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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
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Juacy da Silva*
Campanhas para motivar a opinião pública e educação ambiental são importantes e necessárias, mas não resolvem todos os problemas socioambientais, precisamos ir mais além, incluir esses problemas e desafios no bojo das políticas públicas, federal, estaduais e municipais, com recursos orçamentários que demonstrem o grau ou nível de prioridade que nossos governantes, principalmente dos poderes Executivos e Legislativos.
“Tudo está interligado, nesta Casa Comum” Papa Francisco, Laudato Si, 2025.
A destruição de biomas como Amazônia, o Cerrado e o Pantanal, da mesma forma que a Mata Atlântica, os Pampas e a Caatinga já perderam a maior parte da biodiversidade, afetam o regime de chuvas, a fertilidade do solo, acabam com espécies animais e vegetais, como, por exemplo, as plantas medicinais, tudo isto afeta, não apenas o Brasil, mas o resto do mundo.
Estamos diante de uma verdadeira emergência climática. Não é por falta de Leis, acordos internacionais, conferências mundiais sobre meio ambiente, o clima, a destruição da natureza, bem como milhares de estudos sobre os problemas e desafios socioambientais e tantos desastres “naturais”, ambientais, em cujas origens estão as ações irracionais dos humanos, consideradas crimes ambientais pela legislação ou pecado ecológico sob a ótica da Igreja (Católica e Evangélicas), que a consciência ambiental continua adormecida, tanto por parte da população quanto do empresariado, de líderes religiosos e também pelos governantes do mundo todo, inclusive no Brasil.
Há mais de 50 anos foi realizada a primeira conferência mundial/internacional para discutir, tratar e debater sobre um certo “conflito” entre desenvolvimento, crescimento econômico e seus impactos na natureza (meio ambiente).
Desde então a chamada “questão ambiental” passou a fazer parte das agendas mundial, através da ONU e de sua agência especializada em questões ambientais que é a UNEP, bem como de inúmeras outras organizações internacionais como UNICEF, FAO, União Europeia, Banco Mundial (BIRD), FMI, do Banco Interamericano de Desenvolvimento BID), o Fórum Econômico Mundial e inúmeras instituições de pesquisas, de renome internacional.
Foram realizadas conferências memoráveis como a ECO 92, no Rio de Janeiro, que reuniu mais de 180 chefes de Governo e de Estado, elaborada a Carta da Terra, a Agenda 21; o Protocolo de Kyoto, o Acordo de Paris.
A ONU, na antevéspera do início do Terceiro milênio, em memorável Assembleia Geral aprovou o estabelecimento de uma pauta mínima, no que concerne ao meio ambiente, com apenas OITO grandes objetivos, para balizar as políticas de desenvolvimento nacional dos países membros, inclusive o Brasil, a vigorar por 15 anos, ou seja, do ano 2.000 até o ano de 2015.
Em 2015, ano bem emblemático para o rumo das discussões socioambientais, o Papa Francisco publicou a Encíclica Laudato Si, que passou a incorporar a preocupação e as ações da Igreja Católica, de forma inovadora e até um tanto revolucionária, no corpo da Doutrina Social da IGREJA/DSI.
No mesmo ano também a ONU, através de aprovação da Assembleia Geral instituiu os OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, em substituição aos objetivos do milênio, em que, através de 17 objetivos e 169 metas, estabeleceu como horizonte para o cumprimento desses objetivos e metas o ano de 2030, criando o que passou a ser denominada de AGENDA 2030.
Outro marco significativo no ano de 2015 foi a aprovação do Acordo de Paris que, lamentavelmente, os grandes poluidores do planeta ainda se recusam a cumprir a maioria de suas cláusulas, incluindo o fim do uso dos combustíveis fósseis (petróleo, carvão e gás natural), que e a maior fonte da poluição no mundo.
Desde 1972, portanto há mais de meio século, ocorreram muitas reuniões, “debates”, discursos, compromissos formais e legais, mas que pouco resultado produziram, ficaram, praticamente, no papel, em boas intenções e discursos vazios e demagógicos, como sempre tem acontecido.
Enquanto isso, a degradação do planeta, a destruição da natureza, dos biomas e ecossistemas continuavam, como ainda continuam avançando. As florestas, principalmente as florestas tropicais foram e continuam desaparecendo que, juntamente com as queimadas, afetam a fertilidade dos solos, contaminam e destroem os cursos d’água, poluem o ar.
A grande maioria dos países inseriram as questões ambientais em suas legislações e até mesmo em suas Constituições nacionais, como foi o caso do Brasil que, em 1988, ao aprovar a Constituição Federal, a chamada Constituição Cidadã, atualmente bastante desfigurada por tantas emendas que aos poucos vai se distanciando da vontade expressa pela Assembleia Nacional Constituinte que, pôs fim formal `a Constituição outorgado pelo regime militar.
Sempre é bom lembrar que, na Constituição Federal de nosso país está expresso de forma clara e objetiva que “Art. 225. Todos têm o direito ao meio ambiente, ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial `a sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Apesar deste mandamento constitucional e de toda uma legislação infra constitucional, a destruição de biomas como o Pantanal, o Cerrado, a Amazônia, enfim, todos os biomas continua sob o olhar passivo tanto de governantes quanto de uma população alienada e pouco preocupada com o futuro do planeta, só despertando e se comovendo quando milhares, dezenas de milhares ou milhões de pessoas choram por terem perdido seus lares, milhares de vidas humanas e muito sofrimento, como atualmente acontece no Rio Grande do Sul, como já aconteceu em práticamente todos os estados e, tudo leva a crer, que outros e mais temíveis e terríveis desastres, nada naturais, pois são catástrofes anunciadas, deverão ocorrer.
Apesar da constitucionalização do direito ambiental como um bem coletivo das presentes e futuras gerações, o assunto tem merecido debates que chegam até ao Supremo Tribunal Federal.Sobre este assunto do Controle Concentrado de Constitucionalidade, em julgamento recente alguns ministros se expressaram, como podemos observar de seus votos “Não há estado de coisas inconstitucional na política de proteção ambiental da Amazônia e do Pantanal. Contudo, para o efetivo cumprimento do direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e do respectivo dever do Poder Público em defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (CF/1988, art. 225), é necessária a adoção de algumas providências. Em que pese o processo de reconstitucionalização, decorrente de avanços e melhorias na política de combate às queimadas e desmatamento nos referidos biomas, ainda persistem algumas falhas estruturais que justificam a atuação desta Corte, a fim de que as medidas necessárias não só sejam adotadas, mas funcionem adequadamente.[ADPF 743, ADPF 746 e ADPF 857, rel. min. André Mendonça, red. do ac. min. Flávio Dino, j. 20.3.2024”
Neste mesmo julgamento é interessante também observarmos que em outro voto, da então Ministra Rosa Weber, ficou claro o entendimento do tema “Ao conferir à coletividade o direito-dever de tutelar e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225), a Constituição Federal está a exigir a participação popular na administração desse bem de uso comum e de interesse de toda a sociedade. E assim o faz tomando em conta duas razões normativas: a dimensão objetiva do direito fundamental ao meio ambiente e o projeto constitucional de democracia participativa na governança ambiental. Análise da validade constitucional do Decreto n. 9.806/2019 a partir das premissas jurídicas fixadas: ( i) perfil institucional normativo-deliberativo do CONAMA, (ii) quadro de regras, instituições e procedimentos formais e informais da democracia constitucional brasileira, (iii) igualdade política na organização-procedimental, e (iv ) direitos ambientais procedimentais e de participação na governança ambiental. O desmantelamento das estruturas orgânicas que viabilizam a participação democrática de grupos sociais heterogêneos nos processos decisórios do Conama tem como efeito a implementação de um sistema decisório hegemônico, concentrado e não responsivo, incompatível com a arquitetura constitucional democrática das instituições públicas e suas exigentes condicionantes. A discricionariedade decisória do Chefe do Executivo na reestruturação administrativa não é prerrogativa isenta de limites, ainda mais no campo dos Conselhos com perfis deliberativos. A moldura normativa a ser respeitada na organização procedimental dos Conselhos é antes uma garantia de contenção do poder do Estado frente à participação popular, missão civilizatória que o constitucionalismo se propõe a cumprir. O espaço decisório do Executivo não permite intervenção ou regulação desproporcional. A Constituição Federal não negocia retrocessos, sob a justificativa de liberdade de conformação decisória administrativa. A eficiência e a racionalidade são vetores constitucionais que orientam o Poder Executivo na atividade administrativa, com o objetivo de assegurar efetividade na prestação dos serviços públicos, respeitados limites mínimos razoáveis, sob pena de retrocessos qualitativos em nome de incrementos quantitativos. Inconstitucionalidade do Decreto n. 9.806/2019.
[ADPF 623, rel. min. Rosa Weber, j. 22-5-2023, P, DJE de 18-7-2023”.
Durante o mês de junho existem diversos “dias especiais”, relacionados às questões socioambientais, que deveriam estimular a reflexão, o debate e também algumas ações, mesmo que sejam apenas pontuais e ou simbólicas, mas que podem contribuir para o despertar da consciência ecológica.
Assim é que entre os dias 01 e 07 de Junho “comemora-se” a Semana do Meio Ambiente, se bem que em relação ao meio ambiente, tanto no mundo quanto no Brasil temos pouco ou nada para realmente celebrar, em 03 é a vez do Dia mundial da Educação ambiental, em 05 é o Dia da Ecologia e o Dia mundial do Meio Ambiente, cujo tema este ano é a prevenção das secas e da desertificação, com o lema “ Nossa terra, nosso futuro”, destacando que em 17 de Junho é o Dia mundial de combate `a desertificação e à seca.
Em 07 de junho o assunto é Segurança alimentar, tendo como foco o combate ao uso indiscriminado, abusivo e criminoso de agrotóxicos que contaminam o meio ambiente, poluindo os solos, as águas, o ar, e, quando presentes nos alimentam destroem a saúde e a vida humana.
Em 08 de Junho é a vez de voltarmos nossos olhares para o que a humanidade está fazendo com os oceanos, o lixo que é produzido em áreas remotas, longe do mar, como em Cuiabá ou qualquer outra cidade do interior do Brasil, quando não devidamente tratado, acaba sendo levado, poluindo córregos, rios até chegar aos mares e oceanos. A degradação dos oceanos promove o aquecimento de suas águas e provocam as mudanças climáticas.
O 11 de Junho é dedicado à reflexão sobre o papel e a importância do Educador Sanitário, como alguém que promove um melhor cuidado com o meio ambiente, complementado pelas ações de outro profissional importante nesta área que é o Gestor Ambiental, que tem também o seu dia celebrado em 17 de Junho.
Em 18 de junho é celebrado o Dia da gastronomia sustentável, que está umbilicalmente vinculada `a produção orgânica e à agroecologia, práticas agrícolas também sustentáveis.
E, finalmente, no último dia de Junho (30), é o Dia Nacional do Fiscal Agropecuário, que, juntamente com tantos outros profissionais tenta zelar pelo cumprimento da legislação para que nossos alimentos, de origem animal, tenham a qualidade necessária em respeito `a saúde humana e normas sanitárias.
Assim, apesar de tantas discussões, normas, regulamentos, leis, decretos e até mesmo a Constituição, a destruição da natureza continua acelerada. Foi pensando neste processo que o Senador Jaques Wagner (PT/BA), apresentou o projeto de Lei 1070/2021, aprovado pelas duas casas legislativas (Senado e Câmara Federal), modificando a Lei 9.795 de 1999, a Lei que define a Política Nacional de Educação Ambiental, sancionada pelo Presidente da República como Lei 14.393, de 2022, estabelecendo o Junho Verde, com o objetivo de educar e despertar a consciência ecológica no país e deve ser conduzida, na forma de Campanha, pelos governos federal, estaduais e municipais.
Tal campanha deve promover o diálogo, a reflexão e o debate sobre questões socioambientais entre governantes, empresariado, lideranças civis, nas igrejas, sindicatos, movimento comunitário, na imprensa, ONGs etc, visando transformar atitudes, hábitos e estilos de vida que estão contribuindo para a degradação ambiental e a destruição dos biomas e ecossistemas com as consequências trágicas que bem conhecemos e assistindo cada vez com maior frequência e comoção pública.
Despertar a consciência coletiva é importante, todavia, o que precisamos realmente é o estabelecimento de uma política ambiental, no contexto das políticas públicas nacional, estaduais e municipais, bem como o fortalecimento dos organismos de fiscalização e controle, incluindo legislação mais rigorosa que, realmente, represente punição aos criminosos ambientais, cujas penas possam realmente demove-los a praticar tais crimes.
Finalmente, não basta despertar a consciência ecológica através de campanhas, como o Junho Verde ou outras mais, é fundamental que sejam criados mecanismos e canais efetivos de participação popular e não fique apenas a cargo dos donos do poder e das elites a condução das políticas públicas, principalmente, das políticas ambientais. Este deve ser o cerne do diálogo, das reflexões e dos debates socioambientais.
*Juacy da Silva, professor fundador, titular, aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy