Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu admitir o recurso do povo Guarani Kaiowá e analisar a ação rescisória, movida pelos indígenas, que busca reverter a anulação da demarcação da Terra Indígena (TI) Guyraroka, no Mato Grosso do Sul. A decisão se deu em julgamento virtual, iniciado no dia 26 de março e encerrado nessa quarta-feira (7). Os onze ministros da Corte votaram a favor da demanda da comunidade.
O caso da TI Guyraroka é simbólico na luta dos povos indígenas em defesa do direito de acesso à Justiça e contra a tese do marco temporal. Sua demarcação foi anulada pela Segunda Turma do STF em 2014, com base na tese do marco temporal e sem que a comunidade participasse do processo. Os indígenas tentaram diversas vezes recorrer da decisão, sem sucesso, e o caso transitou em julgado em meados de 2016.
Por esse motivo, em 2018, a comunidade ingressou com a atual ação rescisória, buscando reverter a decisão devido aos graves erros e violações cometidas. Ainda naquele ano, a rescisória foi negada pelo relator, o ministro Luiz Fux – que, no jargão jurídico, “não conheceu” a ação, ou seja, sequer abriu processo para analisá-la no mérito. A comunidade recorreu, apoiada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Foi esse recurso que, agora, recebeu decisão favorável da Suprema Corte. Inicialmente, Fux havia se manifestado contrariamente ao recurso, no que foi acompanhado pela ministra Carmen Lucia. Ainda em 2018, o julgamento foi suspenso, após pedido de vistas do ministro Edson Fachin. Retornou agora, em março de 2021, com voto favorável do ministro.
Após o voto-vista de Fachin, o relator, Luiz Fux, reviu sua posição e votou a favor da comunidade. Foi acompanhado por todos os demais ministros e ministras, fechando um placar de onze a zero em favor da demanda Guarani Kaiowá.
“O processo que anulou a demarcação já transitou em julgado, ou seja, já acabou. O que está em jogo agora é essa outra ação, rescisória, cujo objetivo é anular aquele outro processo”, explica Rafael Modesto dos Santos, assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário – Cimi e um dos advogados da comunidade de Guyraroka.
“Se a comunidade ganhar essa ação, aí sim, tudo volta à estaca zero: a portaria declaratória de Guyraroka volta a ser validada, e tanto o processo quanto a decisão que anularam a demarcação se tornam nulos”, sintetiza Rafael.
Com a decisão desta semana, o julgamento do mérito da ação rescisória iniciará, com a participação da comunidade da TI Guyraroka, e tem chances reais de reverter a anulação da terra indígena – uma luta não só das 26 famílias que vivem nela, mas de todo o povo Guarani e Kaiowá.
“Essa decisão favorável é um passo muito importante para nós, mas sabemos que vem mais coisas por aí e estamos prontos e com a expectativa de fazer parte desse processo”, comemora Erileide Domingues, jovem liderança Guarani Kaiowá do tekoha Guyraroka.
Próximos passos
Agora, o julgamento da rescisória deve iniciar formalmente, com a citação dos réus e a abertura de prazo para as manifestações das partes. Para o assessor jurídico do Cimi, o julgamento já parte de uma perspectiva positiva para os Guarani Kaiowá.
“A falta de citação da comunidade justificou a decisão de admitir a ação rescisória. Essa é a mesma questão que está no mérito do processo”, afirma Modesto.
Outro argumento elencado pela defesa dos Guarani Kaiowá é a aplicação indevida da tese do marco temporal na decisão que anulou a TI Guyraroka – ignorando o laudo antropológico da Fundação Nacional do Índio (Funai), que detalhava a presença dos indígenas no território, inclusive na década de 1980, e o processo de violência e expulsões que atingiu a comunidade.
“Imaginamos que esses próximos passos serão rápidos, porque não haverá provas a produzir. Nossas provas já estão pré-estabelecidas, que são o laudo antropológico e a falta de citação”, analisa o assessor.
Tutela e erro de fato
Em seu voto, o ministro Edson Fachin destaca que a negação do ingresso da comunidade indígena no processo que anulou a demarcação da TI Guyraroka pode ter violado o Código de Processo Civil e afrontado diretamente o artigo 232 da Constituição Federal, “pois representou negativa de acesso à justiça aos índios”.
A Funai, “no ordenamento constitucional vigente, não detém mais nenhuma tutela sobre os índios”, salienta Fachin. Além disso, o ministro destaca que o próprio STF já definiu, no caso Raposa Serra do Sol, que o marco temporal e as demais condicionantes daquele julgamento “não se aplicavam imediatamente, com eficácia vinculante, às demais demarcações de terras indígenas pelo País”.
Em seu novo voto, o relator Luiz Fux também reconhece que a desconsideração de fatos e documentos apresentados na ação inicial pode ter configurado “eventual erro de fato verificável do exame dos autos”.
Caso simbólico
O caso da TI Guyraroka é considerado um caso simbólico devido ao conjunto de violações aos direitos indígenas que reúne – tendo sido, inclusive, levado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que emitiu medidas cautelares em favor da comunidade, após visita de uma comitiva à Terra Indígena, em 2018.
Além da negação de acesso à Justiça e da aplicação da tese do marco temporal, considerada inconstitucional, as famílias do tekoha Guyraroka vivem em apenas 55 dos 11,4 mil hectares identificados como parte de sua terra tradicional e sofrem com ameaças e os agrotóxicos aplicados nas lavouras que cercam a aldeia e já causaram a intoxicação de adultos, crianças e idosos.
Para Luís Eloy Terena, assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e também advogado da comunidade na ação, o caso de Guyraroka reflete uma realidade enfrentada por muitos povos indígenas em todo o país.
“Guyraroka é um caso clássico do que as comunidades indígenas enfrentam por todo o país, qual seja, a dificuldade de ter acesso à Justiça. Vários processos estão tramitando e decisões sendo tomadas sem ouvir os maiores interessados, justamente as pessoas que vão arcar com o peso de eventual decisão judicial”, destaca Eloy.
O julgamento da ação sobre a TI Guyraroka está diretamente relacionado com o caso de repercussão geral que tramita no Supremo e que deverá discutir, justamente, questões tratadas no processo sobre a terra dos Guarani Kaiowá – entre elas, a tese do marco temporal, considerada inconstitucional e oposta aos direitos originários garantidos aos povos indígenas pela Constituição Federal.
“O julgamento da TI Guyraroka adquire uma importância grande na atual conjuntura, mas também em relação ao julgamento do recurso extraordinário com repercussão geral que também está no STF”, pondera Antônio Eduardo de Oliveira, secretário executivo do Cimi.
Com a repercussão geral, o julgamento deste recurso extraordinário terá consequências para todos os povos indígenas do país e passará a ser usado como uma referência para os futuros julgamentos.
“Nós nos alegramos com o resultado desse julgamento, porque sinaliza que os ministros podem vir a ter o mesmo entendimento com relação ao caso de repercussão geral, o que seria uma grande vitória para os povos indígenas no Brasil”, avalia.
Fonte: Assessoria de Comunicação do Cimi
A Câmara dos Deputados concluiu nesta quarta-feira (7) a votação do Projeto de Lei 948/2021, que permite à iniciativa privada comprar vacinas contra a Covid-19, furando a fila do Plano Nacional de Vacinação, para a imunização de seus empregados. Para o ANDES-SN, a proposta é imoral e inconstitucional e, ainda, enfraquece a Anvisa e o Plano Nacional de Imunização.
“A proposta de venda de vacinas para empresas privadas, com o discurso de imunizar seus trabalhadores é inaceitável. Ela tira do governo federal a responsabilidade constitucional de garantir e providenciar, por meio do SUS, a imunização de toda a população. Isso não foi feito até o momento porque o governo não providenciou a compra das vacinas em tempo hábil. O SUS tem condições de imunizar milhões de pessoas por dia. Esse projeto também revela um ataque frontal à Anvisa, porque autoriza a compra de vacinas que não passaram pela aprovação da agência”, destaca Rivânia Moura, presidenta do ANDES-SN.
De acordo com o texto aprovado, além de poder comprar vacinas contra a Covid-19 que tenham registro sanitário definitivo concedido pela Anvisa, empresas e associações poderão adquirir imunizantes com autorização temporária para uso emergencial ou autorização excepcional e temporária para importação e distribuição.
No entanto, o PL 948/21 permite também que empresas e associações driblem a autoridade da Anvisa, e adquiram imunizantes sem registro ou autorização da agência, desde que tenham aval de qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
O projeto estabelece que as empresas deverão doar 50% das doses adquiridas para o Sistema Único de Saúde. Porém, as doses não aprovadas pela agência reguladora não poderão ser usadas na vacinação gratuita,
promovida pelo SUS. Logo, dificilmente irá contribuir ou acelerar a Campanha de vacinação contra Covid-19 no Brasil.
A presidenta do ANDES-SN ressalta, ainda, que é a Constituição Federal prevê que é atribuição única e exclusiva do Sistema de Saúde brasileiro atestar a segurança e qualidade de medicamentos. Ela lembra os mais de 14 milhões de brasileiros e brasileiras sem emprego e a grande parcela da população em trabalhos informais, que ficarão completamente desassistidos, uma vez que a proposta, se aprovada, deverá ampliar o descaso do governo federal com a imunização de brasileiras e brasileiros.
“Consideramos inaceitável esse projeto. É revoltante o que tem sido feito com a imunização nesse país. Até hoje, só 2,8% da população tomou as duas doses da vacina. É inadmissível um projeto desse teor, que, de fato, vai aprofundar gravemente o processo de desigualdade social, já agravado pela pandemia. Esse projeto vai fazer com que a população mais pobre não tenha de fato acesso à imunização, pois a medida que as empresas comprarem as vacinas, vai se ampliar ainda mais o descaso e desresponsabilização que o governo federal tem tido nesse processo. E isso vai impactar diretamente a população mais pobre, que precisa do SUS”, avalia Rivânia.
Quem poderá comprar e vacinar?
Conforme o texto aprovado pelas deputadas e deputados, as regras se aplicam às pessoas jurídicas de direito privado, individualmente ou em consórcio.
Poderão ser vacinados ainda outros trabalhadores que prestem serviços a elas, inclusive estagiários, autônomos e empregados de empresas de trabalho temporário ou de terceirizadas.
Quanto às pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos (associações ou sindicatos, por exemplo), a permissão vale para seus associados ou cooperados.
A proposta permite que as empresas escolham entre doar integralmente as doses adquiridas para o SUS, o que já estabelece a legislação em vigor, ou aplicar as doses exclusivamente nos seus trabalhadores, de forma gratuita, e doar a mesma quantidade utilizada ao Programa Nacional de Imunização. No entanto, se a empresa adquirir vacinas que não tenham aprovação da Anvisa, as mesas não poderão ser usadas no PNI. Além disso, parcela da população será imunizada com medicamento ainda não aprovado pelo órgão regulador do Sistema de Saúde brasileiro.
“Vacinação é política de pública e precisa ser feita pelo nosso Sistema Único de Saúde. Esse projeto para compra de vacinas por empresas é imoral, é inconstitucional e é revoltante. Não aceitamos. Não podemos aceitar! Vamos continuar com a campanha nacional pela vacinação pública e gratuita para todas e todos, pelo SUS”, afirma a presidenta do ANDES-SN.
Vacinas privadas no mundo
O Brasil é um dos poucos países no mundo onde se discute a possibilidade de vacinação contra a Covid-19 pelo setor privado. Na América Latina, apenas o México aprovou tal medida. A vacina também pode ser comprada por empresas no Paquistão, Tailândia, Filipinas e Malásia. Nem mesmo nos Estados Unidos, onde o Sistema de Saúde não é público nem gratuito, se permitiu, até o momento, a vacinação da população pela iniciativa privada.
Tramitação
O texto aprovado pela Câmara foi o relatório elaborado pela deputada Celina Leão (PP-DF), ao Projeto de Lei 948/21, do deputado Hildo Rocha (MDB-MA). A proposta segue para votação no Senado. Se aprovada, vai à sanção presidencial.
Fonte: ANDES-SN (com informações da Agência Câmara de Notícias e site G1)
****
Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
****
Juliana do Couto Ghisolfi [ii]
Maryanne Galvão [iii]
Nos últimos dias, levantamentos realizados por deputados estaduais[iv], pelo Tribunal de Contas (TCE-MT)[v] e pelo Ministério Público de Contas de Mato Grosso (MPC-MT)[vi] registraram aquilo que a população mato-grossense sabe na prática: a vacinação está lenta.
No caso de Cuiabá, além da lentidão[vii], a vacinação parece ainda mais difícil, pois até o início desta semana, ocorria em um único local – o Centro de Eventos do Pantanal que, diga-se de passagem, fica nas proximidades de bairros centrais e elitizados. Além de centralizada em um só lugar, a vacinação somente é aplicada após agendamento exclusivo pelo site da prefeitura, que com frequência apresenta instabilidade[viii] e pane.
Na semana do dia 30/03/2021 teve início na capital matogrossense a vacinação das faixas etárias entre os 70 aos 74 anos. Acompanhamos uma família na tentativa de agendamento da vacina para um idoso de 74 anos. Em duas ocasiões, no site da prefeitura, existia a disponibilidade de data e horário, entretanto ao clicar para confirmar o horário, o site caía, e não voltava mais. No quarto dia de tentativa, com cinco pessoas tentando simultaneamente, foi possível completar o procedimento e, finalmente, agendar a vacinação.
Questionada em uma rede social – a respeito da aglomeração de idosos, sobre a inconstância do sistema de marcação online – a Prefeitura de Cuiabá afirmou que nossa cidade fora a capital que menos recebeu vacinas.
Na tabela acima, elaborada a partir de dados do Localiza SUS e dados demográficos do IBGE, estão destacados os percentuais da população de cada capital e de cada Unidade Federativa da região Centro Oeste, e o percentual de doses que cada Estado destinou à sua capital. Brasília, obviamente, fica com 100% das doses encaminhadas pelo Ministério da Saúde. Campo Grande, que possui cerca de 33% da população de Mato Grosso do Sul, recebeu aproximadamente o mesmo percentual de vacinas. Da mesma forma, Cuiabá representa 17% da população de MT, e recebeu 19% das vacinas que chegaram a MT. A exceção é Goiânia, que possui 21% da população do estado, mas recebeu 51% das doses destinadas a Goiás.
Se Campo Grande e Cuiabá receberam percentual de vacinas equivalentes ao percentual da sua população no Estado, o que explicaria a discrepância dos desempenhos das duas capitais em suas campanhas de vacinação? Ao compararmos as duas capitais, surgem muitas questões a respeito da vacinação contra a COVID-19 em Cuiabá.
Para começar, ao contrário de Cuiabá, Campo Grande conta com uma campanha de vacinação descentralizada: as vacinas são aplicadas em mais de 30 locais, nos diferentes bairros da cidade. O morador vai até a unidade mais próxima de sua casa, na época de vacinação de sua faixa etária, e recebe a vacina, sem maiores burocracias. Além de facilitar e diversificar o acesso, a vacinação feita nos bairros permite acompanhar o avanço da aplicação das doses em cada região da cidade.
Após o Ministério Público de Mato Grosso (MPE-MT)[ix] ingressar com ação civil pública exigindo que a Prefeitura de Cuiabá abra mais polos de vacinação em Cuiabá, especialmente com as últimas doses recebidas do Ministério da Saúde no dia 01 de abril (113 mil doses), o prefeito Emanuel Pinheiro anunciou ontem a abertura de dois novos locais[x] de vacinação.
Hoje, 06/04, a prefeitura anunciou mudanças no sistema de agendamento: ao fazer o cadastro do usuário, a data e o horário da vacinação serão feitos a partir de uma “‘fila de espera virtual’ e o agendamento é gerado automaticamente de acordo com a ordem cronológica de cadastro no site e com a quantidade de vagas disponibilizadas por dia”.[xi].
Ou seja, foi preciso que instituições como o Ministério Público e deputados questionassem para que algumas mudanças fossem adotadas. Esperamos que as mudanças anunciadas não sejam no estilo “mudar para continuar igual”[xii]
Ainda assim, restam dúvidas que merecem esclarecimento:
- Por que Cuiabá optou por vacinar em um único local até agora?
- Por que não descentralizar mais os polos de vacinação, com um ponto por bairro, por exemplo?
- Por que a exigência do agendamento exclusivamente pelo site? Poderia ser uma opção, para agilizar o atendimento, mas não um empecilho para a vacinação de quem não consegue fazer o agendamento. Agora é esperar que o novo sistema não apresente falhas, e, ainda mais importante, que haja transparência na “fila virtual” anunciada.
- Nas condições em que vinham ocorrendo as vacinações até o começo desta semana, foi feito um acompanhamento de quantos idosos de cada região da cidade estão sendo vacinados? Quem são os idosos que estão recebendo as vacinas em Cuiabá? De quais regiões e bairros?
- Qual o perfil socioeconômico da população vacinada?
- Os idosos de famílias sem acesso à internet estavam conseguindo agendar a vacinação e comparecer ao distante Centro de Eventos do Pantanal?
As duas últimas questões estão intrinsicamente ligadas, pois se levarmos em consideração que muitas pessoas não possuem acesso à internet banda larga e que muitos bairros populosos, da região periférica da cidade, ficam bastante distantes do único ponto de vacinação, no Centro de Eventos do Pantanal – como o bairro Pedra 90, um dos mais populosos de Cuiabá, que fica a 21 km de distância, 42 km para ir e voltar – é possível que idosos dos bairros mais distantes e carentes não estejam recebendo a vacina a que teriam direito e acesso, se a vacinação ocorresse nas UBS, por exemplo.
Várzea Grande, cidade que integra a região metropolitana de Cuiabá, recebeu 37.591 doses de vacinas, ou seja, 6,7% da quantidade recebida pelo Estado de Mato Grosso. A cidade conta com dois pontos[xiii] de vacinação, e pretende ampliar para cinco pontos na medida em que for decrescendo a faixa etária do público alvo. Juntas, Cuiabá e Várzea Grande receberam aproximadamente 25% das doses que chegaram a MT.
O certo é que tanto o prefeito Emanuel Pinheiro (MDB) quanto o governador Mauro Mendes (DEM) não perdem oportunidade pra rivalizar entre si, e isso, temos certeza, não ajuda na dinâmica de buscar acesso às vacinas e muito menos na criação de um plano municipal ou estadual efetivo de gestão de crise e de vacinação. Os mandatários deveriam parar de pensar em eleições e agir. Enquanto isso, Mato Grosso bateu mais um triste recorde de perdas em 24 horas para a pandemia: de domingo (04/04/2021) para segunda, foram 128 mortos.
Todos aguardamos por respostas e, principalmente, pela vacinação em massa, e em locais acessíveis a toda a população, de todas as regiões das cidades. Por enquanto, ainda temos o direito ao acesso universal. No entanto, a realidade é que as vacinas estão escassas, mesmo para os grupos prioritários.
Fontes:
IBGE - População Centro-Oeste por faixa etária. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/5918#resultado Acesso em: 03/04/2021.
SUS - Localiza SUS. Disponível em: https://localizasus.saude.gov.br/ Acesso em: 03/04/2021.
[i] Este artigo faz parte de SANTANA, Luciana (org). Série especial ABCP: Os governos estaduais e as ações de enfrentamento à pandemia no Brasil. Site Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP.
[ii] Doutora em Ciência Política; Professora do Departamento de Sociologia e Ciência Política/ UFMT.
[iii] Socióloga, Pós Doutoranda do Programa Pós Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Piauí.
[iv] https://www.gazetadigital.com.br/editorias/politica-de-mt/estudo-mostra-que-quase-40-das-vacinas-recebidas-em-mt-ainda-no-foram-aplicadas/649186
[v] https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noticia/2021/04/01/tce-mt-aponta-baixa-aplicacao-da-vacina-contra-a-covid-19-em-64-municipios-e-pede-aceleracao.ghtml
[vi]https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noticia/2021/03/31/mp-aponta-divergencia-entre-doses-distribuidas-e-aplicadas-e-questiona-governo-e-municipios-de-mt.ghtml
[vii] Apesar da lentidão na vacinação, Cuiabá foi uma das 7 cidades em que a prefeitura (MDB) suspendeu a vacinação durante a sexta feira santa (02/04). https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2021/04/02/brasileiros-nao-puderam-se-vacinar-em-pelo-menos-11-capitais-nesta-sexta-feira-2.ghtml
[viii] Prefeitos de 141 municípios do interior do Estado, pressionados pelo governador Mauro Mendes quanto à lentidão e transparência dos dados da vacinação, divulgaram nota declarando instabilidade no sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SIPNI), que ficaria horas sem funcionar, comprometendo os registros de doses extramuros em até 48 horas, além de falta de acesso à internet em regiões rurais e as chuvas, e falta de servidores. https://www.midianews.com.br/politica/prefeitos-atribuem-atraso-a-sistema-instavel-e-equipes-reduzidas/396364
[ix] https://www.gazetadigital.com.br/editorias/judiciario/mp-aciona-justia-para-descentralizar-vacinao-em-cuiab/649763
[x] https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noticia/2021/04/05/ufmt-e-sesi-papa-serao-novos-pontos-de-vacinacao-contra-a-covid-19-em-cuiaba-no-modelo-drive-thru.ghtml
[xi] https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noticia/2021/04/06/agendamento-da-vacina-contra-covid-19-em-cuiaba-sera-feito-de-forma-automatica.ghtml
[xii] Referência à obra de Tomasi di Lampedusa, Il Gattopardo (O Leopardo), que narra a decadência da aristocracia italiana. Em determinado momento, Tancredi, sobrinho do Príncipe Don Fabrizio, afirma que é preciso que tudo mude, para tudo permanecer como está.
[xiii] http://www.varzeagrande.mt.gov.br/conteudo/18882/nesta-quinta-feira-a-vacinacao-ocorreu-na-clinica-medica-do-univag-e-atraves-de-drive-thru-prefeito-voltou-a-cobrar-autoridades-federais-para-liberar-mais-vacinas
Clique no arquivo anexo abaixo para visualizar o documento.
Entidades do movimento educacional brasileiro realizaram, na tarde de quarta-feira (31), a Plenária Nacional em Defesa da Educação Pública. O encontro foi aberto para todas e todos e foi transmito nas redes sociais das entidades, dentre elas, o ANDES-SN.
O Sindicato Nacional é uma das 27 organizações que integraram esse ciclo de debates, que teve como objetivo organizar uma importante unidade de ação para derrotar o governo de Jair Bolsonaro e sua política de ataques è educação pública e de genocídio da população brasileira.
A assembleia foi dividida em blocos. O primeiro contou com a participação das entidades nacionais da Educação, que construíram a plenária. Rivânia Moura, presidenta do ANDES-SN, ressaltou a importância da plenária ocorrer às vésperas do Golpe Militar de 1964.
“É um dia importante para demonstrarmos todo o repúdio a qualquer manifestação e reverência à ditadura empresarial-militar. Vivenciamos nesse último período fortes ataques às liberdades democráticas, muitas tentativas de silenciamento contra as vozes que ousam criticar esse governo. Precisamos lutar para sobreviver enquanto educação pública, contra os cortes orçamentários, contra a perseguição, a censura, as intervenções feitas às universidades e institutos, que já atingem mais de 20 instituições. Esse governo tem tratado a educação pública como alvo principal dos seus ataques”, disse.
Em seguida foi aberto o bloco para as entidades internacionais da Educação que, na ocasião, compartilharam as lutas das e dos trabalhadores da América Latina nesse último ano, e que sofreram com os impactos da pandemia da Covid-19, aumentando as desigualdades econômica, política e social. Para as e os palestrantes, durante a pandemia ocorreu uma expansão do neoliberalismo educativo, com o crescimento brutal de empresas privadas do setor da educação, informática e comunicação, enquanto estudantes foram excluídos deste processo. Para elas e eles, a realidade do Brasil não é diferente dos países vizinhos e a plenária é importante para a construção de uma unidade política contra Bolsonaro e o neoliberalismo.
O terceiro bloco foi formado por centrais sindicais, frentes e fóruns nacionais que reafirmaram a luta pela vida de todos e todas com vacinação gratuita em massa e imediata. Nas falas das e dos representantes, mesmo com a vacinação, é preciso manter as medidas de isolamento social, a defesa de um auxílio emergencial que contemple as necessidades da população, e lutar pela saída de Bolsonaro e Mourão do governo.
Entidades de base, como fóruns regionais, movimentos estudantis e seções sindicais, formaram o quarto bloco. As e os representantes das entidades citaram a importância da luta, resistência e de ter esperança para mudar o cenário do país. A recente mobilização “Vida, Pão, Vacina e Educação”, e pelo Fora Bolsonaro, feita nas ruas e redes, organizada por entidades estudantis, foi relembrada, além de outras mobilizações realizadas desde o ano passado em defesa da vida, da educação, da democracia e do Estado de Direito.
Após as exposições, as e os estudantes e trabalhadores da Educação Básica e do Ensino Superior que participaram da plenária virtual se inscreveram para expor a sua realidade local e compartilhar as ações de lutas.
Ao final do encontro virtual, foi realizada a leitura da Carta dos Lutadores da Educação ao Brasil, assinada pelas entidades organizadoras da Plenária, em defesa da vida, da democracia, da educação pública e pela retomada do Estado Democrático de Direito.
“Nós, trabalhadoras e trabalhadores da Educação e estudantes do Brasil, deliberamos, em plenária nacional, pela consolidação de nossas lutas em defesa da vida, da democracia e da educação pública, gratuita, laica, democrática, inclusiva e de qualidade social, e posicionamo-nos contras os desmandos e retrocessos nas políticas públicas deste governo gritando por todas as janelas, ruas e carros do Brasil: 'Fora Bolsonaro'”, diz o trecho final do documento. Leia a carta na íntegra.
Fonte: ANDES-SN
O Ministério da Educação (MEC) anunciou no mês de março uma ampliação no Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), em 2021. Inicialmente seriam 54 escolas que iriam aderir ao programa neste ano, mas um acordo entre o MEC e o Ministério da Defesa permitiu que a quantidade fosse estendida para 74 instituições.
Dos 27 estados da federação, 25 já participam do programa do MEC. O Distrito Federal e o Pará receberam 2 vagas cada um, porém ainda não informaram suas opções.
A imprensa do Sindicato Nacional entrou em contato com o Ministério da Educação para saber mais detalhes acerca da expansão das escolas cívico-militares, como o motivo da ampliação e o valor destinado a cada uma delas, mas até o fechamento da matéria a pasta não havia respondido.
Promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro, o Pecim foi lançado em 2019 com o objetivo de “melhorar a qualidade da educação básica no ensino fundamental e no ensino médio”. O programa é uma parceria do MEC com o Ministério da Defesa e em 2020 previa a implementação de 216 colégios nesse formato em todo o país, até o ano de 2023. Segundo a pasta, no ano passado, 53 escolas públicas aderiram ao programa com a promessa de que cada uma recebesse R$ 1 milhão.
Não é de hoje que o ANDES-SN é contra o processo de militarização das escolas no país por entender que as escolas militarizadas, além de promoverem a privatização da educação, contribuem para fortalecer concepções empreendedoras e domesticadoras de educação no interior das instituições escolares. No início de 2020, o Sindicato Nacional lançou o volume III da cartilha Projeto do Capital Para a Educação com críticas às escolas cívico-militares no país. Em setembro do ano passado, a entidade denunciou em seu jornal que o governo estaria contratando militares inativos para atuar nas escolas.
E, nessa quinta-feira (01), o ANDES-SN divulgou o dossiê “Militarização do governo Bolsonaro e intervenção nas Instituições Federais de Ensino”, que traz uma análise da militarização das escolas públicas e da intervenção do governo federal na escolha de dirigentes das Instituições Federais de Ensino.
Expansão da militarização
A expansão da militarização do ensino público avançou com ex-governador de Goiás, Marconi Perillo (1999-2006 e, posteriormente, entre 2011-2018). Entre 2001 e 2018, houve um salto de seis para 78 escolas militarizadas, sendo que, apenas entre 2015 e 2018, houve a militarização de 51 escolas.
No Brasil, os números também são preocupantes: até 2017, foram 203 escolas criadas por meio de decretos. Fora de Goiás, os estados com o maior número de escolas militarizadas, até 2018, eram Bahia e Minas Gerais. No Distrito Federal, em 2019, o governo distrital lançou um plano que prevê a militarização de até 36 escolas em quatro anos.
Fonte: ANDES-SN
Sistema utilizado em Cuiabá, além de ser ruim, também se revela excludente
O Governo do Estado não consegue dizer por que Mato Grosso é um dos estados que menos vacinou no país. No período mais grave da pandemia, com números cada vez mais alarmantes de mortes e contágio, apenas 60% das vacinas recebidas foram aplicadas. Mas esse é o primeiro de uma série de erros, que incluem a desorganização, e que causaram o péssimo desempenho do estado.
Na última semana, o atraso de Mato Grosso na aplicação das vacinas repercutiu local e nacionalmente. O Tribunal de Contas do Estado elaborou um documento apontando alguns fatores e pedindo celeridade a 64 municípios. O Ministério Público de Contas pediu esclarecimentos sobre as doses recebidas e aplicadas, além da descentralização do local de aplicação.
Após o a informação de que pouco mais da metade das vacinas recebidas foram aplicadas – em Cuiabá, das 95.588 doses que chegaram, apenas 57.364 - também a centralização da vacinação no Centro de Eventos Pantanal e a completa desorganização do agendamento pelo site ganharam o centro das reclamações. O professor aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Carlos Roberto Sanches, de 74 anos, conseguiu tomar a primeira dose nessa segunda-feira, 05/04, depois de passar uma semana inteira tentando agendar.
“O site marca para 13h a abertura do agendamento, mas não funciona. O mais estranho é que não aparecem vários horários, aparece um ou dois, e quando você vai escolher, em menos de um minuto, o sistema cai. Isso foi a semana inteira, inteira, inteira. Tentamos de madrugada, acordamos às 4h da manhã, porque falaram que apareciam os horários, e nada. Até que conseguimos marcar num sábado. Mas esse é um sistema ultra excludente. Só quem tem internet boa, de qualidade, consegue marcar. E quem não tem? O sistema está privilegiando apenas quem tem acesso. Outra coisa é o local. Um lugar de difícil acesso, distante. Você percebe que as pessoas que não têm transporte estão pagando uber”, relatou à Adufmat-Ssind a esposa de Sanches, também professora, Cristiane Vasconcelos.
A professora do Departamento de Ciência Política da UFMT, Juliana Ghisolfi, acredita que esses são os fatores mais evidentes que motivam o atraso. “Me chama a atenção o seguinte: nas maiores cidades do Brasil, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, a vacinação acontece em vários locais. Em Campo Grande, por exemplo, a vacinação é feita nos postos de saúde, às vezes mais de um posto de saúde por bairro. Os postos atendem a população local. O agendamento é diretamente no posto, a pessoa marca um dia, quando abre a vacinação para a faixa etária, a pessoa marca e vai no dia tomar a vacina. Minha mãe tem 68 anos e está vacinada. Essa semana vai abrir para a população na faixa dos 50 anos em Campo Grande. Aqui em Cuiabá a vacinação está acontecendo só no Centro de Eventos Pantanal e dependendo de agendamento num site que não funciona”, avaliou.
Vale destacar que há alguns dias, diante da confusão generalizada, a Prefeitura de Cuiabá chegou a dizer que o sistema de agendamento foi invadido por hackers, o que motivou o a suspensão da vacinação até que as equipes se reorganizassem. Na sexta-feira, 02/04, o município suspendeu novamente a vacinação, não por falta de doses, mas por causa do feriado.
“A vacinação num só lugar e o agendamento feito por um site que não funciona é um problemão. Quem é que está conseguindo agendar vacina em Cuiabá? Porque depende de ter uma boa conexão, de ter gente pendurada no site tentando agendar. Então, a população mais pobre está conseguindo agendar?”, questiona Ghisolfi.
Contradições
A Secretaria de Estado de Saúde (SES) chegou a dizer que o percentual baixo foi motivado por um atraso no registro de informações. “Para que essa inserção de informações no RNDS [Rede Nacional de Dados em Saúde] ocorra de forma mais célere, o secretário Estadual de Saúde, Gilberto Figueiredo, e o presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (Cosems-MT), Marco Antonio Norberto, convocaram uma reunião com os secretários municipais para tratar do tema, pois as informações ainda estão defasadas no sistema, o que coloca Mato Grosso entre os que menos vacinou no País”, respondeu a assessoria de Imprensa da SES à Adufmat-Ssind.
No entanto a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) da capital, responsável pela maior demanda do estado, informou que o sistema utilizado pelo município é atualizado em tempo real. “O sistema utilizado pelo município para inserir os dados da vacinação é o SI-PNI, atualizado em tempo real, no momento em que o usuário apresenta os documentos para se vacinar, na Capital. Com os dados do SI-PNI, o Ministério da Saúde atualiza a Rede Nacional de Dados em Saúde e o portal Localiza SUS, onde é informado ao público em geral o ‘vacinômetro’ da covid-19. No caso de Cuiabá, por exemplo, a última atualização no Localiza SUS foi feita em 29/03. Mas os dados dos dias 30 e 31 já foram inseridos no SI-PNI pelo município. O porquê do delay entre o SI-PNI e o Localiza SUS deve ser questionado junto ao Ministério da Saúde”, explicou a SMS.
A justificativa só faria sentido, no entanto, se o atraso fosse registrado nacionalmente, o que não é o caso. Alguns estados já ultrapassaram a marca dos 12% de vacinação.
A SES não tentou emitir qualquer explicação sobre os outros 40% de doses não aplicadas. Não alegou nem que estariam reservadas para a segunda dose, nem que seriam aplicadas nos próximos dias. Apesar de o SUS ser um sistema integrado, a SES se limitou a dizer que “as doses recebidas do Governo Federal foram entregues pela SES aos municípios. São eles os responsáveis pela vacinação do público alvo. Diante disso, orientamos que esse questionamento seja realizado aos municípios”.
Outro argumento apresentado como tentativa de justificar o atraso foi que a quantidade de vacina é proporcional ao número de pessoas do grupo prioritário, e não à população em geral.
“Em Mato Grosso, os grupos prioritários somam 1.121.971 pessoas. A população convocada foi de 125.622. E chegaram 447.960 doses. Dados do Localiza SUS”, respondeu a Secretaria Municipal de Saúde.
No entanto, esse argumento também não se sustenta, considerando que Mato Grosso do Sul, por exemplo, é o estado que mais vacinou até o momento e, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tem um perfil populacional bastante parecido com Mato Grosso. Por aqui 35% da população tem idade entre 0 e 19 anos, 57% entre 20 e 59 anos e 7,9% acima de 59. O estado vizinho tem 34% da população entre 0 e 19 anos, 56% entre 20 e 59 e 9,8% acima de 59 anos.
“Faz sentido que as vacinas sejam encaminhadas de forma proporcional à população prioritária, mas não faz sentido Cuiabá ter vacinado pouca gente por ter mais jovens. Até porque, em todo o país, o grupo prioritário é de profissionais de saúde e idosos, e essa semana o Mato Grosso do Sul já vai começar a vacinar a faixa etária de 50 anos. Em Cuiabá, nem os que têm 70 estão conseguindo vacinar”, observou a professora da UFMT, Juliana Ghisolfi.
Nessa terça-feira a Secretaria Municipal de Cuiabá informou que vai descentralizar o local de aplicação das vacinas e fazer mudanças no sistema de agendamento, que ainda será pelo site.
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind
****
Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
****
José Domingues de Godoi Filho*
“Fardas e força
Forjam as armações
Farsas e jogos
Armas de fogo
Um corte exposto
Em seu rosto amor
.....................................
O caso Morel, o crime da mala
Coroa-Brastel, o escândalo das joias
E o contrabando
Um bando de gente importante envolvida.”
(Alvorada Voraz,letra da versão1985,RPM)
Em 31 de março de 1964, ocorreu um golpe empresarial-civil-militar, que inaugurou um dos períodos mais terríveis e repugnantes da história brasileira. Num momento que o Brasil vive um de seus maiores descalabros sanitários, com mais de 300 mil mortos e caminhando para atingir 4mil mortos/dia pela Covid-19, somos obrigados retomar essa discussão, para defender a democracia, frente a reiterada insistência do Governo Federal,desde sua posse, em promover um negacionismo histórico; divulgando que “não houve golpe de Estado”, repetindo acantilena de que “os governos militares foram necessários para afastar a ameaça comunista” – o perigo vermelho, como prefere o atual Presidente da República, que não esconde sua simpatia pela ditadura, vocação para o autoritarismo e que tem como ídolo um torturador confesso.Se não bastasse, o atual Ministro da Defesa aparece com a afirmação de que “o movimento de 1964 é parte da trajetória histórica do Brasil. Assim devem ser compreendidos e celebrados os acontecimentos daquele 31 de março." Comemorar o quê? Não há nada para ser comemorado. Ao contrário, todo repúdio à ditadura e fortalecimento da democracia. Basta desse tipo de manifestação, que não tem base documental e distorce os fatos.
Os grupos que atuam nas redes sociais difundindo “fake news” com saudades da ditadura militar, argumentam que não havia corrupção, que a economia era pujante, que os militares são competentes e que o Brasil precisa de uma intervenção militar na política. Nenhum desses argumentos estão corretos.
Quanto à competência dos militares para ocuparem cargos civis, qualquer semelhança entre a situação atual com os tempos da ditadura não é mera coincidência. O número de militares ocupando cargos civis dobrou, de 2016 até os dias de hoje, atingindo mais de 6000 militares, da reserva ou não, incluindo o medonho Ministério da Saúde. O país está sendo destroçado como nunca, ficando, mais uma vez, demonstrado, para quem não viveu a ditadura, qual é a competência dos militares para ocuparem cargos civis e escolherem os ocupantes dos ministérios que tratam da economia, finanças e planejamento. O ultrapassado Chicago’s Boy que, à frente do Ministério da Economia, trata dos interesses dos donos do cassino global e dos grandes empresários, é um bom exemplo.
Os Ministérios da Infraestrutura e da Minas e Energia são exemplos do entreguismo e da destruição do Estado brasileiro; assim como a FUNAI, o IBAMA e o ICMBIO foram minados por militares, que não demonstram nenhum compromisso com os povos indígenas e com as questões socioambientais.E o que dizer da criação de escolas civis-militares, verdadeiros locais de geração de “orangotangos amestrados”? E a intervenção na autonomia das universidades federais e aplicação de insuportáveis cortes de recursos para o seu funcionamento e para o desenvolvimento da pesquisa científica?
O resultado da pujante economia deixado pela ditadura foi uma hiperinflação (mais de 60%, ao mês, de inflação) e uma dívida externa estratosférica. Em 1964, a dívida externa somava US$ 3,294 bilhões e, em 1985, fim dos governos militares, a dívida totalizava US$ 105,171 bilhões, 32 vezes maior.
Durante a ditadura, o modelo econômico privilegiava o tripé capital estrangeiro-capital nacional (empresários entreguistas e participantes do golpe) -dinheiro público. Nesse cenário, as empreiteiras se organizaram com a estatização das obras de infraestrutura, muitas delas questionáveis e superfaturadas. Pode-se afirmar que as empreiteiras “deitaram e rolaram” com recursos públicos e, ao final da ditadura, ao lado dos bancos estabeleceram uma grande influência junto aos tomadores de decisão do governo e ao bloco político que sustentava a ditadura empresarial-civil-militar.
Para tanto, contaram com a inexistência de mecanismos de fiscalização, ou que se encontravam amordaçados e calados pela censura.
O poder dos empresários e banqueiros não se diluiu com o final da ditadura; ao contrário, muitos dos problemas, que o regime político atual enfrenta, é função do poder que alguns empresários e banqueiros conquistaram na ditadura e o mantiveram.
Quem definia e continua definindo o orçamento do país são os empreiteiros, que mantém a utilização de emendas parlamentares inscritas na lei orgânica do orçamento - uma forma sofisticada de corrupção, aperfeiçoada desde a época dos governos militares. Basta atentar para o embuste da aprovação do atual orçamento pelo Congresso Nacional.
Durante a ditadura, que “não tinha corrupção”, pelo menos dez casos emblemáticos do período ultrapassaram os filtros da censura, foram inspiradores da música, versão de 1985, Alvorada Voraz, do conjunto RPM e merecem ser lembrados: - contrabando na Polícia do Exército; governadores biônicos; o caso Sergio Paranhos Fleury; caso Lutfalla; mordomias com dinheiro público; os desmandos da Camargo Corrêa; General Electric; dossiê Baumgarten; caso Coroa-Brastel; Grupo Delfin. Sem citar o superfaturamento de obras como as hidrelétricas de Foz do Iguaçu e Tucuruí, a usina termonuclear de Angra dos Reis, a inacabada Transamazônica, a ponte Rio-Niterói, os projetos financiados pela Sudam, Sudene e Sudeco, dentre outros.
Definitivamente, militares ocupando cargos civis na estrutura de governo, não significa ausência de corrupção e competência administrativa, para atender os interesses da população brasileira
E A PARTE EMPRESARIAL-CIVIL?
A parte empresarial-civil do bloco golpista atuando, de forma capciosa, divulgou, na segunda quinzena de março-21, documentos, onde tentam esconder suas reais intenções para que tudo mude para continuar como está e, assim possam continuar impondo suas posições e se locupletando.
Os banqueiros (sócios ou donos de banca no cassino global) e seus economistas de mercado (crupiês inescrupulosos) divulgaram o que denominaram de “Carta Aberta à Sociedade Referente a Medidas de Combate à Pandemia”,uma falsa mea-culpa, onde não há nenhuma menção contra a abissal desigualdade de concentração de riqueza e renda, muito menos qualquer sugestão do que fazer para minimizá-la. Passam longe da discussão do fim do Teto de Gastos e da revisão da redução dos recursos para a educação e saúde, defendido por boa parte dos signatários. Nada de novo.
Um ano depois dos primeiros casos de pandemia, sem realizarem quase nada de efetivo para corrigir os descaminhos e negacionismo do Presidente da República, 65 senadores assinaram uma“Moção de Apelo à Comunidade Internacional”, onde reivindicam atenção emergencial do mundo pois “a sombra nefasta da morte paira sobre milhões de brasileiros, e que novas formas do vírus da Covid 19 se tornam uma assustadora ameaça global, apelamos à comunidade internacional”.
Em momento algum, se manifestam sobre a posição contrária do governo brasileiro à suspensão de patentes para vacinas, medicamentos e equipamentos de proteção individual para o tratamento da Covid-19, proposto pela Índia e reivindicado por 99 países, dentre os 164 que integram a OMC – Organização Mundial do Comércio. O Brasil se posicionou ao lado dos lobbies corporativos dos países ricos. Quais seriam as reais intenções políticas dos senadores que subscreveram a moção?
Em 26/03, alguns jornais divulgaram que “grandes nomes da indústria e do mercado financeiro articulam a viabilização de um nome para ser terceira via na disputa pela Presidência nas eleições 2022 contra o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula”
Ato contínuo, seis presidenciáveis, que aparentemente atendem os interesses dos grandes nomes da indústria e do mercado financeiro assinaram e divulgaram o “Manifesto pela consciência democrática”,onde convidam “homens e mulheres desse país que apreciam a LIBERDADE (sic), sejam civis ou militares, independentemente de filiação partidária, cor, religião, gênero e origem, devem estar unidos pela defesa da CONSCIÊNCIA DEMOCRÁTICA (sic). Vamos defender o Brasil”
Como fica claro pelos documentos, as mesmas forças de 1964, que deram o golpe de 2016, estão organizando um novo golpe para 2022, em nome da liberdade e da consciência democrática. A sociedade brasileira precisa ser informada das “farsas e jogos” e alertada de que“em contraste com a oligarquia, monarquia, aristocracia, plutocracia, tirania e governo colonial, democracia significa os arranjos políticos por meio dos quais um povo governa a si mesmo” (1).
A igualdade política é a base da democracia, algo impensável com o bloco empresarial-civil-militar que está tramando a continuidade do golpe de 2016. Como nos lembra Wendy Brown (1), “somente a igualdade política assegura que a composição e o exercício do poder político sejam autorizados pelo todo e sejam responsabilidade do todo”. Sem igualdade política, “seja por exclusões ou privilégios políticos explícitos, pelas disparidades sociais ou econômicas extremas, pelo acesso desigual ou controlado ao conhecimento, ou pela manipulação do sistema eleitoral, o poder será inevitavelmente exercido por e para uma parte, em vez do todo”.
Precisamos defender sim o Brasil, inclusive do bloco golpista, com ou sem pandemia – basta de ditadura e da força do capital impondo suas normas para a população brasileira.
- Brown, W. Nas ruinas do neoliberalismo. São Paulo: Editora Politeia, 2019.
* José Domingues de Godoi Filho – Professor da UFMT/Faculdade de Geociências.
Idealizador do projeto destaca que motivação foi o total repúdio às falas e posicionamentos do presidente Jair Bolsonaro
Nesta quinta-feira, 1º de abril, às 20h, a Adufmat-Ssind retransmitirá, pelo Facebook e Youtube, o evento "Nem Cálice, Nem Cale-se", em repúdio ao Golpe Militar de 1964, que completa 57 anos. O evento foi idealizado pelo artista e militante histórico da Adufmat-Ssind, Roberto Boaventura, e terá, na sua reedição, a participação de músicos convidados e atualização do contexto histórico atual.
No último dia 31 de março houve algumas manifestações no país em apoio ao presidente Jair Bolsonaro, que pediu autorização ao Poder Judiciário para comemorar a data e foi atendido. O pedido veio após sucessivos ataques à democracia, apologia e apoio ao Golpe, que insiste em não reconhecer como ditatorial.
O músico e idealizador do projeto, Roberto Boaventura, destaca que a motivação para a criação do projeto foi o total repúdio as falas e posicionamentos do presidente. “Duas falas foram pontuais para a minha indignação: a primeira foi o elogio feito ao coronel Brilhante Ustra, quando Bolsonaro ainda era deputado, em razão da votação do impeachment da presidente Dilma. A outra foi do deputado e filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, que ameaçando acabar com o STF e fazendo apologia ao AI-5*”.
Roberto afirma que as falas provocaram uma inquietação que o levou a roteirizar o projeto, aprovado na Assembleia da Adufmat-Ssind para a um espetáculo no teatro da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), mas em razão da pandemia, o projeto foi gravado e apresentado virtualmente. O nome foi inspirado na música “Cálice”, de Chico Buarque, que aborda a censura, tema central do projeto.
Data deve ser repudiada, não comemorada
Nesta quarta-feira (31 de março), faz 57 anos que o Congresso Nacional depôs o então presidente João Goulart, eleito democraticamente. Militares, com apoio de empresários e de igrejas assumiram o poder, dando início ao período de ditatorial que perdurou por mais 20 anos no país, até 1985.
A data tem sido celebrada discretamente durante anos em quartéis e clubes militares. No entanto, em decisão de 17 de março deste ano, o TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região) concedeu ao Exército o direito de realizar comemorações alusivas ao golpe militar de 1964.
Segundo a diretora de Comunicação do Adufmat-Ssind, Lélica Lacerda, a data deve ser repudiada, não comemorada. “O golpe foi orquestrado pelos militares de cima, com apoio da elite brasileira. É uma página triste e obscura da nossa história. Não é à toa que esse governo genocida flerta desde sempre com torturadores. Aqueles que vivem do seu trabalho e querem viver dignamente com os frutos do seu trabalho, jamais devem celebrar essa data”, afirma.
Em respeito à sua própria história, que é também a história da população brasileira, a Adufmat-Ssind repudia qualquer tipo de comemoração ou apologia à Ditadura Militar que matou, torturou e perseguiu brasileiros por mais de 20 anos.
*O Ato Institucional nº 05 (AI-5), publicado no governo Costa e Silva, revogou a Constituição de 1967, permitiu ao presidente decretar o recesso do Legislativo nas três esferas. Além disso, determinou a cassação de parlamentares e suspensões dos seus direitos políticos por dez anos, decretou estado de sítio, suspendeu o Habeas Corpus e o Poder Judiciário e possibilitou o presidente demitir e aposentar funcionários.
Letícia Corrêa
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind
O golpe empresarial-militar de 1964 está completando 57 anos. É importante reafirmar que foram 21 anos de um regime político que atacou a classe trabalhadora com um imenso arrocho salarial e que reprimiu todas as suas manifestações, a exemplo das greves de Osasco, Contagem e do ABC paulista. Os governos militares, a serviço do imperialismo e da burguesia interna, interviram nas universidades brasileiras e massacraram a população indígena, camponesa e quilombola.
Esse longo período de exceção notabilizou-se pela cassação de milhares de ativistas, mas, também, pela prática do terrorismo de Estado. A ditadura prendeu milhares de opositore(a)s, inclusive religioso(a)s; torturou centenas de militante; forçando ao exílio um grupo importante de lideranças políticas, sindicais, estudantis e intelectuais. Para além dessa tragédia política, a ditadura de 1964 matou - em cifras oficiais - 434 homens e mulheres que lutavam em defesa das liberdades democráticas, contra os governos militares e em defesa dos interesses da classe trabalhadora e da democracia.
Dentro desse cenário político, um dos maiores ataques engendrados pela ditadura foi contra a universidade brasileira, partindo de uma orientação que advinha da ideologia da segurança nacional, centrado no chamado “inimigo interno”, que foi formulada pela ESG em consonância com agências internacionais, o regime autoritário usou fortemente dos seus organismos de repressão (SNI, Polícia Federal, AESI, CENIMAR, CISA, CIE, DOI-CODI, etc.) para agir sobre a universidade brasileira, chegando ao criminoso ato de assassinar 119 membros da comunidade universitária (97 homens e 22 mulheres), entre professore(a)s, estudantes e um técnico.
Foi criado durante esse período ditatorial um aparato de repressão interno ao ambiente da universidade. A AESI ou ASI (Assessorias Especiais de Segurança e Informações) tinha como finalidade vigiar, filtrar contratações, operar sobre possíveis ações do movimento estudantil, emitir relatórios para os órgãos de segurança do Estado ditatorial e denunciar membros da comunidade acadêmica para serem enquadrado(a)s no Decreto nº 477. Este decreto espúrio de 1969, ficou conhecido como o “AI-5 da educação” e tinha rito sumário para finalizar processos (20 dias).
Ainda nesse período tortuoso da história brasileira, o ensino privado foi expandido, os acordos com os EUA (MEC/USAID) comprovam a ingerência externa na educação, tendo sido aplicado um conjunto de reformas na universidade para colocá-la a serviço dos planos de desenvolvimento autoritário dos governos militares, como podemos entender a Lei nº 5.540/68. E, posteriormente, com a implementação da Lei nº 5692/71 que criou diretrizes e bases para uma educação totalmente voltada aos interesses profissionais como formas de servir aos capitalistas em nosso país.
O esquema repressor que se desenvolveu na universidade brasileira foi gerenciado para se representar nas formas administrativas por meio de seu caráter de controle interno, a exemplo de estatutos, regimentos, portarias e resoluções dos diversos conselhos. Ainda convivemos com esse entulho autoritário em muitas universidades, por meio das diversas permanências desse arcabouço no ambiente acadêmico.
Ao repudiarmos os 57 anos desse golpe e tudo que ocorreu com a ditadura empresarial-militar de 1964, precisamos alertar a comunidade universitária brasileira que estamos vivendo um grave momento político. Voltam à cena grupos obscurantistas e reacionários com o desejo político de romper as balizas da democracia formal com o nítido sentido de operar um “novo” regime de exceção. São hordas neofascistas, grupos golpistas que se confirmam como apoiadore(a)s do atual presidente da república, Jair Bolsonaro.
O Brasil vive uma intensa crise, cujo elemento mais contundente é a pandemia em virtude da Covid 19. O governo negacionista abriu as portas para o genocídio da nossa população, situando-se de forma perversa e com total irresponsabilidade diante da imensa mortandade.
Assim como, durante os anos da ditadura de 1964, lutamos e vencemos as trevas, agora, mais do que nunca, precisamos construir uma firme unidade de ação para enfrentar o(a)s golpistas neofascistas, defender a universidade brasileira e os serviços públicos. Temos que cerrar fileiras na luta pela vacinação já, para todos e todas.
Em defesa da democracia e da luta da nossa classe contra a tirania, denunciamos qualquer forma de comemoração desse evento nefasto da história brasileira. Tal atitude, ocorra onde ocorrer, deve merecer o nosso mais profundo repúdio.
Por nosso(a)s morto(a)s nem um minuto de silêncio, toda uma vida de combate!
Ditadura nunca mais!
Brasília(DF), 31 de março de 2021
Diretoria do ANDES-Sindicato Nacional