Quarta, 17 Agosto 2022 17:01

 

O Ministério Público acionou o TCU (Tribunal de Contas da União) para barrar os “supersalários” pagos a militares no governo Bolsonaro. A ação foi uma resposta depois que veio a público que militares das Forças Armadas receberam salários de até R$ 1 milhão durante a pandemia.

Isso mesmo. No auge da pandemia, durante o ano de 2020, enquanto o desemprego disparava no país e o governo editou Medida Provisória para reduzir o salário dos trabalhadores, militares da alta cúpula das FFAA embolsaram supersalários que extrapolaram o teto do funcionalismo público.

Os dados foram levantados pelo deputado Elias Vaz (PSB-GO), com base em informações do Portal Transparência, e divulgados pelo jornal O Estado de S. Paulo na última quinta-feira (11).

Segundo o jornal, o candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro (PL), o general Walter Braga Netto recebeu R$ 926 mil em apenas dois meses de 2020, sem abatimento do teto constitucional. Só de férias, foram R$ 120 mil pagos ao general em um único mês. Braga Netto tem um salário bruto mensal de R$ 31 mil como general da reserva do Exército.

Bento Albuquerque, almirante de esquadra reformado da Marinha, teve R$ 1 milhão em ganhos brutos nos meses de maio e junho somados, enquanto o salário habitual do ex-ministro é de R$ 35 mil por mês como militar.

Luiz Eduardo Ramos, por sua vez, recebeu um montante de R$ 731,9 mil em julho, agosto e setembro de 2020, também somados, apesar de ganhar um salário de R$ 35 mil por mês em períodos “normais” como general. Na época dos ganhos extras, Ramos comandava a Secretaria de Governo. Hoje, é chefe da Secretaria-Geral e um dos ministros mais próximos a Bolsonaro.

O site Congresso em Foco publicou a lista dos supersalários. Confira aqui.

Imoralidade

O MP pede para o TCU apurar os pagamentos e determinar ao comando do Exército “que se abstenha de realizar pagamentos em montantes exorbitantes até que o Tribunal conheça da matéria”.

Segundo o procurador Lucas Furtado, autor da representação ao TCU, órgão responsável por fiscalizar a aplicação de recursos da União, “ainda que fosse possível argumentar, de alguma maneira insondável, a compatibilidade dos pagamentos feitos com o princípio da legalidade, os pagamentos em questão permaneceriam incabíveis dada a total insensatez do período em que foi realizado (pandemia em que a população brasileira sofreu elevadas perdas econômicas), sendo completamente contrário às boas práticas administrativas, ao princípio da eficiência e ao interesse público”, argumentou.

Para Furtado, as remunerações representam “possível afronta aos princípios da moralidade e da economicidade”.

Mudanças feitas por Bolsonaro

Os supersalários foram pagos após Bolsonaro realizar mudanças que turbinaram os salários da alta cúpula das FFAA. Em um projeto de lei de autoria do governo a indenização paga aos militares que são transferidos para a reserva, por exemplo, subiu de quatro para oito vezes o valor do soldo. Somente de 2019 para 2020, o gasto com salários pulou de R$ 75 bilhões para R$ 86 bilhões.

Em outra mudança também feita pelo governo de ultradireita, em abril de 2021, o governo aprovou uma portaria que alterou as regras para aplicação do teto do funcionalismo, que beneficiou diretamente o próprio Bolsonaro e militares.

Na prática, a portaria permitiu uma manobra considerando de forma separada as aposentadorias e os salários de militares e servidores aposentados em cargos comissionados para fugir do teto constitucional (cuja referência é o salário de um ministro do STF, atualmente de R$ 39,3 mil mensais).

Uma auditoria da CGU (Controladoria Geral da União) identificou que em um único mês, em dezembro de 2020, militares que atuam em cargos comissionados no governo receberam cerca de R$ 6 milhões em salários acima do teto do funcionalismo.

Segundo o levantamento, entre 2.770 militares e pensionistas de militares com cargos no governo federal, ao menos 729 tiveram salários acima do teto constitucional, o que resultou num prejuízo de R$ 5,1 milhões aos cofres públicos.

Outros 110 militares devolveram diferenças em relação ao teto salarial, mas em quantidade insuficiente. Neste recorte, foram mapeados R$ 657 mil em indícios de irregularidade (leia mais aqui).

Bolsonaro fala em novo reajuste para setor

No plano de governo registrado este ano no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Bolsonaro faz um novo afago aos militares. No documento, promete “aperfeiçoar os planos de carreira e de remuneração dos militares, além de garantir retaguarda jurídica e oferecer capacitação profissional”.

Mais uma vez se comprova que Bolsonaro é árduo defensor da retirada de direitos da classe trabalhadora e trata com descaso a situação de fome e miséria que assola os mais pobres, mas quando se trata dos próprios interesses e dos setores que lhe interessam, como os militares que são sua base de apoio, a política é outra. É mamata mesmo.

 

Fonte: CSP-Conlutas 

Quarta, 08 Junho 2022 09:57

 

O número de militares em cargos civis no governo federal aumentou 193% entre os anos de 2013 e 2021, segundo a nota técnica "Presença de militares em cargos e funções comissionados do Executivo Federal" publicada, na segunda-feira (30), pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Há nove anos, os representantes das Forças Armadas estavam em 370 cargos e funções civis comissionados. No ano passado ocupavam 1.085 desses cargos e funções.  

Os dados foram coletados pela Controladoria-Geral da União (CGU) no Portal da Transparência e consolidados pelo Ipea, no âmbito do Atlas do Estado Brasileiro. De acordo com o levantamento, a presença agregada de militares em cargos e funções comissionadas, tanto civis quanto militares, teve trajetória de aumento de 59% no período analisado, passando de 1909 para 3041 em oito anos. No caso de representantes das forças armadas em cargos e funções militares comissionados, o aumento foi de 1539 para 1956.

O trabalho aponta, ainda, "tendência de expansão" da ocupação de postos em agências reguladoras por militares. Em 2013, havia 27 militares ocupando cargos em agências reguladoras, número que sobe para 38 em 2021.

Detalhamento de cargos
Nos postos de "natureza especial", considerados do alto escalão do Executivo Federal, o percentual saltou de 6,3% em 2013 para quase 16% em 2021.  A presença de militares nesses foi observada de forma mais expressiva, a partir de 2019, na estrutura da Presidência da República e no Ministério da Defesa.

Já nos cargos e funções comissionados, houve um maior aumento proporcional, de 2018 a 2021, nos cargos de Direção e Assessoramento (DAS), Funções Comissionadas do Poder Executivo (FCPE) e empresas estatais federais, que estão registradas no Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape).

No Ministério da Saúde, houve um aumento de 5 militares em 2018 nos cargos de DAS e FCPE para 40 em 2021. Já na Educação eram 7 militares há quatro anos. Em 2019 eram 25, e hoje são 15. O Ministério do Meio Ambiente contava com 4 militares nos cargos de DAS e FCPE em 2018, subiu para 29 em 2020 e atualmente conta com 21 militares nos cargos. Uma quantidade significativa de cargos para oficiais foi distribuída nessas pastas na gestão de Jair Bolsonaro e que, atualmente, são alvos de críticas e denúncias de corrupção.

O relatório ainda evidencia o levantamento realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em 2020, indicava a existência de 6.157 militares na Administração Pública Federal. Desses, 1.969 das e dos militares inativos ou de reservas foram contratados por tempo determinado para atuarem no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), 1.249 militares que acumulam cargos civis como profissionais de saúde, seguidos dos 179 militares que atuam como docentes. A soma destes três grupos representa 55,2% dos 6.157 militares identificados pelo TCU. Em 2019, o número de militares era 3.515.

Sobre o perfil das e dos ocupantes, o Exército foi, em todo o período analisado, a Força de origem da maior parte das e dos ocupantes de cargo e, em relação aos círculos hierárquicos, o grupo que se mostrou mais representativo foi o dos oficiais superiores. No caso da Marinha, houve estabilidade em torno de 20%, com exceção feita apenas a uma participação maior observada entre 2016 e 2018.

Dados subestimados
Segundo a nota técnica do Ipea, a Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), empresa pública vinculada ao Ministério da Defesa, é a única cujos cargos e funções não foram identificados no Siape. Entretanto, em pesquisa feita na página da empresa, em maio de 2022, foi identificado que todos os seis cargos de diretoria da empresa são atualmente ocupados por oficiais generais ou superiores da reserva remunerada do Exército Brasileiro. De acordo com o relatório, é "razoável supor que existam militares nesse conjunto de organizações, o que implica que os números aqui apresentados podem ser subestimados".

Além da Imbel, uma pesquisa nas páginas das Infraero em maio deste ano, empresa pública brasileira de administração indireta vinculada ao Ministério da Infraestrutura; da Empresa Gerencial de Projetos Navais (Emgeron), empresa pública vinculada ao Ministério da Defesa; e da Casa da Moeda, empresa estatal responsável pela impressão da moeda e papel-moeda oficiais do Brasil também indicava a presença de oficiais generais ou superiores da reserva remunerada em posições de direção.

Acesse aqui o estudo na íntegra

 

Fonte: ANDES-SN

Quinta, 08 Julho 2021 16:19

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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José Domingues de Godoi Filho*

"Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor

do nosso jardim.
E não dizemos nada [...]
Até que um dia,
o mais frágil deles[...]
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada."(1)

 


 

O atual Ministro da Defesa, general da reserva (cargo civil, que, de preferência, não deveria ser ocupado por militar, ainda que da reserva), e seus comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, repetindo a atitude do então comandante do Exército, em 04 de abril de 2018, general Villas Boas, que ameaçou o país com uma intervenção militar na hipótese de que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidisse favoravelmente a um recurso do ex-presidente Lula, voltaram a ameaçar o país.

O motivo para a ameaça (ou ensaio do golpe que parece em andamento) foi uma declaração do presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, senador Omar Aziz (PSD-AM), sobre irregularidades nas negociações de compra de vacinas, que afirmou que “membros do lado podre das Forças Armadas estão envolvidos com falcatrua dentro do governo”. Acrescentou, ainda: - “Olha, eu vou dizer uma coisa: os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”.

Consideraram, esses senhores, potenciais golpistas, em nota distribuída pelo Ministério da Defesa que “essa narrativa, afastada dos fatos, atinge as Forças Armadas de forma vil e leviana, tratando-se de uma acusação grave, infundada e, sobretudo, irresponsável”.

E, concluíram a nota ameaçando com a grave e preocupante afirmação de que - “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às Instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”. O que farão? Repetirão 1964, como tem ensaiado o seu chefe? Será que foi isso que aprenderam nas academias militares?

Para qualquer leitor com um mínimo de discernimento e criticidade, está claro que as declarações do senador não se referem pejorativamente às Forças Armadas, mas sim a uma parte dos mais de cerca de seis mil militares, ativos ou da reserva, que ocupam cargos civis e militarizam o atual governo; particularmente, o Ministério da Saúde, cujo cargo principal era ocupado por um general da ativa e onde se deram os fatos que sustentaram os  argumentos que justificaram a instalação da CPI da Covid-19.

Os fatos estão se acumulando. Por exemplo, no dia 01 de julho, dois dias antes das manifestações que ocorreram em dezenas de cidades brasileiras contra o governo Bolsonaro, com o país enfrentando uma pandemia que já matou mais de 500 mil brasileiros, o diretor da CIA (agência de inteligência dos Estados Unidos, na sigla em inglês), William J. Burns, acompanhado do embaixador dos EUA, Todd Chapman, cumpriu agenda oficial em Brasília e participou de jantar com os ministros General Ramos (Casa Civil) e General Augusto Heleno (Segurança Institucional). É bom não esquecermos o papel que a CIA teve no golpe militar de 1964 e, em 2016, no que depôs a presidenta Dilma Roussef.

No momento, certamente, a CIA deve estar incomodada com o retorno, no cenário eleitoral de 2022, do ex-presidente Lula. São fatos que não podem ser deixados de lado tendo em vista os interesses “imperiais” dos EUA na América do Sul e no Brasil.

Ao mesmo tempo, o atual presidente insiste em repetir que “pode não entregar o poderem 2022”, especialmente, se não retrocedermos pelo menos 30 anos, ressuscitando o voto de papel. Nessa hipótese, tem afirmado, reiteradamente, “que não aceitará o resultado, caso perca as eleições em 2022”, possivelmente, contando com a anestesia política da sociedade, com a cumplicidade da classe política e apoio no aparelhamento das instituições.
 
O exemplo do Chile e da Bolívia é a resposta que precisa ser dada com a continuidade dos protestos das ruas, em defesa da democracia e contra os entreguistas e genocidas que invadiram a Esplanada dos Ministérios, antes que “não possamos dizer nada”.
 
A despeito das polêmicas que ainda envolvem, especialmente no Brasil, a discussão sobre as relações civil-militar, como sugerido por Huntington (2), a “democracia só tem a ganhar com o afastamento dos militares da política. Homens armados não devem ter a mesma participação que homens desarmados na vida política da Nação”.
 
A criação do Ministério da Defesa, chefiado por um civil, o que não é o caso brasileiro no momento, auxiliou garantir a subordinação das forças armadas e seu respeito ao previsto constitucionalmente.
 
Num Estado democrático de direito, o argumento democrático supera o tecnocrático, isto é, os especialistas podem propor alternativas, mas a decisão será sempre política. O direito de errar, mesmo em questão de segurança nacional, é da autoridade civil. No limite, a separação das instâncias decisórias é uma decisão política, portanto, civil.
 
O controle civil dos militares, como lembrado por vários estudiosos do tema, representa parte de como manter um governo forte o suficiente para resistir todas as pressões sociais, sem tiranizar e violentar a população que protege. A questão não é nova e, no Brasil, depois da ditadura civil-militar, já passou da hora de enfrentarmos a discussão sobre como superar as dificuldades, para manter meios de repressão efetivos, confiáveis, financeiramente viáveis e que saibam respeitar os direitos humanos.
 
Os métodos utilizados pela ditadura civil-militar de 1964 e a herança de posturas autoritárias, como as demonstradas pelo atual Ministro da Defesa e seus Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica devem ser repudiadas energicamente pela sociedade.
 
Uma das principais tarefas urgentes que a sociedade brasileira, ainda tem que cumprir, é resolver as relações entre militares e a militância política, para a consolidação, de fato, de um Estado democrático de direito. Caso contrário, “arrancarão a voz de nossas gargantas e não poderemos dizer nada”.

 

  1. No caminho com Maiakovski, poema de Eduardo Alves da Costa.
  2. Huntington, S.P. O soldado e o Estado – Teoria e política entre civis e militares. Rio de Janeiro :Biblioteca do Exército,1996.

 

*José Domingues de Godoi Filho – UFMT/Faculdade de Geociências