As categorias da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) se uniram para realizar, em 2024, mais uma edição da Semana dos Servidores, em alusão à data comemorada no dia 28/10. As atividades, organizadas pela Associação dos Docentes (Adufmat-Ssind) e Sindicato dos Servidores Técnicos-administrativos (Sintuf-MT) começaram na quarta-feira, 30/10, em Cuiabá, com debates sobre temas de interesse de todos aqueles que se dedicam ao cotidiano da instituição, como democracia interna, violências institucionais e aposentadoria, além de apresentações culturais do coral dos aposentados.
Na sexta-feira, 01/11, houve, ainda em Cuiabá, e espaço de confraternização “boteco dos servidores”, a partir das 18h, na sede do Sintuf-MT. De acordo com a organização, o espaço ofereceu comidas típicas de boteco, bebidas e monitorias recreativas para as crianças.
Também na sexta-feira, pela manhã, mas em Sinop, servidores e docentes tiveram duas mesas de debates, a primeira sobre democracia universitária e o papel do servidor público, e a segunda sobre violência institucional.
Ainda este mês, nos dias 09 e 10/11, serão realizados os aguardados jogos dos servidores, com diversas modalidades coletivas e individuais, como futsal masculino e feminino, voleibol misto, vôlei de areia, queimada, tênis de mesa, bozó, xadrez e truco. As inscrições estão abertas e vão até o dia 07/11 (se inscreva aqui).
Primeiro dia do evento foi realizado na sede do Sintuf-MT e o segundo na sede da Adufmat-Ssind
Debates
No cotidiano de docentes e técnicos, para o bem estar e melhoria das condições e relações diárias - tão essenciais para o não adoecimento no trabalho -, importa, também, conhecer e estar bem informado sobre determinados temas. Alguns deles foram abordados nesta edição da Semana do Servidor.
Democracia na universidade e o papel dos servidores foi o debate que abriu as atividades da semana. Em Cuiabá, participaram da mesa a técnica administrativa Marilin Castro (Sintuf-MT), a docente Patrícia da Silva (Adufmat-Ssind) e a pró-reitora de Gestão de Pessoas, Leia de Oliveira.
Em sua intervenção, Marilin Castro destacou algumas lutas da categoria dos técnicos-administrativos, como a paridade na escolha para a Reitoria, entre outros espaços de debate e decisão, além do reconhecimento de que a categoria também deve ter a possibilidade de chegar à Reitoria.
"Por que uma categoria pode e outra não? Democracia acontece quando existe igualdade entre todos, o mesmo poder de decisão de docentes, técnicos e estudantes. O regramento interno na UFMT deve registrar que qualquer escolha se dê de forma paritária. E há vários problemas nos processos eleitorais dentro da universidade atualmente. Por isso, essa é a bandeira número um da nossa categoria com relação à democracia interna”, afirmou.
Para Leia de Oliveira, representante da administração da universidade, a luta pela democracia no Brasil, travada durante a ditadura militar, se confunde com a luta pela paridade nas universidades, que ocorreu na mesma época. “A UFMT foi a primeira a eleger reitor de forma direta e a primeira a adotar a paridade”, lembrou.
Representando a Adufmat-Ssind, a professora Patrícia da Silva, que é vinculada ao Departamento de Sociologia e Ciência Política, iniciou sua fala situando o conceito de democracia e lembrou que, em nome dela, já se praticaram atrocidades pelo mundo.
“É um termo complexo, que não encontra consenso nem dentro da academia, e que em seu nome já se praticaram atrocidades pelo mundo. Por isso, além de discutir o que é a democracia, nós também pensamos o que deveria ser a democracia, se existe, de fato, democracia, e quais são os seus limites”, explicou.
Apesar de não haver consenso sobre o conceito, existe a compreensão de que democracia pressupõe oportunidades e condições de participação política. Nesse sentido, enquanto servidores públicos que trabalham por uma educação democrática e emancipadora, a construção de uma universidade não só pública, mas popular, na qual a população esteja presente em todos os espaços, se torna um objetivo.
“Nós devemos pensar como a universidade pode contribuir com uma educação voltada para a garantia de justiça, porque algumas produções acabaram ficando circunscritas a grupos, vinculadas a setores que nem sempre se preocupam em trazer benefícios para a população de modo geral”, destacou.
A transparência dos processos também foi um ponto essencial destacado por Silva, seja dos processos de seleção e distribuição de bolsas, seja dos processos democráticos internos. A professora destacou, ainda, que todos concordam com a paridade entre as categorias, e que é preciso ampliar, ainda, as possibilidades de participação política dos trabalhadores terceirizados, que enfrentam dificuldades de organização maiores por medo de demissão.
Violências institucionais
A segunda mesa de debates do primeiro dia da Semana do Servidor teve o tema “violência institucional”. A professora do Departamento de Psicologia, Maria Aparecida Campos, foi a primeira a falar. Ela explicou que a violência institucional abrange assédio moral, sexual, e toda conduta abusiva que se repita de forma sistemática, atingindo a dignidade ou a integridade física ou psíquica do trabalhador.
Segundo a docente, há formas explícitas e outras veladas de violência, nas quais a vítima pode ter dificuldades de perceber se está, de fato, sofrendo assédio. “A vítima pode ficar em dúvida. Mas é preciso pensar, por exemplo, até onde um elogio faz bem a auto estima, ou se ele gera constrangimento”, avaliou.
Campos ressaltou, ainda, que o trabalho é de extrema importância para a construção da identidade de qualquer pessoa, pois esse processo depende, também, das relações; eis, então, a importância de combater condutas assediosas: elas interferem neste percurso.
Alguns sinais de que algo pode estar errado são, poe exemplo, não poder se expressar, sentir que está sendo “deixado de lado”, começar a pensar nos motivos que o fizeram ser escanteado ou mesmo ter vontade de se isolar.
A docente também observou que há assédio vertical e horizontal, que denúncias precisam de provas (que as vítimas devem ir juntando, como eventuais mensagens ou coisas do tipo) e que é preciso prevenção no ambiente de trabalho, por meio de promoções de pensamentos que estimulem mais companheirismo, respeito e diálogo sobre o trabalho.
“Trabalho tem que ser fonte de saúde mental, e não de adoecimento. Devemos prestar atenção naquilo que fazemos, para não assediar; prestar atenção no que estamos vivenciando, para não sofrermos assédio; e também devemos cuidar uns dos outros, coletivamente, para alertar nossos colegas. Nós vivemos um período de extrema individualização, mas nós não somos concorrentes. Há todo um sistema que estimula a rivalização, e nós precisamos quebrar essa lógica”, concluiu.
Representando a Adufmat-Ssind, a professora Clarianna Silva iniciou sua intervenção declamando um poema de sua autoria. “Vou lhe explicar, preste atenção! A violência institucional ou praticada pela instituição se dá pela negação à justiça ou reparação, tratamento desigual ou discriminação, omissão ou negligência, por falta de protocolos, política institucional de enfrentamento, canais de denúncia que funcionem com eficiência reafirmando aos abusadores sua intangibilidade por falta de jurisprudência. É uma pouca vergonha essa omissão por conveniência, e a coitada da vítima, esgotada, adoecida e injustiçada, de tanta dor, acaba do mundo desacreditada, porque pelo abusador foi violentada, pela instituição, revitimizada e, pelos pares, julgada”, diz um trecho do texto (leia a íntegra aqui).
Em seguida, a diretora do sindicado falou sobre a proposta de minuta de prevenção ao assédio que está sendo elaborada em conjunto pela comunidade acadêmica, ressaltando que, em caso de violência doméstica, o afastamento imediato é um direito legal que a instituição precisa reconhecer formalmente. Essa será uma demanda a parte a ser apresentada à Reitoria após a revisão do documento pela Assessoria Jurídica da Adufmat-Ssind. Por fim, a docente conclamou os presentes e toda a universidade a participarem do debate. “Ficar calada não resolve nada, não nos ajuda”, pontuou.
Por fim, pela UFMT, a pró-reitora de Administração, Marilda Santos, afirmou que a nova gestão terá tolerância zero para qualquer tipo de assédio, que há canais oficiais para receber denúncias na Ouvidoria, Gestão de Pessoas, além das próprias entidades (sindicatos e DCE). Segundo a pró-reitora, a administração tem a respeitabilidade como fonte e ponte de ações. “Nosso mote é respeito aos servidores, aos alunos, aos seres humanos. Nossa proposta é desatar nós e construir laços”, afirmou.
Saúde e Seguridade Social
No segundo dia de debates, os temas foram Saúde e Seguridade Social. A professora Lisiane de Jesus, pró-reitora de Cultura, Extensão e Vivência iniciou a mesa enaltecendo o trabalho dos servidores. “O servidor público está sempre a serviço de alguém; nós estamos a serviço da Educação”, ressaltou.
Em seguida, o professor Einsten Aguiar, representando a Adufmat-Ssind, fez informes sobre os debates realizados pelo Andes-Sindicato Nacional e pela própria Adufmat-Ssind, por meio do Grupo de Trabalho Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA), acerca de temas como Funpresp, as enquetes para levantar informações e demandas com relação à saúde dos trabalhadores na ativa e aposentados, entre outros.
Após um relato emocionante sobre sua trajetória de saúde, ao enfrentar a Chikungunya e, em decorrência dela, um AVC, o professor concluiu sua participação na mesa revelando que, em suas palavras, “ao envelhecer”, teve vontade de começar a escrever, e declamou uma ode ao dia dos servidores públicos, retratando-os como homens e mulheres incansáveis, dedicados e leais.
A convidada Vera Lúcia dos Anjos, representando a Secretaria de Estado de Saúde (SES/MT), falou sobre os princípios doutrinários e organizativos do Sistema Único de Saúde (SUS), atenção primária, secundária e terciária, descentralização, hierarquia, e também sobre o principal desafio do SUS atualmente: obter recursos.
A servidora, que é assistente social, falou ainda sobre políticas disponíveis, incluindo terapias, todas reconhecidas pelo SUS, e sobre o trabalho do consultório de rua, das equipes de saúde da família, dos públicos em maior vulnerabilidade atualmente. Por fim, disponibilizou listas com contatos de todas as unidades de saúde em Cuiabá, divididas por regionais.
Também assistente social e servidora, a convidada Aparecida de Castro Soares, servidora do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) falou da importância de manter atualizados os dados do Sistema Sougov, que atualmente dá acesso a vários serviços. Exatamente por isso, ressaltou a servidora, ao mesmo tempo que é importante manter o canal atualizado, é necessário proteger as senhas e nunca compartilhá-las com pessoas desconhecidas.
O recado serve para aposentados e aposentáveis, já que as atualizações prévias do cadastro no INSS servem para facilitar a vida da pessoa quando ela completa a idade e tempo de contribuição para aposentar, pois todos os vínculos e remunerações estarão à disposição do sistema, conforme a legislação prevê. Segundo a servidora, as entidades sindicais também podem ser parceiras nesse sentido, montando equipes para realizar as atualizações junto aos sindicalizados.
Ao se despedir, Soares explicou que a greve no INSS, ainda em curso, é uma tentativa dos servidores de requerer concurso público e outras melhorias para o atendimento à população.
O professor Aldi Nestor de Souza, membro do Grupo de Trabalho Política e Formação Sindical da Adufmat-Ssind (GTPFS) utilizou dados históricos para sustentar sua intervenção política. “Fiquei refletindo sobre o que falar para trabalhadores de um momento importante de suas vidas, em que fica mais difícil trabalhar: a aposentadoria. Por isso vou retomar esse processo histórico. Lembrar da década entre 1978 a 1988, uma década de greves históricas, movimentos da classe, se movendo e definindo qual era a pauta. Uma década em que foram criados partidos, centrais sindicais, movimentos sociais. Uma década em que foi gestada uma constituição. O Andes-Sindicato Nacional nasce nesta década, subvertendo a ordem presente, decide, fora da lei, que vai ser um sindicato de base, classista”, relatou.
Nesta época, contou o docente, também nasceu o pacto da seguridade social, forjado na luta dos trabalhadores. “Este pacto é uma das coisas mais importantes e belas construídas neste país”, ressaltou, destacando que o pacto da Seguridade envolve Assistência Social, Saúde e Previdência.
Legalmente, para que o pacto da Seguridade saísse do papel, foi preciso estabelecer de forma clara qual seria o leque de instrumentos e fontes de recursos para viabilizá-lo. E assim foi feito. Até os dias atuais, apesar de todos os ataques já sofridos pelas mãos dos governos neoliberais, o pacto da Seguridade é não só viável, como superavitário. Assim entendem os cientistas que analisam toda a estrutura, e não apenas o recorte da Previdência – que atende apenas aos interesses daqueles que desejam justificar o estrangulamento do direito e a venda de planos de previdência privados.
“Uma das ferramentas do neoliberalismo é a privatização. A Previdência é apenas um exemplo de um direito que está no caminho dessas privatizações. E há mecanismos de convencimento pra isso, o primeiro deles é do déficit, convencer a população de que, se não fizer a reforma, a Previdência quebra. A burguesia tem esses estudiosos, que fazem chantagem sem nenhum pudor, utilizando dados estatísticos para justificar esse argumento. Mas há controvérsias. A CPI do Senado, de 2017, comprova que não há déficit quando a previdência é avaliada no conjunto da seguridade social; pelo contrário, ela é superavitária. Nós temos outros estudos, um deles de Rivânia Moura, ex-presidente do Andes, demonstrando que a previdência é sustentável, e há outros. É falso o argumento de que a Previdência está quebrada”, sustentou o docente.
Em seguida o professor falou sobre os prejuízos aos trabalhadores a partir das reformas da Previdência tocadas pelos governos Lula, Dilma e Bolsonaro, e concluiu que esses prejuízos só poderão ser desfeitos da forma como a Previdência foi feita: por meio da luta social. “A luta é a recuperação da seguridade decente, sem perdoar nenhum desses traidores. A luta é voltar a pautar o debate político”, finalizou.
Para o advogado Bruno Boaventura, Nestor tem razão. “Direito não é algo que cai do céu, não é presente de Deus; direitos são conquistados”, pontuou, logo de início, concordando que as contrarreformas foram ataques frontais ao direito à aposentadoria. Em suas palavras, foram “tragédias humanas”, particularmente com relação às alterações relacionadas à pensão por morte. “Nós [advogados] percebemos o desespero das pessoas neste momento, nos olhos, nas lágrimas. Num dia você conta com um recurso, no outro não conta mais”, lamentou, explicando, em seguida, algumas mudanças nefastas das regras de cálculo, que, a grosso modo, serviram para reduzir os valores recebidos por aposentados e pensionistas.
Não fosse o suficiente, o advogado relatou outro crime: o chamado "confisco", que é a alegação de que alguns pensionistas teriam recebido a mais do recurso que foi reduzido desde 2019; assim, teriam de devolvê-lo. A questão ainda está em debate, mas já causa revolta. Segundo Boaventura, juristas esperam que essa investida seja considerada inconstitucional já nos próximos dias.
O convidado encerrou sua intervenção motivando a organização e a luta. “O coral do início das atividades demonstra o poder do coletivo. Vocês viram como a entonação foi muito mais bonita, muito mais forte, e muito mais capaz de nos tocar. O sindicato é o nosso coral, ele faz coro às nossas reivindicações. Revogar as contrarreformas da Previdência deve ser a pauta de todos nós”, concluiu.
Representando a administração da universidade, a pró-reitora de Gestão de Pessoas, Leia de Souza, acrescentou que, para revogar as contrarreformas, é preciso envolver, nas lutas, também os jovens, levando em consideração, inclusive, que há diferenças nas regras para servidores que ingressaram antes de 2003 – que devem aposentar com todos os direitos; entre 2023 e 2013 – que devem se aposentar com a média; e após 2013 – com a influência da criação do Funpresp. “Os jovens, que um dia chegarão ao momento da aposentadoria, precisam se filiar, participar dos sindicatos, e entender que, para além das pautas salariais, nós precisamos também pautar a revogação das reformas. Assunto de aposentadoria não é apenas para aposentados”, afirmou.
Segundo a pró-reitora, a atual administração da universidade tem uma política de inclusão e reconhecimento dos servidores aposentados. “Nós também pretendemos qualificar essa diferença e mobilizar. Este é um desafio que a esta gestão quer enfrentar. O aposentado também pode participar mais da vida da universidade, não é só votar para a Reitoria. Nós sabemos que temos conflitos geracionais, etarismo - que também é violência institucional, e vamos enfrentar todos esses desafios”, disse a servidora.
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind