma economia verde.

Diversos outros países continuam com suas economias baseadas em matrizes energéticas que utilizam combustíveis fósseis, principalmente a China e índia ou na destruição e queimadas de suas florestas, como o Brasil e a Indonésia, terão muitas dificuldades para convencerem os demais participantes de que estejam, realmente, cumprindo as cláusulas e metas do Acordo de Paris.

Talvez seja por isso, que o Presidente Bolsonaro não estará chefiando a delegação brasileira, que deverá comparecer à COP-26, praticamente de mãos vazias, pois ao invés de o Brasil realizar as ações e metas com as quais o país se comprometeu em 2015, no Acordo de Paris, a preocupação do atual governo foi “flexibilizar” os sistemas de controle e fiscalização, sucatear os organismos responsáveis pela área ambiental, enquanto  deixava e continua deixando  “a boiada passar”.

Sabemos e esta realidade, do aquecimento global, das mudanças climáticas, da destruição da biodiversidade, do aumento das catástrofes naturais que tem origem na ação humana, já tem sido constatada por inúmeros estudos e em alertas constantes por milhares de cientistas, de que os modelos econômicos, sociais, políticos e culturais baseados no uso intensivo de combustíveis fósseis (Petróleo, Carvão e Gás Natural), ao lado do desmatamento/destruição de todas as florestas, não apenas as tropicais que ainda restam, em todos os países e biomas; do uso de um sistema de transporte , também baseado em fontes sujas de energia, altamente poluidora; do consumismo, desperdício e descarte que aumentam assustadoramente, em ritmo muito maior do que o crescimento populacional e das taxas de urbanização, gerando mais lixo, resíduos sólidos, tornando os cursos d’água, córregos, rios, baias e os oceanos na maior lixeira do planeta, tem acarretado níveis alarmantes de poluição do ar, das águas e do solo e, como consequência, a emissão em níveis intoleráveis de gases de efeito estufa e todas as demais formas de poluição.

Quando se trata da destruição do planeta, em relação `a geração e emissão de gases poluentes, os chamados gases de efeito estufa, responsáveis diretos pelo aquecimento do planeta, pelas mudanças climáticas, pela elevação da temperatura dos oceanos, pela perda e destruição da biodiversidade, ou seja, a vida no planeta e a degradação generalizada que estamos assistindo em todo o mundo, nem todos os países são igualmente responsáveis por este processo catastrófico.

O aquecimento global pode ser observado ou analisado de duas perspectivas, a primeira é a quantidade ou volume de gases de efeito estufa que estão concentrados na atmosfera e que foram produzidos ao longo do processo de industrialização, em quase dois séculos e a segunda, é o volume anual de gases poluentes que os países continuam produzindo a cada ano.

O volume desses gases poluentes atualmente “estocado”  na atmosfera é de 412,5 partes por milhão de dióxido de carbono em 2020, conforme dados coletados por cientistas do Observatório Oceanográfico e atmosférico dos EUA.

Os países que lideram o ranking histórico dessas emissões são os EUA (20,3%); China (11,4%), Europa (10,5%); Rússia (6,9%), Brasil (4,5%). Neste contexto o nosso país é o sexto país que mais contribuiu para este acúmulo de gases de efeito estufa. Enquanto os países Europeus, Asiáticos (China, Japão, Coréia do Norte e Índia), EUA e Canadá emitiram esses gases oriundos do uso de combustíveis fósseis, o Brasil e a Indonésia, por exemplo, produziram mais de 80% das emissões de gases poluentes na atmosfera, oriundos do desmatamento, queimadas e uso da terra para atividades agropecuárias ,extração de madeiras ou grandes represas hidrelétricas e, em menor nível que a poluição urbana e industrial.

Entre 1850 e 1920 houve um aumento de 85% de acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera, sendo que parte deste volume, são absorvidos, sequestrados pelos oceanos e pelas florestas. Assim, à medida que o desmatamento e queimadas se intensificam e a poluição e destruição da biodiversidade, inclusive marinha e lacustre aumentam, este mecanismo de sequestro perde sua eficácia e os gases sequestrados da atmosfera e que estavam “estocados no solo ou nos oceanos, acabam novamente retornando para a atmosfera, jantando-se a outros bilhões de toneladas de gases de efeito estuda que continuam sendo produzidos por todos os países, principalmente, pelos 15 ou 20 países que mais continuam poluindo o planeta.

Entre 1850 e 2020, fruto do processo de crescimento econômico, principalmente da industrialização e atividades conexas, ao todo foram produzidos cerca de 2,5 bilhões de toneladas de CO2 (GtCO2). Com isso, restam apenas 500 GtCO2 do “orçamento de carbono”, o limite máximo para que as médias de temperaturas do planeta possam ficar abaixo dos 1,5ºC de aquecimento, como previsto pelo Acordo de Paris.

Durante o período da pandemia do coronavírus, com uma queda significativa das atividades econômicas na maioria dos países, houve uma certa “trégua” em relação `a emissão de gases poluentes na atmosfera. Todavia, com a retomada das atividades econômicas de forma mais acelerada no pós pandemia e tendo em vista que pouca coisa mudou em relação `as práticas econômicas e sociais, com certeza o ritmo de poluição do planeta vai continuar e Talvez aumentar, com maior intensidade do que em anos recentes, frustrando as expectativas quanto ao alcance do Acordo de Paris e da COP-26.

Todavia, apesar dos vários acordos climáticos e diversas conferências mundiais  sobre desenvolvimento e meio ambiente, sobre sustentabilidade e outras preocupações afins, firmados por praticamente todos os países, inclusive pelos que mais continuam poluindo o planeta, praticamente a grande maioria das metas acordadas tem ficado apenas no papel e o mundo, principalmente as lideranças politicas e empresariais da maioria dos países, continuam fingindo que estão agindo para melhor cuidar do planeta (a nossa casa comum).

As emissões de gases de efeito estufa ligadas ao uso de combustíveis fósseis e o uso da terra praticamente quadruplicaram nos últimos 60 anos e aumentaram quase 12 vezes no século passado. “O 0,2 GtCO2 liberado em 1850 equivale a apenas 0,5% dos cerca de 37 GtCO2 que provavelmente serão emitidos em 2021”, revelam os dados dos relatórios mais recentes sobre o clima Isto demonstra que tem havido muito blá, blá, blá nesses encontros e nos acordos firmados entre os países, pouca coisa de concreto tem sido feita que promovam mudanças significativas nesta caminhada rumo `a destruição do planeta e todas as formas de vida.

Dados do Atlas de Carbono, de 2017, indicam que A china é o país que, atualmente, mais polui o planeta com 28% da emissão do total de gases de efeito estufa lançados na atmosfera; seguindo-se EUA 14%; Índia 7%; Rússia 5%; Japão 3%; Alemanha 2,8%; Coréia do Sul e Iran (2% cada), e outros 7 países, incluindo  Brasil que ocupava a 13a. posição, com volumes que variam entre 1,0% e 1,5%.

Esses quinze maiores poluidores do planeta são responsáveis por 83% do volume desses gases tóxicos que estão destruindo a camada de ozônio, produzindo o aquecimento global do planeta e gerando a emergência climática que está batendo às nossas portas, gerando todas as crises socioambientais, tornando a vida em geral e a vida humana em particular, praticamente impossível, enquanto as discussões sobre o clima se arrastam e diversas países teimam em continuar imaginando que o crescimento econômico baseado em combustíveis fósseis e na degradação dos ecossistemas e biomas não tem consequências universais ou que cada país pode, soberanamente, continuar destruindo o planeta.

Coerente com o que vem falando e insistindo em relação à ecologia integral e a necessidade de um melhor cuidado com a criação, com o bem comum, com as futuras gerações, com a vida no planeta foi que, para preparar a contribuição do Vaticano a ser apresentada na COP-26, o Papa Francisco reuniu-se recentemente com diversas outros líderes religiosos e cientistas em Roma.

Cuidar do planeta e combater a crise socioambiental que se abate sobre todos os países não é uma questão meramente tecnológica, econômica e financeira, mas, fundamentalmente, uma questão ética, moral, cultural e humana, por isso todas as pessoas são chamadas a participar dessas discussões e das ações que possam transformar os modos de produção, as relações de trabalho, as politicas públicas, as atitudes e comportamentos que levam `a destruição do planeta.

A ênfase do documento do Vaticano e de outros países participantes da COP-26, é no sentido de que os países ricos ou de renda média, como o Brasil e outros mais, ou seja , os 15 países ou o G-20 que mais poluem o planeta devem promover mudanças profundas e radicais em seus modelos econômicos, de trabalho, de uso dos recursos naturais e respeitarem mais os limites do planeta.

Outro aspecto é quanto à necessidade desses países que mais tem poluído o planeta e que continuam poluindo, prejudicando todos os demais países tem a obrigação moral, além de realizarem mudanças internas que alterem os rumos do próprio crescimento/desenvolvimento econômico, para repararem os danos causados e os danos atuais que continuam causando, precisam compensar, ou seja, proverem recursos tecnológicos e financeiros para que os países subdesenvolvidos, pobres e de baixa renda possam também promoverem mudanças, principalmente o uso de fontes renováveis de energia e de uso da terra e das águas, para que os impactos das atividades econômicas desses países não venham contribuir para o aumento da poluição do planeta e do aquecimento global.

No caso dos países que ainda possuem florestas os mesmos deveriam ser beneficiados/remunerados por esses “serviços ambientais”, que as florestas prestam para a manutenção do clima em níveis que atendam os parâmetros estabelecidos no Acordo de Paris. Afinal, Floresta preservada vale mais do que área degradada, como acontece em inúmeros países, inclusive no Brasil.

De forma semelhante, para que tais parâmetros sejam atingidos, é fundamental tanto a despoluição dos oceanos, que já se transformaram em uma imensa lixeira planetária, quanto medidas para que todos os países parem de poluir os diversas cursos d’água que acabam desembocando nos oceanos e também mecanismos para sequestrarem os gases poluentes que estão “estocados” na atmosfera.

O custo dessas medidas devem ser de responsabilidade proporcional de quem tem poluído e de quem continua poluindo, ou seja, todos precisam “fazer o dever de casa”, mas os países que são considerados os grandes/maiores poluidores do planeta devem pagar um quinhão maior desta fatura.

Enfim, vamos aguardar como deverá ocorrer a COP-26 e quais os compromissos que serão reafirmados ou firmados, com vistas a momentos específicos como os anos de 2030; 2040 e 2050.

Se a humanidade não acordar, com certeza as futuras gerações irão pagar um preço incalculável em termos de danos socioambientais, causados pela falta de visão de futuro das gerações que nos antecederam e das atuais gerações, principalmente as autoridades públicas/políticos e líderes empresariais, as primeiras que só pensam nas próximas eleições e as segundas, que continuam só pensando em seus lucros imediatos e a qualquer preço, inclusive inviabilizando a vida neste planeta terra.

Será que esses imaginam que ficarão a salvo desta destruição socioambiental e suas consequências?

*JUACY DA SILVA, professor fundador, titular e aposentado, UFMT. Sociólogo, mestre em sociologia, articulador da Pastoral da Ecologia Integral no Centro Oeste Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. 

Quarta, 20 Outubro 2021 15:02

 

 

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JUACY DA SILVA*
 


“Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda…A educação não transforma o mundo, a educação muda as pessoas e as pessoas transformam o mundo….Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido e ser opressor” (Paulo Freire).

 

Para Louis Althusser, a escola (educação) é um dos “aparelhos ideológicos do Estado” e, nesta condição garante perpetuação e a reprodução dos mecanismos de poder das classes dominantes, em que a defesa do “status quo” se realiza através da educação. Assim, a educação cumpriria uma tarefa domesticadora e alienadora, jamais libertadora e transformadora.

 

É nesta teia de relações e visões de mundo quanto ao papel da educação na sociedade, que, em 2022 a Campanha da Fraternidade, sob os auspícios da CNBB, vai, novamente, enfocar o tema da educação.

 

A formação de todos os profissionais demanda tempo, investimentos, estudos, pesquisas, dedicação e visões de mundo que tem alcance muito além da mera formação de mão de obra especializada, exigências do mercado de trabalho, da economia e os níveis salariais oriundos do exercício das diferentes profissões/ocupações.

Esta formação projeta-se nas dimensões éticas, filosóficas, religiosas, culturais, no espírito de solidariedade, fraternidade, da justiça, da equidade e no cuidado com todas as formas de vida existentes no planeta (Casa Comum), enfim, em novos paradigmas que possam ser utilizados para a construção de um mundo novo, politica, social e economicamente justo e igualitário, culturalmente plural e ambientalmente sustentável, melhor do que o atual em que estamos vivendo.

 

De igual maneira, quando se trata da formação de agentes de pastorais, a mesma deve passar por um processo reflexivo bem profundo, incluindo tanto os aspectos teóricos e doutrinários da área objeto da ação da pastoral e também aspectos teológicos, doutrinários e do magistério da Igreja. Só assim, a Igreja e as Pastorais cumprirão o seu papel e  compromisso evangélico nessas áreas específicas, sendo “sal da terra e luz do mundo”.

É neste contexto que são realizados a grande maioria dos debates e reflexões quanto ao papel da educação na transformação da realidade e na libertação das pessoas, em relação a todas as amarras e mecanismos que geram concentração de renda, poder, propriedades e oportunidades de um lado e a exclusão das grandes massas, que vivem em meio `a violência, racismo, preconceito, na pobreza, na miséria , no abandono. na fome e na insegurança alimentar.

 

Todos os dias ouvimos discursos de autoridades, a grande maioria demagógicos, conversas entre pessoas simples, humildes e excluídas, docentes, alunos, dirigentes de entidades sindicais, comunitárias ou de organizações não governamentais, líderes religiosos de todos os credos , quanto ao papel e a importância da educação na sociedade, não de um ensino meramente formal, quase sempre alienado, desligado do contexto da realidade e sem compromisso com as transformações que países e sociedades necessitam para melhor integrar a população respeitando a dignidade humana.

Somente uma educação baseada na realidade, que reconheça as diferenças culturais entre as pessoas, bem como identifique os mecanismos políticos, sociais, culturais e econômicos que geram discriminação e exclusão das grandes massas, pode despertar o educando para a cidadania plena, a garantia dos direitos fundamentais das pessoas e cumprir o papel de ser uma força sociotransformadora.

 

Não podemos continuar convivendo com dois tipos ou modelos de educação, de um lado, uma educação sucateada, domesticada e alienadora para os pobres e uma educação justificadora do “status quo”, de melhor qualidade para os ricos e a classe média, facilitando a manutenção de seus privilégios.

 

Enquanto isto ocorrer, com certeza, a educação continuará sendo um mero “aparelho ideológico” do estado a serviço dos grupos que mantém seus privilégios `as custas do Estado e das politicas públicas. Aqui cabe uma reflexão quanto ao papel da educação privada, inclusive da educação confessional, católica, evangélica ou de qualquer outro grupo religioso ou filosófico, qual o papel desta educação no contexto das transformações que a sociedade brasileira está a exigir com urgência.

 

Neste contexto podemos destacar a exortação do Papa Francisco sobre a educação quando o mesmo afirma, de maneira bem clara: “A educação será ineficaz e os seus esforços estéreis, se não se preocupar também em difundir um novo modelo relativo ao ser humano, `a vida, `a sociedade e a relação com a natureza. Caso contrário, continuará a perdurar o modelo consumista, transmitido pelos meios de comunicação social e através dos mecanismos eficazes do mercado” (Encíclica Laudato Si, 215).

Como cristãos e católicos, principalmente, devemos refletir de uma maneira mais critica e profunda sobre que tipo de educação desejamos para nosso país, nossa sociedade e nossas famílias, se uma educação alienada e alienadora ou uma educação que promova o diálogo, a inclusão e busque ser uma força transformadora da realidade e respeite a dignidade humana?

 

Devemos ter bem presente que o Papa Francisco desde o inicio de seu magistério tem enfatizado a necessidade de uma Igreja sinodal, missionária, em saída, samaritana e profética, que faça uma opção preferencial pelos pobres e excluídos. Assim, precisamos pensar e defender uma educação, embasada no magistério social e na Doutrina Social da Igreja, transformadora, inserida neste contexto de uma realidade excludente. Este é o nosso maior desafio como cristãos, educadores e agentes de pastorais, nos dias atuais.

Com certeza, como parte desses debates e reflexões, também a CNBB não poderia estar ausente, como representação formal dos Bispos do Brasil e, por extensão de toda a Igreja Católica, por isso, definiu que a Campanha da Fraternidade de 2022, terá como TEMA: FRATERNIDADE E EDUCAÇÃO e como LEMA: “FALA COM SABEDORIA, ENSINA COM AMOR” (Bíblia Sagrada, Livro dos Provérbios 31:26).

O Objetivo Geral da Campanha da Fraternidade em 2022 é o seguinte: “Promover diálogos a partir da realidade educativa do Brasil, `a luz da fé cristã, propondo caminhos em favor do humanismo integral e solidário”.

 

Entre os objetivos Específicos podemos destacar: 4) pensar o papel da família, da comunidade de fé e da sociedade no processo educativo, com a colaboração dos educadores e das instituições de ensino;  5) Incentivar propostas educativas que, enraizadas no Evangelho, promovam a dignidade humana, a experiência do transcendente, a cultura do encontro e o cuidado com a casa comum; 6) estimular a organização do serviço pastoral junto `as escolas, universidades, centros comunitários e outros espaços educativos, em especial das instituições católicas de ensino;7) Promover uma educação comprometida com novas formas de economia, de politica e de progresso, verdadeiramente, a serviço da vida humana, em especial, dos mais pobres.

Em todas as suas atividades a Igreja, recomenda, principalmente nas diversas pastorais, inclusive na PASTORAL DA ECOLOGIA INTEGRAL, a utilização de um método já consagrado: VER/ESCUTAR, JULGAR/DISCERNIR, AGIR E CELEBRAR.

A Campanha da Fraternidade de 2022, mesmo que tenha como tema a educação, busca, refletir sobre as relações entre educação e as diferentes dimensões da realidade, inclusive (mesmo que de forma bem tênue) com a questão da ecologia integral.

Isto pode ser visto quando o foco da reflexão é o AGIR, destacando a necessidade de “Um novo projeto de vida como fonte para uma nova sociedade”; “Uma nova realidade para a educação? O pacto educativo global” (um novo chamada do Papa Francisco); “Educar para uma nova economia, onde destaca a proposta de “criar grupos de estudo e reflexão a partir do projeto Economia de Francisco e Clara”.

 

Entre as “Tarefas educativas urgentes da Igreja na sociedade: incluem-se: a formação de educadores populares nas comunidades eclesiais em todos os terrenos/territórios; incentivar projetos efetivos para a superação do analfabetismo, nas áreas urbanas e rurais: promover espaços educativos populares para educar e reeducar no cuidado para com o meio ambiente, superando o analfabetismo ecológicopromover escolas de Fé e Cidadania que, `a luz da Doutrina Social da Igreja, capacitem para participação nos conselhos paritários de direito; desenvolver o chamado da 6a. Semana Social Brasileira da CNBB, que é realizada em mutirão, na pluralidade cultural e étnica do Brasil, assim como no ecumenismo e dialogo inter-religioso, (enfatizando que o Tema da 6a. Semana Social Brasileira reflete os três “Ts” do Papa Francisco: Terra, Teto e Trabalho.

 

Com certeza, tendo em vista os conceitos, ideias, orientações e exortações do Papa Francisco ao longo de seu magistério, como, por exemplo, nas Encíclicas Lautado Si e Fratelli Tutti, bem como na Exortação Apostólica Minha Querida Amazônia, e também o caráter integrador da Pastoral da Ecologia Integral, durante a Campanha da Fraternidade de 2022 será uma ótima oportunidade para se refletir sobre a necessidade e também estimular a organização e fortalecimento das Pastorais da Ecologia Integral e um maior aprofundamento do conhecimento  das Encíclicas Laudato Si e Fratelli Tutti, da Exortação Apostólica Minha Querida Amazônia e ,também, do que seja ecologia integral, pecado ecológico, conversão ecológica, analfabetismo ecológico, cidadania ecológica e,  educação ecológica.

 

Só assim a escola e a educação, em todos os níveis, estarão abrindo perspectivas para a formação de cidadãos, cidadãs, empresários e lideranças mais conscientes quanto ao papel individual e coletivo no cuidado da “casa comum”, e no enfrentamento das causas e consequências da degradação dos ecossistemas, do aquecimento global, das mudanças climáticas, enfim, formando pessoas, em todas as áreas e territórios, que terão novas posturas, novas atitudes, novos comportamentos, hábitos e ações que possibilitem a redução e reversão do processo da destruição do planeta terra, nossa única “casa comum”.

Desta forma, a Campanha da Fraternidade (CF) 2022 poderá ser a base para uma tríade: Fraternidade, educação e ecologia integral, com possibilidade de um maior aprofundamento em 2023, quando o tema da CF poderia ser: FRATERNIDADE E ECOLOGIA INTEGRAL. Ficam a ideia e a sugestão!

 

Vamos pensar nisso? Afinal, como diz o Papa Francisco na Laudato Si “tudo esta interligado, (inclusive educação e crise socioambiental) nesta casa comum”.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado na Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia e articulador para a estruturação da Pastoral da Ecologia Integral no Centro Oeste. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. 

 

Terça, 19 Outubro 2021 10:17

 

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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*Valfredo da Mota Menezes
 

Estamos passando por um momento crucial, que deve servir de reflexão e ser aproveitado para uma profunda avaliação dos cursos de medicina. Há uma divisão clara entre os médicos em defensores ou detratores de determinadas intervenções que foram, ou ainda são, usadas no manejo da Covid-19, especialmente o chamado “Kit-Covid”. Quando essa divisão inclui professores de medicina, a situação fica ainda mais grave. Como ficará o aprendizado dos alunos diante dessa “disputa”? De que maneira eles vão aceitar uma ou outra “posição”?  A aceitação será decidida pela empatia, pela ideologia ou pela lógica científica? Essa situação mostrou a fragilidade de alguns aspectos dos cursos médicos. Fragilidade que, no meu ponto de vista, se baseia na forma como o curso ainda é ministrado, muitas vezes centrado no personalismo do professor.

 Tempos atrás era comum, em congressos médicos, a apresentação de algum professor Ph”Deus”, sobre o manejo de determinada doença com o tema: “Como eu trato.........”. Desde o fim do século passado, principalmente depois da grande expansão da “Internet”, nenhum aluno ou médico necessita mais desse tipo de aula. Com a grande ampliação dos bancos de dados específicos da área de saúde, das mudanças metodológicas na busca e na divulgação do conhecimento médico e, principalmente, com o surgimento de uma ferramenta metodológica de como estudar e de como se atualizar, denominada Medicina Baseada em Evidências (MBE), nenhum professor se atreverá mais a expor sua experiência, sem um embasamento científico sólido. Essa socialização do conhecimento trazida por essas mudanças deixou alguns médicos, e alguns professores, preocupados com a perda do status de detentores do conhecimento e, muitos, até hoje ainda têm preconceito sobre essa “nova” metodologia e continuam a defender a supremacia da experiência sobre as evidências científicas.

A situação atual mostra que já passou da hora de as escolas médicas incluírem nos currículos conteúdos de metodologia científica, principalmente de avaliação crítica da literatura médica. Na maioria das escolas médicas, esses conteúdos sobre metodologia científica só são incluídos nos cursos de pós-graduação stricto sensu.   Mesmo os residentes saem do curso com noção mínima de metodologia científica ou de MBE e, em sua grande maioria, com quase nenhum conhecimento sobre “Avaliação de Tecnologia em Saúde” (ATS). Muitos, embora já pratiquem a MBE, desconhecem as metodologias e os critérios de avaliação de novas tecnologias em saúde e a maior parte não sabe como ler, criticamente, um artigo científico.

Já em 1993, a preocupação em avaliar a tecnologia antes do seu uso, fez surgir a primeira rede mundial de avaliação de tecnologias em saúde: “International Network of Agencies for Health Technology Assessment” (INAHTA) www.inahta.org). No Brasil vem sendo discutida desde o inicio deste século. O Ministério da Saúde criou a “Comissão de Incorporação de Tecnologias” –CITEC, reestruturada, ampliada e transformada depois em “Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias” (CONITEC)(Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011).Foi também criada a Rede Brasileira de Avaliação de Tecnologias em Saúde (REBRATS)https://rebrats.saude.gov.br/10-institucional/110-nats.Esta rede já conta com Núcleos de Avaliação de Tecnologias em Saúde (NATS) em 21 Estados brasileiros, a maioria ligada às Universidades Federais. Participei da criação do NATS no Hospital Universitário da UFMT. Um dos objetivos era, além da pura tecnicidade, “o de enfatizar a necessidade de uma visão crítica e de estabelecer um critério permanente de educação continuada do corpo clínico”, ressaltando que essa “visão crítica deve ser, primariamente, do Corpo Clínico e, fundamentalmente, do médico que vai fazer uso da tecnologia”. Apesar disso, os cursos médicos, e muitos professores desses cursos, não buscaram uma integração e ainda hoje são poucos os professores de medicina que fazem parte desses núcleos.

O que estou buscando dizer é que, embora existam ferramentas e institucionalidades, essas não estão atingindo um dos principais objetivos e muitos médicos estão saindo dos cursos sem uma noção clara de metodologia científica. Vimos e ouvimos nos dois últimos anos a exaltação da necessidade de “evidências científicas”. Vimos e ouvimos dezenas de políticos falarem em “Ensaios Clínicos de Fase III”, “Revisão Sistemática” e “Meta-análises”. Vimos e ouvimos centenas de médicos interpretando tais estudos e, infelizmente, muitos sem a menor condição para fazê-lo. Médicos que, além de desconhecerem metodologia científica, não têm nenhuma noção crítica sobre os estudos que discutem e passam a aceitar as conclusões destes conforme o seu conceito prévio e/ou seu posicionamento ideológico. Não abandonam o empirismo inicial, mesmo depois de os estudos com desenho adequado e melhores metodologias terem demonstrado que os medicamentos não funcionavam (“o tratamento empírico caminha até ser alcançado pela ciência...”)(https://www.midianews.com.br/opiniao/o-kit-covid-salva-vidas/380271).

Até mesmo professores, alguns mestres ou até mesmo doutores, exatamente pela inconsistência do conhecimento científico, continuaram, e alguns ainda continuam, a defender as tais drogas do “tratamento precoce”.

Assim, acredito que aproveitando o que mostra essa realidade, as escolas médicas e seus professores devem repensar o currículo, introduzindo e enfatizando disciplinas sobre Avaliação Crítica da Literatura Médica. O médico pode e deve ter posições políticas, entretanto, essa politica não deve afastá-lo da verdade. A ideia não é a de transformar o médico em cientista, mas a de aproximá-lo da ciência. A ciência sempre foi e será sempre a indutora da Civilidade.


*Médico, Professor Associado - Medicina-UFMT (aposentado). Doutor em Medicina Interna e Terapêutica-UNIFESP.

Terça, 28 Setembro 2021 10:36
 
 
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JUACY DA SILVA*

 

“Cada cristão, cada membro da família humana pode contribuir para tecer, como um fio frágil, porém único e indispensável, a rede que abraça a todos. Sintamo-nos envolvidos e responsáveis por cuidar da criação com oração e compromisso. Deus, “amigo da vida”, nos dê coragem para trabalhar pelo bem, sem esperar que sejam outros que comecem, nem que seja tarde demais” Papa Francisco.

No primeiro dia deste mês de  Setembro, que é o DIA MUNDIAL DE ORAÇÃO PELO CUIDADO DA CRIAÇÃO e, durante pouco mais de um mês, até o dia 04 de Outubro, Dia de São Francisco de Assis, Patrono da Ecologia Integral, as Igrejas Cristãs (Católica e Evangélicas) celebram o TEMPO DA CRIAÇÃO, dentro do espirito do Salmista (Livro de Salmos, 104, v. 34) quando exalta o Criador e diz “Enviai, Senhor, o vosso Espírito e renovai a face da Terra”, que a cada dia, cada ano continua sendo destruída, degradada, desrespeitada enquanto obra do mesmo Criador.

A Laudato Si (LS 95) diz textualmente “O meio ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos”, e que também, “não há duas crises separadas: uma Ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental. (LS 139).

Neste período, do TEMPO DA CRIAÇÃO, além de nossas orações e preces, devemos, como cristãos e cristãs,  e também as Igrejas como Instituições voltadas ao cuidado da Casa Comum, com espirito de solidariedade e fraternidade entre as pessoas, repetindo, devemos colocar no centro de nossas preocupações, de nossas atitudes, de nossos comportamentos e de nossas ações o DESAFIO SÓCIOAMBIENTAL, que é o problema mais grave que a humanidade está enfrentando na atualidade, muito pior do que a pandemia do coronavírus e vai enfrentar pelas próximas décadas, onde estão incluídas, dentre outras, as questões da fome, do aquecimento global, da degradação dos biomas, da desertificação, do desmatamento, das queimadas, da crise hídrica e de energia, do uso abusivo de agrotóxicos, da falta de saneamento básico nas cidades, da poluição do ar, das águas, dos oceanos, da terra e o agravamento da crise climática.

Mesmo que tais problemas e desafios afetem todos os países e todos os grupos humanos e classes sociais, é sobejamente sabido que as maiores vítimas da crise socioambiental são os pobres, milhões e bilhões de pessoas que vivem excluídas social, econômica e politicamente. A Laudato Si, deixa este aspecto bem claro quando afirma “O impacto dos desequilíbrios (ambientais) atuais manifesta-se  na morte prematura de muitos pobres” (LS 48) e que é “preciso ouvir tanto o clamor da terra quanto o clamor dos pobres” (LS 49).

Enfim, como diz constantemente tanto o Papa Francisco quanto cientistas, estudiosos e ambientalistas ao redor do Planeta, na raiz desses problemas socioambientais e da ecologia integral, desta degradação, desta destruição criminosa e irresponsável estão as ações humanas orientadas por um egoísmo e consumismo sem precedentes e também pelos modelos de crescimento econômico, que mesmo não sendo, se autodenominam de “desenvolvimento”, que estão baseados, ancorados numa economia de morte, pois não respeitam os limites do Planeta, estimulam um consumismo desenfreado, visando o lucro fácil e imediato, fomentando o desperdício, o descarte, a geração cada vez maior de resíduos sólidos/lixo, aumentando a poluição, provocando o aumento de gases de efeito estufa na atmosfera, aumentando a temperatura da terra e dos oceanos e gerando mais problemas, mais sofrimento, mais fome, miséria e morte.

Se nada for feito de fato para barrar este processo insano e destruidor, com toda certeza as futuras gerações irão pagar um altíssimo preço para continuarem vivendo em um planeta doente, poluído e com condições insuportáveis para a vida, em  todas as formas. Milhões de espécies animais e vegetais, enfim, a biodiversidade estão sendo, impiedosa e criminosamente, destruídas, ante a omissão e conivência tanto da população em geral, com raras exceções e por governos e instituições que deveriam zelar para que tanto as presentes quanto as futuras gerações possam desfrutar de uma vida digna neste Planeta, nesta Casa Comum, onde “tudo está interligado”, razão pela qual tanto tem sido enfatizado, “nós só temos um Planeta terra”, ao destrui-lo nós, os humanos, estaremos destruindo a própria humanidade.

Vamos aproveitar este TEMPO DA CRIAÇÃO que deverá se encerrar dentro de poucos dias, em 04 de Outubro próximo, para refletirmos e contribuirmos para que na definição de politicas públicas, em  todos os niveis de governo, Federal, Estaduais e Municipais, as questões socioambientais, a Ecologia Integral sejam incluídas, afinal, como tanto tem enfatizado o Papa Francisco, a “boa politica” é aquela que deve estar voltada para os cuidados da Casa Comum e que seja inclusiva, solidária, em relação `a repartição dos frutos do trabalho coletivo, jamais acumulando em poucas mãos, que geram exclusão social e econômica.

É falsa tanto a ideia quanto o modelo de que possa haver justiça e justiça socioambiental em um mundo extremamente desigual e socioambientalmente em processo de degradação, e que, em nome do progresso e das novas tecnologias promovam mais concentração de renda, riqueza, propriedades e oportunidades em um grupo reduzindo de pessoas, que não passam de 10%, excluindo milhões e bilhões de pessoa, em torno de  90% dos mais de 7,874 bilhões de habitantes do Planeta que sofrem com desemprego, subemprego, fome, desnutrição, precárias condições habitacionais, que moram em lugares impróprios sujeitos a toda sorte de doenças.

Cabe a cada pessoa analisar como estão os cuidados da Casa Comum, em seu país, seu estado, sua cidade, sua comunidade ou paroquia/Igreja. Precisamos, cada vez mais, “pensar globalmente e agir localmente”,  ai está a raiz do significado da palavra ORAÇÃO: ORAR/REZAR mas também AÇÃO, agirmos, fazermos nossa parte e pressionar, como cristãos, cidadãos e cidadãs, contribuintes que somos, para que as Instituições governamentais, nossos governantes não sejam omissos e nem coniventes com práticas criminosos que estão destruindo a rica biodiversidade do planeta e do Brasil.

Para colaborar neste processo, a Igreja Católica, por exemplo, tem a seu dispor diversas formas de agir, que são as PASTORAIS, com destaque para as PASTORAIS DA ECOLOGIA INTEGRAL, fundamentadas nos textos sagrados, na doutrina social da Igreja, no Magistério dos diferentes Papas e, principalmente, nos Ensinamentos do Papa Francisco como constantes nas Encíclicas Laudato Si, Fratelli Tutti, na Exortação Apostólica Minha Querida Amazônia, bem como em seus pronunciamentos com destaque para a Economia de Francisco e Clara, em seus três “Ts”: Terra, Teto e Trabalho, bem como no documento de Encerramento do Sínodo dos Bispos para a Pan Amazônia “Instrumentum Laboris – Amazônia: Novos Caminhos para a Igreja e para uma Ecologia Integral, e, também nos documentos do CELAM de Santo Domingo e de Aparecida.

Resumindo, a Igreja Católica, enquanto Instituição, através de suas hierarquias eclesiásticas e os cristãos leigos e leigas tem as bússolas para nortearem suas reflexões e ações, se não o fizerem estarão se omitindo, se calando antes os PECADOS ECOLÓGICOS e impossibilitando a CONVERSÃO ECOLÓGICA, sobre os quais e a qual tanto tem enfatizado o Papa Francisco.

A CONVERSÃO ECOLÓGICA, é o único caminho para que os cristãos possam se redimir dos males que também tem causado `a casa comum, seja pelas ações nefastas que tem contribuído para o agravamento da crise ambiental e a degradação dos biomas quanto pela omissão diante dessas ações. Só assim refletindo e agindo, não apenas durante os 34 dias do TEMPO DA CRIAÇÃO, mas durante o ano todo, e todos os dias no futuro é que conseguiremos transformar esta triste realidade, que tanto nos angustia e mudar os rumos de um desastre inimaginável que afetará indelevelmente toda a humanidade e, cujas consequências, são percebidas e sentidas por todas as pessoas em todo o planeta, inclusive no Brasil.

Não podemos continuar como o avestruz que enfia a cabeça no primeiro buraco, imaginando que, assim fazendo, o perigo cessará, ou seja, não podemos continuar ALIENADOS em relação a destruição do planeta, da crise socioambiental e à EMERGÊNCIA CLIMÁTICA.

Apesar da gravidade e da urgência da crise socioambiental, nós, como cristãos não podemos perder a esperança jamais, como bem afirma o Papa Francisco na Encíclica Frattelli Tutti (54 e 55) “Apesar dessas sombras densas, que não se deve ignorar,…, desejo dar voz a diversos caminhos de esperança. Com efeito, Deus continua a espalhar sementes de bem na humanidade. A esperança é ousada, sabe olhar para além das comodidades pessoais, das pequenas seguranças e compensações que reduzem o horizonte, para se abrir aos grandes ideais que tornam a vida mais bela e digna. Caminhemos na esperança”.

Por isso, precisamos ser a “luz do mundo”, pelas nossas atitudes,  nossos comportamentos e nossas ações, em meio às trevas da ignorância, do negacionismo, da corrupção, da omissão e da degradação do planeta.

Este é o sentido e o significado do TEMPO DA CRIAÇÃO!

*JUACY DA SILVA, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, e, atualmente, articulador para a Estruturação da Pastoral da Ecologia Integral em MT e no Centro Oeste. Email: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.