Terça, 03 Novembro 2015 10:54

PARADÍGMAS ULTRAPASSADOS

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JUACY DA SILVA*
 
Depois de publicar na última semana o artigo “ Desenvolvimento: em busca de novos paradigmas”  recebi diversas mensagens sugerindo que aprofundasse um pouco mais a discussão  sobre  esta questão dos modelos ou paradigmas que  tem servido de  base para o processo de desenvolvimento de nosso país, ao longo de séculos. É importante dizer  que o Brasil nunca teve um grande projeto nacional de desenvolvimento, no sentido  de  uma visão estratégica  de longo prazo; apenas projetos de governo que sofreram  e ainda sofrem descontinuidade com as sucessivas trocas dos grupos de poder.

A ideia  e as práticas de planejamento, bem  como a continuidade de ação de  governo representam a exceção enquanto a descontinuidade, a improvisação , o voluntarismo e personalismo passam  a ser as regras. Prova disso são as milhares e obras públicas paralisadas, ou retomadas tardiamente, que representam bilhões  de reais ou dólares desperdiçados.

Assim, vou apenas pontuar alguns desses  velhos e ultrapassados paradigmas, a começar  pelo sistema produtivo e as relações de trabalho que ainda afetam, negativamente, a nossa economia e sociedade. O modelo  de desenvolvimento que vem praticamente desde o descobrimento, passando pelo Império e chegando por vias indiretas até o século  XXI,  é de base primária, extrativista e agropastoril, baseado no latifúndio, na exportação de matérias primas com  pouco valor agregado e a importação de bens acabados.

As  relações de trabalho por  quase  quatro  séculos foram  o trabalho escravo, semiescravo e a falta  de garantia de direitos mínimos, chegando até a atualidade, com  as novas  regras para definir  as relações do trabalho doméstico, mais de 70  anos após  o surgimento da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, no início da década de quarenta, mas que deixou de fora  milhões de trabalhadores rurais, autônomos e empregados domésticos.

O latifúndio  e a grilagem de terras  em  todos os estados faziam  parte do Sistema econômico e  político, onde o  trabalhador rural e moradores de pequenas cidades estavam muito mais próximos dos servos de gleba da idade média na Europa do que dos cidadãos  livres como  fonte primeira do poder. As  mulheres só tiveram o direito de votar e serem votadas a partir dos anos trinta do século passado   e  os analfabetos há poucas décadas.

Outro paradigma presente tem sido a concentração  da população, inicialmente  ao longo da costa litorânea, em  uma faixa  de, no máximo 250 km, deixando o interior praticamente desabitado, a não ser por pequenas  ilhas de ocupação  como Cuiabá, bem no coração  do Brasil. Somente a partir do Governo JK com a construção de Brasília e da abertura da Belém Brasília e depois da ligação  de Brasília com o Acre  e da Cuiabá –Santarém, é que ocorreu um avanço acelerado da expansão das fronteiras agrícolas rumo à Amazônia e ao Centro – Oeste.

As migrações  rural urbana  de forma acelerada durante  o final dos anos quarenta  até  a década de sessenta, moldaram o surgimento de cidades onde a ocupação  desordenada das periferias e áreas impróprias para a moradia humana  determinaram o perfil de uma urbanização, onde as favelas e loteamentos clandestinos definiram o perfil  de nossas cidades atualmente, com problemas de infra- estrutura, falta  de regularização fundiária e a exclusão socioeconômica de milhões de famílias.

Podemos, então, mencionar a concentração econômica, demográfica, a industrialização  tardia e no momento a desindustrialização, uma  economia de base primária e agroexportadora, com baixo  valor agregado, o rodoviarismo, uma  estrutura agrária baseada nas grandes propriedades, no latifúndio improdutivo, a degradação ambiental, ainda presente nos dias atuais no desmatamento da Amazônia e do Centro-Oste,  com a degradação dos solos e o uso excessivo de agrotóxico, na  baixa produtividade e falta de competitividade da economia brasileira no contexto internacional  e na importação de bens acabados, principalmente na atualidade de  bens tecnológicos e ainda de petróleo, trigo, insumos agrícolas e industriais.

Ou seja, nossos paradigmas de desenvolvimento não mudaram ao longo de séculos e estão sendo e serão os responsáveis pelo atraso de nossa  caminhada rumo a  uma sociedade moderna, competitiva e que possibilite um melhor bem-estar e níveis de vida mais elevados para a sua população. Com isso continuamos com dois ou vários Brasis, um moderno e rico, representado pelo centro-sul, apesar da exclusão de uma grande parcela de sua população e outro atrasado, pobre e dependente representado pelas regiões norte, nordeste e parte do Centro-oeste, onde apenas  uma elite usufrui dos frutos do crescimento econômico, boa parte graças às  benesses distribuídas pelo governo e pelos bancos oficiais, como crédito subsidiado e renúncia fiscal aos grandes grupos econômicos, enquanto a grande maioria da população recebe migalhas dos programas assistencialistas.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista de A Gazeta. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com

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