****
Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
****
Roberto Boaventura da Silva Sá
Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP
O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.
Em cada artigo que escrevo, sempre busco encontrar algum enunciado que tente sintetizar a totalidade do ponto de vista que estou ali defendendo.
Nesse sentido, aproveitando-me do enunciado de um outdoor em que li, há algum tempo, que era bom “já ir se acostumando” à imposição do nome de Jair Bolsonaro à presidência, meu artigo anterior (“Das chamas às facadas”), contrapondo-se a isso, foi finalizado com a seguinte reflexão:
“Não é bom ninguém “já ir se acostumando” com a violência. Ela não cabe nem mesmo àqueles que defendem pontos de vista e práticas inimagináveis em sociedades do século XXI, como, p. ex., o porte de armas”.
Portanto, condenei o ataque a Bolsonaro. Da mesma forma, condenei, pois abomino, os seus discursos de tons odiosos contra as minorias sociais (quilombolas, indígenas, gays et alii), bem como seus vieses racistas e sexistas.
Com tais condenações, não pressupus fazer defesa de nenhum candidato das esquerdas, tampouco do lulopetismo, que se constitui, hoje, no outro lado da produção de discursos do ódio entre patrícios. Para piorar, o lulopetismo ainda lança mão de um insustentável discurso de vítimas políticas de seus quadros.
Mesmo assim, a reação de diversos (e)leitores bolsonaritas foi agressiva. Previsível.
Um dos leitores disse que “até entendia que alguns não tivessem coragem para poder se defender em pé de igualdade com bandidos covardes e armados, mas quererem que todos se comportassem assim era pedir demais...”
Outro relatou sua experiência sob a “mira de uma arma”; por isso, considera que o discurso "Dialogo sim, Armas não" – defendido por mim – é tão míope quanto ineficaz.
O terceiro foi mais incisivo. Pior: ele pode estar reproduzindo o pensamento de muitos, ao indagar e logo responder:
“Combateremos a violência com flores e discursos? Palavras ao vento. É preciso pulso forte e enfrentar a criminalidade sem direitos dos manos. Bolsonaro sofreu violência”.
Diante desse antagonismo de pontos de vista que estamos a viver, lembrei-me do antigo provérbio romano “Si vis pacem, para bellum”; algo como “se queres a paz, prepara-te para a guerra”. Seu autor teria sido Publius Flavius Vegetius Renatus, nascido no séc. IV.
Bem depois, o enunciado latino serviu ao fabricante alemão de armas Deustche Waffen und Munitionsfabriken (DWM) para designar a sua pistola Parabellum.
Em Madrid, o mesmo enunciado pode ser lido na entrada de um Centro Cultural do Exército espanhol.
Para o contraponto disso tudo, fui buscar alguns ensinamentos de Mahatma Gandhi, o idealizador e fundador do estado moderno indiano e o maior defensor do Satyagraha, ou seja, do princípio da não agressão, da forma não-violenta de protesto, como um meio de revolução.
O princípio referenciado acima, frequentemente traduzido como "o caminho da verdade" ou "a busca da verdade", também inspirou gerações de ativistas democráticos e antirracistas, como Luther King e Mandela.
Para Gandhi, “não existe um caminho para a paz. A paz é o caminho; e por ser tão completo, tão pleno, em si mesmo, é o mais difícil”.
Ainda dizia que “as pequenas boas coisas parecem não ser nada, mas elas trazem a paz. Assim são as flores do campo que acreditamos não terem perfume, mas que, juntas, perfumam...”.
Sem medo da pieguice, a chegada da primavera, com o império das flores, bem que podia nos ajudar a compreender que sem a paz social nunca alcançaremos a segurança desejada por todos.
Diante das iniquidades, as armas serão sempre insuficientes. Simples assim.