Terça, 25 Agosto 2020 15:31

 

Para quem quer entender melhor o que querem os “cidadãos de bem”, a Adufmat-Ssind tem um convite: a Live do sindicato vai debater o tema “O que querem conservar os conservadores? Entendendo os cidadãos de bem” nessa sexta-feira, 28/08. Será às 19h, e as perguntas poderão ser feitas via chat na página oficial da Adufmat-Ssind no Facebook e também no Youtube.   

Os convidados para o debate dessa sexta-feira são: Marina Basso Lacerda, doutora em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Rio de Janeiro, analista legislativa da Câmara dos Deputados e autora do livro "O Novo Conservadorismo Brasileiro: de Reagan a Bolsonaro" (Zouk, 2019); e Leonardo Santos, assistente social formado pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), mestre em Serviço Social pela Federal do Rio Grande do Norte (UDRN), professor do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), integrante do Grupo de Pesquisa MERQO e militante da Corrente Sindical Unidade Classista.

A mediação será feita pela professora Lélica Lacerda, diretora de Imprensa da Adufmat-Ssind e docente do Departamento de Serviço Social da UFMT.

Participe!

 

Link do Youtube: https://youtu.be/FyTF5IgY4ag

 

Terça, 25 Agosto 2020 13:37

 

A prisão de Steve Bannon, ex-conselheiro de Donald Trump, guia dos Bolsonaros e mentor de uma pretensa “Internacional Iliberal”, na manhã de 20 de
agosto, envolto em um esquema fraudulento de arrecadação de fundos para a construção do muro que apartaria o “império” da “barbárie” (o muro na fronteira com o México), tem profundos significados políticos, para além de seus rebatimentos imediatos na difícil campanha presidencial que a ultradireita norte-americana tem enfrentado, dada a incapacidade de geração de emprego e renda, os resultados da desastrosa guerra comercial deflagrada contra a China e a atuação mambembe de seu governo frente às pilhas de morto(a)s contabilizado(a)s, diariamente, na casa dos milhares. Tampouco se trata de vitória do campo progressista na luta antifascista que tem sido travada em diversas realidades. São rearranjos operados desde a institucionalidade  burguesa, pelos agentes políticos do financismo.

Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a pandemia do coronavírus segue crescendo e está presente em todas as comunidades do mundo, o Brasil se aproxima dos Estados Unidos (líderes mundiais no morticínio por Covid-19) na contagem do(a)s morto(a)s: 172.934 contra 111.100, enquanto se igualam no número de morto(a)s por 1 milhão de habitantes, em 523 (dados de 20 de agosto). No relatório mais recente, de 10 de agosto, a OMS afirmou a existência de 166 vacinas sendo desenvolvidas em diversos países, dentre as quais apenas 30 estariam em testes clínicos e, destas, 6 (seis) na terceira e última fase. Um dia depois de divulgado o relatório, o governo russo anunciou o registro da primeira vacina contra o Covid-19 (que no relatório apareceu ainda na fase 1), saindo à frente do Reino Unido, China, EUA e Alemanha, que no relatório teriam vacinas sendo testadas já na fase 3.

Ainda assim, não se sabe quando a vacina russa chegará ao mercado e por meio de quais mediações políticas, a fim de que esteja disponível aos estratos mais vulneráveis em diversas realidades, aquele(a)s que padecem da falta de leitos de UTI e de respiradores para sobreviver.

À tragédia social acentuada pela crise sanitária do núcleo orgânico à periferia do sistema mundial, no Oriente Médio se somam os 177 morto(a)s, mais de 6.650 ferido(a)s, os escombros e estruturas retorcidas da explosão que devastou o porto e boa parte da cidade de Beirute, no dia 4 de agosto e que se especula tenha sido causada por 2.750 toneladas de nitrato de amônio apreendidas, em 2013, em um navio proveniente da Moldávia.

Da mesma forma essa tragédia se alastra à Leste, com as revoltas populares na Belarus, após 26 anos de governo Lukashenko e uma eleição sob controle direto de seu regime, conferindo-lhe vitória eleitoral de 80% no momento de maior sublevação popular de sua história. Enquanto Bolsonaro desdenha do(a)s morto(a)s por Covid-19 indagando “e daí?”, prescrevendo cloroquina (enquanto seus(suas) apoiadore(a)s propõem a introdução de ozônio pela via retal), Lukashenko ganhou notoriedade por indicar vodca e sauna para um vírus que chegou a afirmar nunca ter existido porque
jamais o teria visto, compondo o seleto grupo, ampliado por Trump e Ortega, de presidentes negacionistas frente à maior crise sanitária de todo um século.

O levante popular que ali se dá, desde as suspeitíssimas eleições, se inscreve na maior crise social e política ali já registrada, respondida pela forte repressão que tem encarcerado e brutalizado manifestantes às centenas, contabilizando já morto(a)s entre operário(a)s, estudantes e intelectuais.

O Governo Bolsonaro se destaca entre os presidentes negacionistas, reivindicando que devemos “tocar a vida” passando por cima de mais de 111 mil
morto(a)s, deste(a)s já são mais de 690 indígenas morto(a)s e infectado(a)s mais de 26 mil. O povo Cigano, segue marginalizado e a desumanidade expressa no “lucro acima das vidas” marcam a violência contra os Quilombo dos Macacos na Bahia e o Quilombo Campo Grande em Minas Gerais, e por fim uma menina de 10 anos que teve sua infância negada, necessitando de uma intervenção médico/hospitalar, teve seu direito constitucional de atendimento negado pelo Hospital Universitário da UFES que é administrado pela Ebserh. Vimos uma juíza determinar sua sentença a um homem de
42 anos, considerando a sua cor da pele, o mesmo racismo estrutural tirou a vida de Miguel, João Pedro e colocou as trabalhadoras Domésticas e Diaristas como serviço essencial quando o isolamento social é fundamental para não adoecerem. Não à toa foi uma mulher negra empregada doméstica a primeira vítima da Covid-19 no Rio de Janeiro.

No momento que passamos dos 100 mil morto(a)s, com a crítica as fraudes no auxílio emergencial e das desastrosas falas do presidente, saiu a pesquisa da Datafolha realizada em 11 e 12 de agosto, com 2.065 brasileiro(a)s adulto(a)s que possuem telefone celular em todas as regiões e estados do país, são 37% os que acham o governo ótimo e bom. Em junho, eram 32%. No mesmo período, caíram de 44% para 34% os que o consideram ruim ou péssimo. A aprovação subiu 5 pontos, e a reprovação caiu 10: uma mudança de 15 pontos favorável ao governo. Desde que assumiu essa é a primeira vez que há um crescimento na avaliação positiva do governo. As avaliações são diversas, mas há consenso em alguns pontos: o auxílio emergencial pesou, o governo mudou a sua postura e a pandemia, lamentavelmente, está sendo usada de forma a beneficiar o Governo.

Nesse contexto nossas Universidades, IF e CEFET as gestões e administrações universitárias começaram a impor medidas que distorcem a característica fundamental da formação pautada no tripé ensino, pesquisa e extensão, trazendo as possibilidades do ensino remoto. A imposição da transposição do ensino presencial para o ensino remoto foi se fortalecendo e ampliando em todas as instituições de ensino superior públicas, sem considerar o amplo debate com a comunidade acadêmica, um diagnóstico social, econômico com elementos objetivos e subjetivos e de acesso do(a)s discentes, docentes
e técnico(a)s administrativo(a)s. Precisamos resistir a esse “novo normal” e a imposição de um ensino deslocado de um projeto de educação pública de qualidade e inclusiva.

Também precisamos estar unificado(a)s e disposto(a)s para lutarmos contra o corte previsto para a educação superior no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que tramitará no Congresso Nacional. Para o orçamento de 2021, o Ministério da Educação pretende cortar parte das despesas com gastos discricionários para este setor (custeio, investimentos e Assistência Estudantil), que representa 18,2% e deve chegar à cifra de R$ 1,4 bilhão, em comparação ao orçamento de 2020.

Nesse contexto de ataques ao orçamento da pasta de Educação em um golpe só, o governo Doria pretende extinguir 10 autarquias, fundações e empresas públicas, cujos serviços passariam a ser delegados a empresas privadas. Dentre elas, estão a Fundação para o Remédio Popular (Furp), a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo (CDHU), a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU), a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), o Instituto Florestal e o Instituto de Medicina Social e de Criminologia (Imesc). O que ocorre em São Paulo e os ataques as Fundações de Fomento à Pesquisa não é um caso isolado! Nos Estados da Bahia e Paraná, por exemplo, temos movimentos parecidos para desestruturar as Universidades Estaduais, explicitando que os ataques à educação não são apenas uma característica do Governo de extrema-direita.

Mas estamos com disposição para resistir e sairmos da defensiva! No Seminário do FONASEFE, foi indicada a construção de um Dia Nacional de Lutas com greves e paralisações nas três esferas do funcionalismo (municipal, estadual e federal) e empresas estatais, em diálogo com o movimento estudantil e movimentos sociais para a segunda quinzena de setembro. A Reforma Administrativa que querem nos impor receberá uma resposta à altura com a organização das categorias do funcionalismo público e uma campanha de defesa dos serviços públicos!

A difícil conjuntura que vivemos não pode significar que não há esperança! Pois tivemos pequenas, mas pontuais vitórias! A pressão popular e o movimento antirracista obrigou a juíza racista a se retratar; a campanha #AdiaEnem foi vitoriosa; a derrubada do veto presidencial a regulamentação da profissão de historiador(a); a saída de Weintraub; ADPF que provocou o STF e impôs mudanças na política de segurança pública no RJ; o FUNDEB que passou na CF e foi pro Senado; a prisão de Sara Winter, que afirma publicamente pretender “ucranizar” o Brasil, e a sua posterior manutenção em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. A polícia do DF desmontou o aparelho de treinamento paramilitar em Brasília, assim como o acampamento do mesmo grupo na Praça dos Três Poderes. E houve também a repressão, mesmo que a posteriori, de líderes do ataque com fogos ao STF e o bloqueio parcial do sistema de Fake News que utilizava, inclusive, verbas públicas.

 

Devemos continuar ousando lutar, pois assim venceremos!


Brasília(DF), 21 de agosto de 2020

 

 

Diretoria Nacional do ANDES-SN

Terça, 25 Agosto 2020 13:07

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Profa. Dra. Alair Silveira[1]

 
            Desde os primeiros anos da década de 1990, no Brasil, o discurso de satanização do Estado e de idealização da iniciativa privada foi, progressivamente, ganhando adeptos. Alguns por pragmatismo econômico, outros por identidade ideológica, muitos por adequação à supremacia do ideário dominante.

            Sob o bordão de “caça aos marajás”, Fernando Collor inaugurou o ataque aos servidores públicos e ao Estado. Para fertilizar o sentimento anti-público foi necessário o desmonte progressivo dos serviços públicos, a corrosão da sua relevância social e, concomitante, o enaltecimento aos serviços privados. Para tanto, consolidou-se um tripé estruturado sobre a asfixia orçamentária; o financiamento generoso do privado (através de políticas tributárias regressivas e incentivos fiscais imorais); e o ataque ininterrupto ao Estado e aos servidores públicos.

            Simultaneamente ao seu desmonte e à sua satanização, o Estado mantém-se objeto de intensa cobiça. Afinal, como assegurar políticas e legislações adequadas aos interesses privados senão através da direção do Poder do Estado? Assim, a cada pleito, as disputas eleitorais oferecem uma miríade de empresários e prepostos comprometidos com a defesa dos interesses privados em detrimento do interesse público, mesmo que sob o juramento eleitoreiro contrário. Todo esse processo que, no Brasil, já soma 30 anos, não passou incólume por dentro das universidades públicas.

            Contraditoriamente, muitos adeptos do neoliberalismo esforçaram-se, nos últimos anos, para serem aprovados nos concursos públicos. E, dentro das universidades públicas, gratuitas, de qualidade, democráticas, laicas e socialmente referenciadas, atuam cotidianamente para seu desmonte, seja através da aderência às políticas privatistas que atendem sob diversos nomes e formas, seja pela facilidade com que justificam os cortes orçamentários e encampam as parcerias com a iniciativa privada. Por dentro, na prática, promovem o sitiamento da universidade.

            E assim, em nome do “novo” – como se contemporâneo fosse sinônimo de qualidade superior – seus defensores movem-se desenvoltos em meio à destruição de uma instituição secular, cujo fundamento é o conhecimento sólido e acumulado. Em nome do “novo”, faceiros, vendem facilidades tecnológicas, entre abstrações ideais e a impertinência da realidade social perversa. Em nome da “modernidade” promovem o empreendedorismo sob a batuta do Sistema S, que assim como eles, alimentam-se do público para a partir dele detratá-lo.

            Em nome do “novo” e por dentro da própria universidade pública vão lhe minando as forças. De forma oportunista, alguns não somente aliam-se àqueles que querem pô-la de joelhos, mas chegam, inclusive, a pedir sua intervenção. Outros, de costas para a autonomia assegurada pela Constituição Federal, apressam-se em ajustar-se aos governos de plantão, mesmo que ao custo de renegar a tradição democrática. Uma outra parcela dedica-se a inviabilizá-la sob a aparentemente bem-intencionada iniciativa de agregar professores voluntários (não remunerados) que justificarão a falta de concursos públicos e a geração de empregos remunerados para jovens recém-formados. Uma outra parte, ainda, ao invés de utilizar o conhecimento científico produzido pelas diversas faculdades, prefere garantir plateia para coaches motivacionais; ou, então, criar vídeos infantilizados que tratam estudantes e professores universitários como crianças para vender falsas facilidades que a Flexibilização prometeu, mas não entregou.

            Neste processo de destruição da Universidade Pública, o mais lamentável é perceber que seu desmonte tem sido produzido com a conivência ativa ou passiva de parcelas significativas de professores e técnicos que, muitas vezes, ainda se arrogam seus defensores. Nessas condições, nem precisamos de Weintraubs, Damares e Bolsonaros fazendo ataques mentirosos, desleais e contumazes contra as universidades públicas. Basta continuar a submetê-la aos agentes privados ou às mentes privatizadas dos agentes públicos.


 

 


[1] Professora da área de Ciência Política do Depto. Sociologia e Ciência Política/SOCIP/UFMT e do Programa PPGPS-SES/UFMT; Pesquisadora MERQO/CNPq; Membro GTPFS/ADUFMAT-ANDES/SN.
 

 

Segunda, 24 Agosto 2020 19:37

 

Entidades que participaram do ato mundial Stop Bolsonaro em Cuiabá, realizado neste domingo, 23/08, na Feira do Porto, avaliam positivamente o movimento. “Foi um momento importante de contato com a população, de conversa com vendedores ambulantes, feirantes e pessoas que consomem os produtos vendidos na tradicional Feira do Porto”, disse um dos participantes, professor Reginaldo Araújo, representante regional da Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior - Sindicato Nacional (ANDES-SN).

 

Os organizadores do Stop Bolsonaro afirmam que houve registros de manifestações em 77 municípios brasileiros e cerca de 20 países.

 

 

Em Cuiabá, 15 pessoas utilizando máscaras, higienizando as mãos e mantendo distanciamento, entregaram material informativo e máscaras para tentar proteger a população de uma doença que já matou 115 mil pessoas no país em apenas cinco meses. Entre as críticas apontadas pelo movimento, está o fato de o governo federal gastou apenas 30% dos recursos para combater a Covid-19. Os manifestantes declararam que a recepção foi boa, de modo geral, mas também houve quem reagisse de forma hostil. “O tempo que nós ficamos lá reflete a situação do país, uma divisão de opiniões, muito embora nosso diálogo não fosse favorável nem contrário ao presidente. Nossa crítica não é pessoal, nós tentamos mostrar para a população que o governo federal poderia ter evitado tantas mortes, mas preferiu implementar políticas genocidas”, afirmou Araújo.

 

O grupo que organizou o ato reúne diversas entidades, como Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso (Adufmat-Ssind), Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, além do próprio ANDES-SN, entre outros, e pretende continuar realizando atividades de conscientização da população, pois as críticas às escolhas do governo federal vão além das adotadas para combater as mortes pela Covid-19.

 

 

Leia, abaixo, o manifesto distribuído no ato desse domingo, 23/08.   

 

PAREM BOLSONARO!

 

Neste domingo, dia 23 de agosto, várias cidades do mundo protestam. A política negacionista e genocida de Bolsonaro já matou mais de 112 mil brasileiros só de covid-19, atingindo principalmente pessoas negras, povos indígenas e população mais precarizada e vulnerável.

 

Além disso, nesses dois anos de governo, o que se viu foi a destruição do Meio Ambiente, pelas queimadas e desmatamento da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal; a destruição dos direitos sociais e ataques às liberdades democráticas, pela Reforma da Previdência e Reforma Trabalhista; as invasões de terras e extermínio de indígenas e quilombolas, pelo despejo das famílias no Assentamento P.A. Flexas (Cáceres) e pela “PLC da invasão” aprovada pela Assembleia Legislativa de MT que facilita a regularização do roubo de terras quilombolas e indígenas pelos donos do agronegócio.

 

Com relação à preservação da vida das mulheres, as políticas são contrárias. O fundamentalismo religioso é utilizado para culpar, massacrar e privar ainda mais de direitos, como vimos no caso da criança estuprada desde os seis anos no Espírito Santo. Infelizmente, não é um caso isolado. Durante a pandemia por covid-19, o Ministério da Família, dirigido por Damares Alves (PP), gastou apenas 2 mil reais em apoio às vítimas de violência doméstica que aumentou mais de 400% só aqui em Mato Grosso, por exemplo.

 

Por todos estes terríveis crimes de responsabilidade, Bolsonaro já foi, inclusive, denunciado no Tribunal Penal Internacional, em Haia, envergonhando mais uma vez o Brasil e seu povo.

 

A iniciativa internacional #StopBolsonaro está articulada com a Campanha Nacional pelo #ForaBolsonaro, que une a maioria das Centrais Sindicais, partidos de esquerda e importantes movimentos sociais.

 

Bolsonaro se auto declara o novo, mas o ciclo autoritário dos representantes do seu governo brasileiro traz consigo a velha estratégia de destruição e necropolítica - políticas que determinam quem vai viver ou morrer - com requintes de crueldade contra a população mais empobrecida, povos indígenas e da floresta, cujo crime é viver em sintonia com a natureza e seus recursos, sem esgotá-los ou destruí-los, predisposição natural.

 

Se você concorda que o dinheiro não está acima de tudo, que a vida é mais importante, participe desse movimento!

 

 

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

Segunda, 24 Agosto 2020 14:47

 

O Departamento de Ciências Ambientais da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) lançou, no final de julho, uma seleção para contratação de docentes voluntários, com doutorado e experiência didática, para lecionar de forma remota no curso de Bacharelado em Gestão e Análise Ambiental.

A diretoria do ANDES-SN repudiou a medida e considerou-a “perversa” diante da grave crise econômica e sanitária que o país enfrenta com o aumento do desemprego e a falta de investimento em políticas de assistência social, emprego e renda. Além da conjuntura, o Sindicato criticou a desvalorização que a forma de contratação traz a carreira e ao trabalho docente. “O ANDES-SN repudia o desprezo pela carreira docente, pela vida e a educação pública, gratuita e de qualidade! Repudia, ainda, as ações que deslegitimam a luta da categoria docente, presentes na chamada da seleção simplificada para docente voluntário”, afirmou, em nota.

Para a entidade, a convocação fere o preceito constitucional que prevê, para o exercício da docência, concurso público com provas e títulos. Para a diretoria do Sindicato Nacional, o edital da Ufscar compactua da deslegitimação da luta pela valorização do trabalho docente.

De acordo com Eduardo Silva, 1º Secretário da Regional São Paulo do ANDES-SN, essa forma de contratação é cruel por submeter o docente a um trabalho sem remuneração e precarizar a sua formação. “É conveniente para um departamento abdicar de um monte de tarefas e transferir para outras pessoas gratuitamente. A submissão ao trabalho sem vencimentos precariza as condições de trabalho e naturaliza o processo de constituição da carreira docente no qual a submissão a esse tipo de contrato passa a ser uma etapa, como algo comum a se percorrer”, explicou.

Sobre a chamada para a seleção de professor voluntário, o Departamento de Provimento e Movimentação da Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas da Ufscar afirmou que é responsável apenas pelos processos seletivos para contratação de professor substituto e pelos concursos públicos. E que os departamentos teriam autonomia para fazer as chamadas públicas conforme a resolução do Consuni 791, de 2014. 
 
A diretoria do ANDES-SN reconhece, ainda em nota, que, no exercício de sua autonomia, as universidades têm o direito de aprovar em seus colegiados superiores resoluções que permitam esse tipo de seleção para ocupar vaga docente. Entretanto, lamenta que, para ajustar seus orçamentos e suprir seus déficits de docentes, as instituições estejam optando por convocar professores voluntários, expondo os trabalhadores docentes a tamanha precarização. 

 

Fonte: ANDES-SN

Segunda, 24 Agosto 2020 13:47

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Roberto de Barros Freire*
 

A infelicidade da menina estuprada pelo tio parece não ter fim. Não apenas a família desestruturada a condenou a uma violência doméstica horrorosa, que resultou no estupro e na gravidez, mas também a sociedade hipócrita que vivemos a persegue, a condena, a ofende, a agride. A pistoleira e assassina em potencial Sara Winter, que ameaça ministros do STF, que se pudesse e tivesse a oportunidade mataria alguém, pois armada, só espera um pretexto qualquer para disparar suas armas contra os demais cidadãos, hipocritamente, vem dar uma de cristã. Nada fala contra o estuprador, não pensa na dor e na possibilidade de morte da criança que não está com o seu corpo preparado para a gravidez, mas condena e chama de assassina uma criança vitimada pela família e pela sociedade. Como se fosse culpa dela o que ocorreu, como se pudesse deliberar, uma criança que não consegue nem cuidar de si, mas a bandida quer que ela cuide de uma outra criança. Como? Não há sequer lógica no que defende, afora não haver ética ou humanismo.


Sara Winter se alimenta de ódio, violência, agressão. Incitou as pessoas, com um discurso de ódio, a irem até o hospital para cometer atos que violam o ECA e negar à menina o tratamento médico digno, cuja interrupção de gravidez em decorrência de violência sexual é legal no Brasil. Está garantida por lei. No caso da menina, duplamente amparado na lei, por ser uma gravidez fruto de estupro, e por colocar em risco a vida da criança que gera e da criança gerada: a medicina mostra que a gravidez com menos de 14 anos é um risco de vida para a criança e para o feto. E é absurdo que a notícia de que a menina viajaria para Recife para abortar tenha sido vazada pela pistoleira, submetendo a criança ao constrangimento de enfrentar a turba que a chamava de assassina na porta do hospital e é obrigada a ingressar no hospital escondida no porta-malas de um carro: bandidos a ameaçavam na porta do hospital. O ato de Sara pode ser considerado incitação à violência, de constrangimento de uma vítima menor de idade, além de cometer crimes contra a honra tanto da menina quanto dos médicos que chama de "aborteiros”, incitando os fundamentalistas sem coração para irem no local e agredirem a menina ou os médicos. Sara constrangeu a criança, a submeteu a uma situação vexatória, para o que pode caber reparação no direito civil.

Caso o Ministério Público entre com um processo contra Sara por conta da divulgação do nome da menina e do hospital onde ocorreria o procedimento abortivo, já que pode ser considerado crime com base em diversos artigos do Código Penal e do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) o que Sara fez, é possível que a Justiça reconsidere os benefícios (substituição da prisão cautelar por uso de tornozeleira eletrônica) que ela já recebeu no contexto da investigação sobre fake news. Uma pessoa dessas não pode permanecer solta, pois representa uma ameaça à sociedade civil. Não basta tornozeleira, pois seus crimes são cometidos através da internet (por enquanto), é preciso não permitir o acesso a telefones e internet, como qualquer bandido.


Também foi preocupante e merece um processo o procedimento no Espírito Santo: o hospital de São Mateus (ES), em que a garota recebeu o primeiro atendimento, não tenha feito o aborto imediatamente e tenha buscado o aval de um juiz para não o realizar. É incompreensível que o hospital de Vitória, para o qual ela foi encaminhada, mesmo de posse da autorização judicial, tenha enrolado para fazer o procedimento. Em nome da vida, condena a pequena à morte, alegando preconceitos atrasados e religiosos. Nossa situação com relação as mulheres estupradas não seria tão ruim se profissionais de saúde agissem mais como profissionais de saúde e menos como juízes ou teólogos. Se uma mulher procura um serviço dizendo ter sido estuprada, o médico pode realizar o aborto sem fazer muitas perguntas, já basta o constrangimento da situação, a vergonha, a percepção de que as pessoas nesse país condenam mais a vítima do estupro do que o agressor. Se ela estiver mentindo, é ela que corre riscos jurídicos. Hospital não é delegacia nem tribunal de justiça.


Mas, a maldade não acaba aqui. Tanto o suposto pastor Malafaia, quanto o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de Belo Horizonte, duas pessoas bem pouco cristãs que perseguiram e condenaram a pobre criança merecem algumas palavras de repreensão, prestaram um grande desserviço ao país. Ainda que levantem a bíblia, ou não a leram ou se leram, não a atenderam. Ora, criança não é mãe! Estuprador não é pai! Gravidez infantil é tortura! Aborto legal é um direito constitucional. Lamentável, senhor bispo e pastor, é acusar os médicos que salvaram a vida da menina e não fazer nenhuma referência ao tio criminoso e às pessoas que se recusaram a socorrê-la em São Mateus, no Espírito Santo, onde a família dela mora, obrigando-a a viajar até o Recife, para fazer um aborto legal autorizado pela Justiça.


Não importam suas crenças. Vocês acreditem no que quiser, mas vivemos, queiram ou não, em um Estado laico. E assim, vejam bem, mal pastor e péssimo bispo, a menina sai do Espírito Santo, viaja quilômetros até o Recife para poder ter seu direito de abortamento legal garantido, e, durante todo o procedimento, tem que lidar com o fato de ter pessoas rezando hipocritamente para que o aborto não aconteça, acusando, ela, que é uma menina, de assassina. Todo esse processo já seria muito difícil para uma mulher adulta, imaginem para uma criança que precisa ser abraçada e compreendida, não reprimida.


Todavia, se tivessem lido o novo testamento, Jesus disse, atire a primeira pedra aquele que nunca pecou. Disse isso para que os cristãos percebam que antes de condenar o pecado alheio, cure o mundo dos pecados próprios de cada um. Jesus mandou perdoar, nunca condenar: perdoai, eles não sabem o que fazem, foi o que disse. Não disse julguem e condenem os homens. E vocês, pastor e bispo, o que fizeram? Também disse, dai a Cezar o que é de Cezar, e a Deus o que é de Deus, e vocês ficam o tempo todo rondando os césares do Brasil, buscando interferir na vida política e legal. Ora, um cristão não precisa das leis civis, segue as leis divinas, e não obriga os demais, quando muito tenta evangelizar.


Os dois, o pastor e o bispo, vão arder no inferno, pela vaidade do posto que ocupam, por só pensarem em passar a sacolinha nas igrejas, por quererem mais impor um poder do que evangelizar os homens. Aferrados apenas a uma interpretação medíocre da bíblia, em nenhum momento o bispo e o pastor dedicaram uma palavra de afeto e solidariedade diante do terrível sofrimento enfrentado pela menina, que foi perseguida por fanáticos religiosos ao chegar no Recife, e teve que ser levada para o hospital no porta-malas de um carro, agarrada a um bicho de pelúcia. A Igreja Católica e o pior dos evangélicos juntos no mesmo hediondo protesto contra o aborto. Dois marmanjos contra uma menina de dez anos!


Um ato de censura pública à vítima, é o que desestimula que outros estupros sejam denunciados — estima-se que só 2% das meninas vítimas de estupro denunciem o crime, exatamente por procedimentos como desse bispo e pastor. Ou seja, é algo que, em última instância, beneficia criminosos como o que estuprou a menina de 10 anos. Nenhum dos dois se propôs a criar a criança, apenas querem que uma criança de dez anos crie uma criança, quando não dá conta nem de criar a si mesma. É vergonhoso o papel desses religiosos.
 

*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Sábado, 22 Agosto 2020 13:53

 

Neste domingo, 23/08, várias cidades do mundo farão protestos contra as políticas de Bolsonaro, que já ocasionaram a morte de mais de 113 mil pessoas por Covid-19, além da destruição do meio ambiente, dos direitos trabalhistas e sociais, e perseguição aos direitos das mulheres e LGBTs. 

Respeitando as orientações de segurança sanitária, um grupo restrito entregará material informativo sobre a campanha - ligado ao Fora Bolsonaro no Brasil - e máscaras para quem transitar pela Feira do Porto a partir das 7h do domingo. A Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso (Adufmat-Ssind) e a vice-presidência Regional Pantanal do ANDES Sindicato Nacional estão entre as entidades que participam do ato. 

Mais informações podem ser encontradas nas redes sociais do Stop Bolsonaro. 

Confira abaixo o manifesto que será entregue em Cuiabá na manhã deste domingo (material gráfico anexo): 

PAREM BOLSONARO!

Neste domingo, dia 23 de agosto, várias cidades do mundo protestam. A política negacionista e genocida de Bolsonaro já matou mais de 112 mil brasileiros só de covid-19, atingindo principalmente pessoas negras, povos indígenas e população mais precarizada e vulnerável.

Além disso, nesses dois anos de governo, o que se viu foi a destruição do Meio Ambiente, pelas queimadas e desmatamento da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal; a destruição dos direitos sociais e ataques às liberdades democráticas, pela Reforma da Previdência e Reforma Trabalhista; as invasões de terras e extermínio de indígenas e quilombolas, pelo despejo das famílias no Assentamento P.A. Flexas (Cáceres) e pela “PLC da invasão” aprovada pela Assembleia Legislativa de MT que facilita a regularização do roubo de terras quilombolas e indígenas pelos donos do agronegócio.

Com relação à preservação da vida das mulheres, as políticas são contrárias. O fundamentalismo religioso é utilizado para culpar, massacrar e privar ainda mais de direitos, como vimos no caso da criança estuprada desde os seis anos no Espírito Santo. Infelizmente, não é um caso isolado. Durante a pandemia por covid-19, o Ministério da Família, dirigido por Damares Alves (PP), gastou apenas 2 mil reais em apoio às vítimas de violência doméstica que aumentou mais de 400% só aqui em Mato Grosso, por exemplo.

Por todos estes terríveis crimes de responsabilidade, Bolsonaro já foi, inclusive, denunciado no Tribunal Penal Internacional, em Haia, envergonhando mais uma vez o Brasil e seu povo.

A iniciativa internacional #StopBolsonaro está articulada com a Campanha Nacional pelo #ForaBolsonaro, que une a maioria das Centrais Sindicais, partidos de esquerda e importantes movimentos sociais.

Bolsonaro se auto declara o novo, mas o ciclo autoritário dos representantes do seu governo brasileiro traz consigo a velha estratégia de destruição e necropolítica - políticas que determinam quem vai viver ou morrer - com requintes de crueldade contra a população mais empobrecida, povos indígenas e da floresta, cujo crime é viver em sintonia com a natureza e seus recursos, sem esgotá-los ou destruí-los, predisposição natural.

Se você concorda que o dinheiro não está acima de tudo, que a vida é mais importante, participe desse movimento!

 
 
 
Luana Soutos
Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind
Sexta, 21 Agosto 2020 19:14

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Publicamos o artigo de autoria de M. Francelina Ibrahim Drummond*  a pedido do Prof. José Domingues de Godoi Filho.

  

A morte de D. Pedro Casaldáliga e o incêndio no Pantanal causaram em mim uma espécie de devastação interior no território das lembranças e me trouxeram, de repente, a reposição da vida na época em que vivia em Mato Grosso. Na forma de texto, eis o que lembrei.
 
Embora o acompanhasse na imprensa ao longo de anos, tive com D. Pedro apenas um encontro ao vivo e foi na circunstância especial dos funerais de padre Burnier que havia sido assassinado em Cascalheira, MT, por policiais que estavam torturando duas mulheres. Ele se impôs àquela covardia juntamente com Pedro e levou os tiros que o mataram. A camisa estava exposta na igreja na missa de corpo presente. Outubro de 1976. Foi minha estreia na realidade bruta de Mato Grosso. D. Pedro na celebração lembrou que os tiros teriam sido para ele; era o mais visado, mas provavelmente os policiais não os distinguiam, e lá se foi o padre Burnier, jesuíta que teve passagem na Igreja mais conservadora, e estava então na via da conversão pelos pobres, trabalhando em missão junto a posseiros e índios na diocese de Diamantino. Fazia muito calor, o cortejo foi longo. Eu e Arnaldo éramos muito jovens de idade e casamento. Talvez fôssemos, e certamente éramos, bonitos e tínhamos esperança, apesar do impacto. E o impacto foi marcante para mim. Quando soube há dias que d. Pedro havia morrido aos 92 anos, me veio à lembrança a figura frágil do pregador dos funerais do padre assassinado, erguendo os braços finos e as mãos abertas como em oração inconformada e clemente. O contraste o marcava, ou pelo menos marcou para mim: na fala traduzia sua força de catalão místico e inconformado. Deu a vida por Mato Grosso, e agora Mato Grosso em um de seus paraísos que nessa época eu imaginava inexpugnável, o Pantanal, está ardendo em fogo que não se apaga e consegue destruir árvores e animais, pássaros e jacarés, pastagens e caminhos, transformando tudo em devastação e cinza. Lugar dos rios amplos e de lagoas imensas, não consegui ver, nas imagens da televisão, nem um só corixo, ou laguinho, invulnerável. Está tudo se convertendo em pó. E ao pó voltou o bispo-poeta, ou um dos nossos Y-Juca Pirama, aquele que deve morrer. Quantas vezes d. Pedro foi ameaçado de morte, de censura, de expulsão. E quantas resistiu, continuou entregando sua vida à crença! E como ele, voltam ao meu convívio pela lembrança (que dói) muitos outros com quem convivemos em Cuiabá, e muitos, quase todos, também estão dormindo profundamente. O convite para o enterro naquele dia remoto de 1976 partiu de João Vieira, Arnaldo me lembrou esse pormenor que também tem um significado. Ele nos chamou para presenciar o acontecimento e certamente sentir o peso da realidade tão perto de nós. A camisa perfurada a bala e manchada de sangue volta a me acenar como um sudário, nunca a esqueci. Tinha sinal de traição, de emboscada e de uma tristeza profunda que outras vezes ouvi descrita ou presenciei em Cuiabá. De sangue a sangue, me lembro um dia quando na porta do cineasta Arne, ele todo emocionado, mostrava os pingos de sangue de um pobre-coitado ferido por um gato à saída da porta de uma pensão, no bairro do Porto. Arne morreu sem ver resolvido o roubo de uma grande área de terra próxima do Xingu, onde pretendia fazer uma reserva. O procurador geral da Funai, um Fulano de Tal Conceição parece que estava envolvido na tramoia. Não sei se esse homem ferido escapou, e ele forma outra corrente com o Antônio. Padre Eduardo o encontrou também ferido e queimado no Hospital Geral e levou-o sorrateiramente para o esconder dos capangas da fazenda no sótão da igreja. As donas da Cruzinha o trataram, e um dia ele desapareceu. A missão de Eduardo foi também de entrega à crença de que os que têm fome e sede de justiça serão fartos. A última vez que o vimos, na Irlanda, cantou uma velha canção irlandesa e tocou acordeon. Queria voltar para o Brasil. Entre as donas da Cruzinha, já não vemos mais dona Heloísa, frágil e fina como dom Pedro, semelhante a ele arrastando termos espanholados, erguendo os braços. A fala a tornava imensa, forte, poderosa; convencia do nada e ia construindo uma rede de ideias, de alusões e amarramentos e chegava a conclusões como grandes oradores. Um encanto! Morreu também embalada nas bem-aventuranças, pensando certamente que os que choram serão consolados. Neca, ou Oswaldina, de vida prática, ativa, direta, franca como andamos precisando de gente. Formavam, para mim, como que anel e dedo: dona Heloísa clamava justiça, Neca nos apoiava como mãe, apenas. E tantas outras, a dona Benedita. Pequena e forte, saída desses índios da Baixada Cuiabana. Com sua benzeção, arca caída ia embora. As da Guarita, dona Venina Paula, que sabia tudo!, Sô Aleixo cuja fala alargava, a meus olhos, aquele território da beira-rio e tornava a baixada maior que o mundo; dona Íris que também benzia e tantas outras que conheciam os matos, os bichos, a vida. Oralice que trançava rede na conversa comprida na beira do rio, no Bonsucesso. E Xá Nega e sô Joaquim, que benzia, o melhor benzedor daqueles lados. Quantas vezes quis ter meu filho lá, acreditando que estaria sempre seguro de mau-olhado, sob a bênção dessas doninhas que faziam mágicas gratuitamente. E todos se ajuntam aos que buscavam a saúde da cultura, sem ferir a alma original xavante, nambikuara, pareci, munki, bororo e tantas outras. Uns jesuítas, outros salesianos. Adalberto, Tomás; outros leigos, como Ariovaldo de riso farto que viveu com os nambikuara. E outros como Günter Krommer, na defesa da luta pela terra em Porto dos Gaúchos, depois roído de malárias entre os índios, na diocese de Lábrea, no Amazonas, onde tudo, como a dor, é imenso. E como é sonho essa lembrança que a morte de dom Pedro e o incêndio no Pantanal desencadearam, vêm todos na corrente da vida. João Vieira acaba de partir, soubemos um ano depois, de quem Arnaldo tem saudade, por suas mãos então estreei a realidade dura de Mato Grosso, no funeral de Burnier. Eudson em defesa dos posseiros, da luta pela terra entre tantas outras lutas e solidário conosco, sem restrição. Dineva, que de freira convencional nada tinha, mas um brilho barulhento, rouco, engraçado e tão firme, tão amorosa, um rastro de luz. Carlos Rosa e Neusa, dos meus conhecimentos mais antigos em Cuiabá, ela já ausente, ele padecendo. Muitos que passaram, muitos que dispersaram a vida como estilhaços na terra cuiabana. E eu hoje como estou entregue à lembrança, deslanchada numa pequena “visão” desses dois fatossínteses - morte do bispo e morte no Pantanal, deixo de ver os que estão aí, vivos, pensando, recolhidos em casa por causa da pandemia, o novo medo da vida e da morte. Mas não os deixo, ou esqueço, porque quero a lembrança com vitalidade concreta, clara. Lá estão poucos, Waldir cujo sorriso desfaz ameaça, mal-entendido, tristeza. Integrado na luta dos negros, é muito mais índio, muito mais bugre de corpo e alma. Não conte com ele no horário certo; goste dele na conversa solta, na recordação, na panfletagem. E Felinto lembra o velho timoneiro que, entra noite, sai dia, continua firme no sonho de ajudar as comunidades quilombolas, os agentes de saúde comunitária, a ideia utópica de pegar mochila e bater para a Latino América e falar um espanhol mesclado, mas com um sorriso sempre e um gesto de mesa delicado ao se alimentar, prova de que teve uma educação fina, como era fina sua mãe dona Dora, de quem, palavra puxa palavra, ideia puxa ideia, me lembro agora, e me lembro também de dona Vita, mãe de Thienes, cuiabana que casou com Rogério catarinense, amigos-irmãos que hoje vivem em São Paulo. Dona Vita e dona Dora também já passaram. Como passou o grande guia que tivemos no Pantanal, o homem que conhecia tudo e sabia o nome do menor passarinho e da planta mais humilde daquele imenso alagado: Sô Milu. Carmelindo. Crente, magro, risonho e muito humilde. Nas horas vagas, barbeiro e cabelereiro que repetia o gesto muito antigo no interior do Brasil: o daqueles que cortam barba e cabelo em domicílio, no terreiro à frente das casas, que os fregueses são pobres, ou doentes, e tudo é feito como caridade. Há muita lembrança, lembrança sem fim. E este texto, que não se destina a coisa alguma senão passar para o papel um pouco de sentimento, é também um texto sem fim. (16/8/2020)
 
M. Francelina Ibrahim Drummond – Foi professora do Curso de Letras/UFMT; UFOP e UFU – Acompanhou a fundação da ADUFMAT.

 

Sexta, 21 Agosto 2020 19:02

 

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Publicamos a matéria abaixo a pedido do Prof. Juacy da Silva 

 

Só em 2018, 58 meninas de até 14 anos deixaram de abortar por dia no País; Ex-diretora do Ministério da Saúde diz que cenário piorou nos governos Temer e Bolsonaro.

 
Por Marcella Fernandes

A história da criança capixaba de 10 anos vítima de estupro que enfrentou diversas barreiras para ter acesso ao aborto legal não é rara no Brasil. Todo ano, mais de 20 mil meninas entre 10 a 14 anos dão à luz. Toda relação sexual com menor de 14 anos é considerada crime de estupro de vulnerável no País. Nesses casos, não importa a idade do agressor ou eventual consentimento, de acordo com o Código Penal.


Só em 2018, 21.172 meninas de 10 a 14 anos estupradas deixaram de abortar – o equivalente a 58 por dia.

  
Um estudo do Ministério da Saúde que cruzou dados de estupro e de nascimentos entre 2011 e 2016 identificou 4.262 meninas de 10 a 19 anos que tiveram uma gestação resultante de violência sexual denunciada e o consequente nascimento do bebê. Em média, 710 crianças e adolescentes tiveram o direito ao aborto legal negado, a cada ano.


Muitos casos não chegam ao sistema de saúde. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2018, foram registradas 66.041 ocorrências de estupro. Desse total, 53,6% (mais de 35 mil) das vítimas tinham no máximo 13 anos. Ampliando a análise até 17 anos, temos 71,8% de todos os registros de estupro nesta faixa etária, mais de 47 mil vítimas. Também há subnotificação nessa base de dados.

 
Integrante do ministério na época em que o levantamento foi feito, a médica Maria de Fátima Marinho estima que o cenário se agravou nos últimos anos devido ao aumento dos casos de estupro e redução dos serviços de abortamento legal. “Muitos serviços de aborto legal foram fechados. Muitas mulheres estão indo fazer em São Paulo. São poucos os lugares que estão mantendo. Com o [governo de Michel] Temer já tinha fechado um tanto, e aí arrasou em 2019 e 2020”, afirma a professora de saúde pública da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e consultora da organização Vital Strategies.
 
Marinho foi exonerada do Ministério da Saúde em fevereiro de 2019, no início do governo de Jair Bolsonaro. Até então ela era diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e Promoção da Saúde do Ministério da Saúde.


A médica também chama a atenção para os dados de violência sexual. “Aumentam os estupros depois de 2016. Muito ainda no governo Temer e em 2018, com a relativização da violência contra a mulher. Escutei várias vezes falarem que ‘as mulheres exageram quando reagem, que às vezes não é estupro, que os homens não podem mais tocar nas mulheres’. Eles relativizaram demais”, completa.


As evidências de violência sexual têm crescido nos últimos anos tanto ao analisar os dados de saúde quanto de segurança. De acordo com o DataSUS, o total de estupros cresceu 50% entre 2015 e 2018, de 29.979 para 45.219; com um aumento proporcional entre meninas de 10 a 14 anos (48%).

Estupros registrados no sistema de saúde:

2015: 29.979 registros, sendo 8.541 vítimas de 10 a 14 anos
2016: 32.704 registros, sendo 9.477 vítimas de 10 a 14 anos
2017: 39.471 registros, sendo 11.019 vítimas de 10 a 14 anos
2018: 45.219 registros, sendo 12.599 vítimas de 10 a 14 anos

A mesma tendência é observada na base de dados da segurança, fonte do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Foram 45.460 estupros em 2015. Subiram para 49.497 em 2016. Avançaram para 60.018 em 2017 e chegaram a 66.041 em 2018.

De acordo com o estudo “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da saúde”, publicado em 2014 pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 7,1% dos casos de estupro em 2011 resultaram em gravidez, segundo dados dos sistema de saúde. Para vítimas de até 13 anos, esse índice é de 10,6% e sobe para 15% no caso de adolescentes entre 14 e 17 anos. 

O número de brasileiras de 10 a 14 anos que foram mães nos últimos anos também é uma evidência de que essas meninas não tiveram acesso ao direito previsto em lei desde 1940 no Brasil.

Mães crianças e adolescentes:

2015: 26.700 mães tinham de 10 a 14 anos e 520.864 entre 14 e 19 anos
2016: 24.135 mães tinham de 10 a 14 anos e 477.246 entre 14 e 19 anos
2017: 22.146 mães tinham de 10 a 14 anos e 458.777 entre 14 e 19 anos
2018: 21.172 mães tinham de 10 a 14 anos e 434.956 entre 14 e 19 anos

Ao analisar os dados de 2018, das mais de 21 mil mães na faixa etária de 10 a 14 anos, 15.851 (74,8%) eram negras. Nesse grupo, há indicadores de precariedade no atendimento: 650 meninas não foram a qualquer consulta de pré-natal e 7.559 tiveram acompanhamento gestacional considerado inadequado. Também em 2018, foram registrados 13 óbitos maternos (durante ou até 42 dias após o término da gestação) nessa faixa etária. 

RICARDO MORAES / REUTERS

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2018, foram registradas 66.041 ocorrências de estupro. Desse total, 71,8% das vítimas tinha até 17 anos.


O casamento infantil no Brasil


Quanto ao estado civil, 154 das mães de 10 a 14 anos em 2018 eram casadas e 4.067 tinham união consensual. Atualmente o Código Civil brasileiro só permite o casamento a partir dos 18 anos ou dos 16 anos, com autorização de ambos os pais.  


Até 2019, contudo, era permitido o casamento antes dessa faixa etária “para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez”. Mesmo com a alteração no ano passado, ainda não existem sanções legais para os envolvidos em casamentos infantis nem previsão legal específica anulação.


Em súmula editada em 2017, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) reforçou o entendimento do Código Penal sobre o estupro de vulnerável, conduta tipificada como crime em 2009. De acordo com o documento, o delito “se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente”.


Estupro dentro de casa: um problema crônico


Os 4.262 estupros entre meninas de 10 a 19 anos de 2011 a 2016 identificados pelo levantamento do Ministério da Saúde que resultaram em gestação não interrompida são divididos em duas faixa etárias. Entre 10 e 14 anos, são 1.875 casos. Nesse grupo, em 68,5% dos registros o autor do estupro foi familiar ou parceiro íntimo e em 72,8% dos casos a agressão tinha caráter repetitivo.


Na faixa etária de 15 a 19 anos, foram 2.387 estupros que resultaram em gestação não interrompida. Em 37,7% dos casos o autor da agressão foi familiar ou parceiro íntimo e em 44,1% dos registros a violação tinha caráter repetitivo.


A pesquisa cruzou dados de nascidos vivos de mães adolescentes registrados no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e as notificações de violência sexual por estupro inseridas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Foram comparados dados como nome da paciente, data de nascimento e município de residência.

 
Desde então, não foi feita uma atualização desse cenário pelo Ministério da Saúde. O HuffPost Brasil procurou a pasta, por meio da assessoria de imprensa, mas não obteve resposta até a publicação desse texto.


Os dados são semelhantes aos de outras pesquisas que traçam o perfil da violação sexual de crianças e adolescentes no Brasil. “Pelo menos desde os anos 1990 diferentes pesquisas têm indicado que o abuso sexual em geral é praticado por membros da família ou de confiança das crianças, revelando padrões assustadores de violência intrafamiliar”, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública com dados de 2018.

RICARDO MORAES / REUTERSEntre 10 e 14 anos, são 1.875 casos de gravidez após estupro. Nesse grupo, em 68,5% dos registros o autor do estupro foi familiar ou parceiro íntimo e em 72,8% dos casos a agressão tinha caráter repetitivo.


No caso de crianças e adolescentes vítimas de estupro que engravidam, esse ambiente de vulnerabilidade por si só já é uma barreira para o acesso ao aborto legal. “A gente tem um fato que é a percepção tardia da gravidez, exatamente porque a adolescente, e principalmente a criança, não tem conhecimento sobre seu corpo. Ela demora a se perceber grávida. Por isso acaba chegando com uma idade gestacional mais elevada”, afirma a psicóloga Daniela Pedroso, do Grupo de Estudos sobre Aborto (GEA).


Como o abuso sexual geralmente é cometido por um familiar, muitas vezes a menina sofre ameaças, que “fazem com que ela demore mais para ter essa percepção da gravidade do caso” e consiga buscar ajuda, segundo Pedroso. “São meninas que não são orientadas. Não sabem o que devem fazer numa situação como essa”, afirma a especialista que atua no atendimento a vítimas de violência sexual.
De acordo com a psicóloga, o caminho para prevenção é por meio do diálogo com a criança, tanto em casa quanto na escola. ”É importante conversar com a criança, orientá-la e passar noções de que o corpo dela é só dela, que ninguém tem o direito de tocá-la, que se algo acontecer, ela deve falar sobre isso”, afirma.


No caso que ganhou repercussão nacional, a criança de 10 anos foi estuprada pelo tio, de 33 anos, por anos. A gravidez foi identificada pela equipe de saúde do Hospital Roberto Silvares, na cidade de São Mateus, no norte do Espírito Santo, no último dia 8. Na capital do estado, Vitória, o Hucam (Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes) se recusou a fazer o procedimento que só foi feito no último domingo (16), no Cisam (Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros), em Recife (PE), após decisão judicial.


O caso envolvendo deveria ter sido mantido em sigilo devido ao tipo de crime e à idade da vítima. A ativista Sara Winter, contudo, publicou em suas redes sociais o nome da criança e do hospital em Recife. Os ativistas contrários ao aborto legal se aglomeraram em frente ao estabelecimento, tentaram invadi-lo e chamaram a vítima de estupro e os profissionais de saúde de assassinos.


Para a psicóloga Daniela Pedroso o dano psíquico de uma criança vítima de estupro que engravida é comparável à tortura. ”É alguém que, a cada dia que passa, é mais um dia que está grávida desse estupro. A gente pode comparar essa situação com situações de tortura. Não é só uma violação de direito sexual ou reprodutivo. É uma negação de direitos humanos”, afirma.


“O caso dessa menina me fez pensar em casos de crianças que atendi na mesma idade. Quando elas descobrem a gravidez, elas não sabem do que a gente está falando. Até a compreensão da interrupção da gestação é uma construção difícil e muito delicada. A gente está falando de vários traumas: a questão da violência, de um abuso sexual crônico de alguém que deveria em tese protegê-las. A gente está falando da descoberta dessa gravidez e de enfrentar minimamente essa decisão, que não é uma decisão fácil”, completa a especialista.

"É alguém que, a cada dia que passa, é mais um dia que está grávida desse estupro. A gente pode comparar essa situação com situações de tortura"(Daniela Pedroso, do Grupo de Estudos sobre Aborto)


Não é necessária autorização judicial para interromper gravidez decorrente de estupro. Também não é necessário que a vítima prove a agressão por meio de boletim de ocorrência, por exemplo. Basta procurar o serviço de saúde. 


De acordo com portaria do Ministério da Saúde, a vítima deve preencher um documento chamado ”Termo de Relato Circunstanciado”, em que descreve a agressão. O médico deve emitir parecer técnico após “detalhada anamnese, exame físico geral, exame ginecológico, avaliação do laudo ultrassonográfico e dos demais exames complementares que porventura houver”. A norma prevê que a paciente seja atendida por equipe de saúde multiprofissional composta, no mínimo, por obstetra, anestesista, enfermeiro, assistente social e/ou psicólogo.


Também é necessário que a gestante assine um termo de responsabilidade com advertência expressa sobre a previsão dos crimes de falsidade ideológica e de aborto, caso não tenha sido vítima de violência sexual. Se for menor de idade, cabe ao responsável a assinatura.


Desde 1940, o Código Penal permite a interrupção da gestação em caso de estupro e risco de vida da mãe. Decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de 2012 ampliou esse direito para casos de feto anencéfalo.

NURPHOTO VIA GETTY IMAGES“Em poucos lugares funciona bem. Toda essa política começa a ser escanteada. Não são tempos para mulheres”, diz a consultora da Vital Strategies e ex-integrante do Ministério da Saúde, Fátima Marinho.


Ministério da Saúde admitiu falha no aborto legal 


No levantamento com dados até 2016 feito pelo Ministério da Saúde foram identificados entraves ao aborto legal. “Os serviços de aborto legal são oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o entendimento jurídico é de que a mulher tem o direito a realizá-lo no caso de estupro, independentemente da autorização judicial ou de processo contra o autor do crime. Porém, na prática, nem sempre esse direito é garantido, principalmente considerando que adolescentes precisam de acompanhamento do representante legal, o que pode inibir a realização desse direito”, diz o documento.


A pesquisa do ministério afirma que “do ponto de vista da gestão, tornam-se estratégicos o fortalecimento da Vigilância de Violências e Acidentes, das Redes de Atenção e Proteção às Pessoas em Situação de Violência no Território e a expansão dos Núcleos de Prevenção de Violências e Promoção da Saúde”. ”É imperioso reduzir a gravidez na adolescência no Brasil e, em especial, reduzir a violência sexual e intrafamiliar e a gravidez resultante dela”, diz a pesquisa publicada em 2017.


Desde então, o governo federal tem atuado na contramão desse entendimento. Lançada em 2008, a distribuição da Caderneta do Adolescente foi descontinuada. O material distribuído em postos de saúde para crianças e adolescentes de 10 a 19 anos trazia informações sobre cuidados com o corpo, transformações na puberdade e relações sexuais. 


O documento de 52 páginas incluía orientações sobre o uso da camisinha feminina e masculina, pílula do dia seguinte e indicava fontes para informações sobre outros métodos contraceptivos como pílula, injeções, DIU e diafragma. Não havia informações sobre aborto legal.


A cartilha foi criticada pelo presidente Jair Bolsonaro em março de 2019 e retirada do site do Ministério da Saúde. À época, Bolsonaro sugeriu que os pais rasgassem as páginas com ilustrações de como usar preservativos. “Quem tiver a cartilha em casa, dá uma olhada porque vai estar na mão dos seus filhos, e, se você achar que é o caso, tira essas páginas que tratam desse tipo de assunto”, disse. 


Em fevereiro de 2020, o governo federal lançou uma campanha para reduzir a gravidez precoce com o slogan “Tudo tem seu tempo: Adolescência primeiro, gravidez depois”, em referência indireta à promoção da “abstinência sexual”, ideia defendida pela ministra da Família, Mulher e Direitos Humanos, Damares Alves. O debate sobre gênero –que inclui a violência contra mulheres – nas escolas também é desencorajado pelo governo Bolsonaro.


De acordo com a consultora da Vital Strategies e ex-integrante do Ministério da Saúde, Fátima Marinho, os fluxos criados nas políticas públicas para atendimento de vítimas de violência doméstica, incluindo violência sexual, não têm funcionado. “Em poucos lugares funciona bem. Toda essa política começa a ser escanteada. Não são tempos para mulheres”, afirma.


No caso do aborto legal, ela ressalta que “as pessoas não têm informação ou atrapalham de propósito”. “Pedem mais exames, como no caso da menina, e aí começa a perder o prazo”, afirmou em referência ao marco previsto pelo ministério. 


Na prática, nem sempre esse direito [ao aborto legal] é garantido, principalmente considerando que adolescentes precisam de acompanhamento do representante legal, o que pode inibir a realização desse direitoDocumento do Ministério da Saúde de 2017
De acordo com a norma técnica da pasta, a interrupção da gestação no caso do estupro deve ocorrer até 20 ou 22 semanas ou se o feto pesar até 500 gramas. Em geral, os serviços de saúde só realizam procedimentos após esse prazo se houver autorização judicial. Não há limite definido pelo ministério no caso de risco de vida da mãe ou de feto anencéfalo. 


Aborto legal limitado na pandemia


Qualquer hospital com serviços de ginecologia e obstetrícia deve ter equipamento adequado e equipe treinada para realizar aborto legal, mas na prática não é o que ocorre. Na pandemia de covid-19, a situação se agravou. De acordo com levantamento feito pela ong (organização não-governamental) Artigo 19, em parceria com a Revista AzMina e o site Gênero e Número, apenas 55% dos centros de saúde que faziam o procedimento antes mantiveram o serviço. São 42 unidades de saúde identificadas no Mapa do Aborto Legal.


Referência nacional no atendimento de vítimas de violência sexual, o Hospital Pérola Byington, em São Paulo, realizou 1.600 atendimentos no primeiro semestre de 2020, sendo 728 vítimas com até 11 anos, de acordo com dados enviados pela Secretaria de Saúde ao HuffPost Brasil. No mesmo período do ano passado, foram 1.954 atendimentos, incluindo 855 nessa faixa etária.

 
Quanto aos procedimentos de aborto legal, foram275 no primeiro semestre de 2020. Em 2019, no mesmo período, foram realizados 190, de um total de 377 no ano todo. A Secretaria não informou quantos desses procedimentos foram feitos em crianças.


O esforço para dificultar o acesso ao aborto legal e a métodos contraceptivos no SUS em meio à crise sanitária vem de dentro do Ministério da Saúde. Em junho, funcionários da Secretaria de Atenção Primária foram exonerados. A pasta foi responsável pela formulação de uma nota que defendia que “as unidades que oferecem serviços de SSSR (saúde sexual e reprodutiva) são consideradas essenciais, e os serviços não devem ser descontinuados durante a pandemia”, conforme orientação da OMS (Organização Mundial da Saúde).


De acordo com o documento, devem ser considerados como serviços essenciais e ininterruptos a essa população: “os serviços de atenção à violência sexual; o acesso à contracepção de emergência; o direito de adolescentes e mulheres à SSSR e abortamento seguro para os casos previstos em Lei; prevenção e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo diagnóstico e tratamento para HIV/AIDS; e, sobretudo, incluindo a contracepção como uma necessidade essencial”.


A nota técnica do ministério foi deturpada pelo presidente Jair Bolsonaro. Em 3 de junho, ele chamou o documento de “minuta de portaria apócrifa sobre aborto que circulou hoje pela internet”, em uma rede social.


No dia seguinte, a pasta divulgou nota oficial em que afirmava que o documento não tinha “legitimidade” porque o assunto não havia sido “discutido” no ministério. Em seguida, Flávia Andrade Nunes Fialho, então coordenadora de Saúde das Mulheres, e Danilo Campos da Luz e Silva, que era coordenador de Saúde do Homem, deixaram a pasta.


O acesso a esse tipo de serviço está diretamente ligado a uma série de problemas de saúde no Brasil, como mortalidade materna, gravidez precoce e disseminação de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST).


Também em junho, o ginecologista Raphael Câmara Medeiros Parente, conhecido por sua postura ‘pró-vida’ e ativismo contra o aborto em qualquer circunstância, foi nomeado secretário de Atenção Primária do ministério. A pasta é responsável pela organização de ações voltadas a unidades de saúde e diretrizes de cuidados básicos no atendimento na rede.


LEIA MAIS:



 
Marcella Fernandes Repórter de Política e Mulheres do HuffPost Brasil

Fonte: Site https://www.huffpostbrasil.com

Barreiras ao aborto legal: Mais de 20 mil meninas mantêm gravidez resultado de estupro por ano no Brasil
Fonte: Site https://www.huffpostbrasil.com 19/08/2020 

Quinta, 20 Agosto 2020 14:20

 

A culpa é das mulheres? Nessa sexta-feira, 21/08, às 19h, a Adufmat-Ssind recebe quatro mulheres para debater violência patriarcal na pandemia. A quarentena que se impõe já há cinco meses com o objetivo de proteger a população também intensificou as violências domésticas. 

Nesse sentido, as convidadas da Live, Amairi Kaiabi (liderança no Xingu), Madah (promotora popular em Defesa da Mulher), Andressa Mendes (pedagoga e advogada especialista em Direito Público) e Rafaella Felipe (bióloga e coordenadora do projeto Gaia/Sinop) analisam os casos que trazem horror à sociedade desde muito antes da Covid-19, e os mecanismos de denúncia e proteção às mulheres.

Você pode participar fazendo a sua pergunta no chat durante o debate ao vivo, que poderá ser acompanhado pela página oficial da Adufmat-Ssind no Facebook (https://www.facebook.com/ADUFMAT-SSIND-211669182221828) e também pelo Youtube (link será disponibilizado em breve).