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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
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Roberto Boaventura da Silva Sá
Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP
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No início dos anos 2000, analisei academicamente a participação da mídia nas eleições presidenciais de 1989, as primeiras pós-golpe/64. Para tanto, tomei a Revista Veja como veículo central das considerações.
O recorte das leituras daquele semanário concentrou-se no período de 1986 (ano do início da Constituinte de 1988) à edição anterior da semana em que ocorreram as eleições acima referenciadas, das quais Collor venceu um projeto popular de governo, capitaneado por Lula/PT.
A quem não se recorda, 1989, além de ter sido o ano em que voltamos às urnas para eleger um presidente, também foi o marco da Queda do Muro de Berlim. Aliás, com a sua derrubada, cria-se na vitória retumbante do capitalismo sobre o socialismo/comunismo. Houve até quem propagasse que a história havia chegado ao seu final. Qual o quê?
Portanto, naquele instante, toda e qualquer articulação das elites nacionais e internacionais, via de regra, propagada pelas mídias comerciais planeta afora, estava voltada para comprovar que o comunismo era o pior dos mundos; e que o capitalismo, o melhor.
No Brasil, essa articulação foi um sucesso aos interesses das elites. Veja foi, naquele período, uma das vozes referências para tais interesses. Em nenhuma edição daquela época, o veículo perdeu oportunidade para massacrar as sociedades socialistas e/ou comunistas. Logo, alguns ícones humanos, como Paulo Freire, Che Guevara, Gramsci, Marx e alii, e signos da esquerda (foice, martelo, estrela do PT, a cor vermelha etc.) foram lançados ao fogo do inferno dos conceitos e preconceitos de Veja.
Detalhe: todo aquele massacre ideológico era feito com paralelos impensáveis a quaisquer mentes informadas. Assim, não havia edição deVeja em que, absurda e deliberadamente, não se misturavam características de socialismo e comunismo com os de nazismo e fascismo. Era inacreditável. Fosse hoje, com o avanço das redes sociais, a mídia nacional seria ridicularizada constantemente. Veja seria o carro-chefe das humilhações.
Mas nada como uma eleição após a outra; e sobre todas, a última, que elegeu Bolsonaro, um ser que nos deixa apreensivos o tempo todo. Um ser repleto de preconceitos; por isso, naturalmente, perigoso.
Dos seus preconceitos, a educação é uma das maiores vítimas. Sem cerimônias, Bolsonaro defende, p. ex., o PL “Escola sem Partido” (ou a Lei da Mordaça) do pastor Erivelton Santana. E é sobre essa postura de Bolsonaro que levou a Revista Veja a fazer um certo “meia-volta” em tantas coisas absurdas que já veiculou num passado não tão distante.
Essa postura, relativamente revisionista, encontra-se, acima de outras, na matéria “Meia-volta, volver” (Ed. 2.608, n. 46, de 14/11/18).
Sem desconsiderar que haja proselitismo nas escolas, condenando essa prática realmente abominável, Veja, agora, execra o projeto de Santana, dizendo que ele “está voltado para a censura aos professores... No limite, podendo levar muitos deles (professores) para a cadeia”.
Por isso, lembra que “o PISA, exame internacional da OCDE que molda a educação dos melhores, defende para a sala de aula uma visão ampla dos fenômenos históricos e científicos e do enfrentamento do contraditório. Ou seja: ensinam-se motosserra e Greenpeace, Karl Marx e Adam Smith...”
Que bom! Enfim, Veja e outras mídias entenderam o óbvio.
Parece que o fantasma da censura está inquietando também quase toda a mídia brasileira. Seja como for, em tempo de tantos retrocessos, essa preocupação é fundamental para a sociedade como um todo.